Opus Imagem: Reprodução

9.5/10

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Opus, a carta de despedida que o pianista e pioneiro da música eletrônica japonesa Ryuichi Sakamoto deixou para o mundo em forma de álbum, foi finalmente (e aqui, a palavra finalmente tem um sentido mais melancólico do que nunca) lançada pela gravadora Milan Records. Sabendo que o câncer o levaria em breve, o músico encerrou-se em seu estúdio e gravou, sozinho, 20 faixas que sentiu vontade de executar pela última vez. Ele e seu piano versaram juntos sobre o final que estaria por vir e, se o álbum por si só já seria sublime, no contexto de sua morte, se transformou instantaneamente em uma espécie de ritual de passagem. Difícil não se emocionar.

Ao piano, Sakamoto domina o tempo e o silêncio como alguém que pratica lian gong sob uma árvore, em uma silenciosa praça em lugar qualquer do Japão. Martela as teclas do instrumento com suavidade e precisão, fundindo-se com a natureza e renegando a tecnologia urbana do som que o impulsionou no começo da carreira, quando fundou a histórica bandaa Yellow Magic Orchestra.

Ouvindo Opus em um bom sistema de som ou com um fone de ouvido decente, é possível perceber a sensacional captação de seu piano minimalista. A madeira do instrumento vibra pela sala, puro até mesmo nas imperfeições de cada nota. Faz com que Ryuichi esteja ainda mais presente. Nada além dele e seu Yamaha Grand.

Sequestrado por uma consciência maior, o talento de Ryuichi Sakamoto serviu de instrumento para transmitir lições sobre o significado da vida e a serenidade a que todo ser humano deveria ter direito em seus últimos momentos. Há algo de uma inteligência superior na obra. Fica-se imaginando em que condições emocionais o músico gravou, solitário em seu estúdio, esta sequência de canções.

A penúltima faixa do álbum é, justamente, um de seus maiores sucessos, a singela Merry Christmas Mr. Lawrence, executada de forma potente e emocionada. Um aceno sereno, com um leve sorriso na boca, a todos os que ficaram para ouvir seu último álbum. A música final, encerramento de obra e de vida, se chama Opus – ending.

“Opus” significa, em latim, obra. Na música, é usado para designar uma parte de um trabalho maior. Tanto que “Opera” é seu plural. Em sua carta de despedida, Ryuichi Sakamoto avisa que cumpriu, até agora, apenas um dos atos de sua grande ópera.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.