Björk - Medúlla Imagem: Reprodução

Disco dos mais ousados de Björk, ‘Medúlla’ completa 20 anos

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Depois de um álbum voltado à música eletrônica, a diva islandesa seguiu caminho oposto, usando somente vozes

A diva futurística islandesa Björk faz de cada um de seus álbuns uma viagem digna dos melhores roteiros de ficção científica. Ataca os limites da música de forma natural, como se para ela fosse impossível simplesmente juntar uma dúzia de canções e colocar num disco. Foi o que fez com Medúlla. Lançado há 20 anos, em 30 de agosto de 2024, seu quinto disco de estúdio é inteiro sem instrumentos, apresentando somente (muitas) vozes humanas. Desde a emulação da bateria com a boca (o beatbox) até cantos guturais, que só são reconhecidos como criados em traqueias porque a artista nos avisou. É um trabalho surreal.

Maluco até o talo, obviamente Medúlla não foi o lançamento de maior sucesso comercial de Björk. Mas nem de longe foi um fracasso. Chegou a ficar em primeiro lugar em sua terra natal, na França e na Valônia, uma das três federações que formam a Bélgica. Entre a crítica musical da época, claro, gerou o maior buchicho. Não é sempre que um músico chega com uma proposta tão corajosa.

Três anos antes, a cantora havia lançado Vespertine, LP em que abusou de sua relação com a música eletrônica. Decidiu, então, guinar para o caminho oposto em Medúlla: gravar 14 canções totalmente humanas, em sua concepção única do que é humanidade na música. Saiu em busca de parças para participar do projeto, emprestando suas vozes em diferentes jeitos de se cantar. E dentre a turma que passeia com Björk pela música, espere sempre as figuras mais inóspitas.

Para os beatboxes, chamou Rahzel, da banda americana The Roots. Das aldeias indígenas do Canadá, convidou a cantora especializada em throat sing (canto ancestral norte-americano) Tanya Tagaq. Convocou um dos fundadores da banda Soft Machine, Robert Wyatt, para cantar algumas músicas “de um jeito apaixonado e humano”, segundo a chefe. Um dos personagens mais estranhos do rock alternativo, Mike Patton, fundador do Faith No More, também se juntou ao time.

Como se não fosse o bastante, a cantora decidiu ainda convidar ninguém menos do que Beyoncé. “Se é um disco sobre vozes, Beyoncé tem a mais maravilhosa de todas”, contou Björk à época. Apesar de ter aceitado a aventura, no entanto, a cantora americana não apareceu nas gravações, alegando problema de agenda.

Ouvir Medúlla é uma provocação aos sentidos e ao que construímos como conceito musical. É confuso em muitos momentos, incômodo até. Ancestors, 11ª faixa do álbum, chega a ser perigosa se ouvida com descuido.

20 anos não são nada na história da música, menos ainda na história da humanidade. O álbum é a prova disso. É fresco na ideia como se tivesse sido lançado ontem. Na coragem, caberia em qualquer lugar do futuro, assim como qualquer coisa que sai da cabeça iluminada desta pequena alienígena.

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Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.