Conheça a jornada fantástica de Dona Onete, grande homenageada do WME Awards
Envolta em uma carapaça de força, doçura e sossego, a cantora conquista o mundo tardiamente. Mas ela não está nem um pouco preocupada com isso
A artista marajoara Dona Onete tem um sorriso infinito, plantado em um rosto redondo de vovó arretada. Tudo nela demonstra força: o couro da pele morena, as mãos fortes, que não negam chamego, o olhar vivo e atento. Até mesmo a cadeira de rodas, debaixo dela, parece mais um chevetão descendo a 120 km/h o Boulevard Castilhos França, do que um mero acessório de mobilidade.
Aonde vai dar a Castilhos França, em Belém do Pará? Não interessa. A artista é a prova de que, na vida, o que interessa é a jornada. Ou melhor, o corre.
Se ficasse preocupada com a fama na música, só alcançada aos 72 anos de idade, quando teve de escolhar uma dúzia das 300 composições que tinha para incluir em seu primeiro disco solo, Feitiço Caboclo, lançado há dez anos, Onete não teria feito nem um décimo das coisas incríveis que realizou.
Largou das garras de uma marido babaca, ainda jovem, para poder fazer magistério. Foi professora de história e formou muita gente no Pará. Foi ativista de cultura das boas, participando de diversos coletivos artístico de sua região, a ponto de ser convidada a ser assessora de cultura do estado, momento em que incentivou a criação de festivais e encontros para dar vazão à produção artística local.
Nessa última quinta-feira, no palco do WME Awards, onde foi a grande homenageada da noite, ao lado de Rita Lee, Dona Onete representava a encarnação da autoridade. A passo que, naturalmente, mostra quem manda, sem fazer esforço algum. Se apresentou com Daniela Mercury, com quem já colaborou nos últimos anos, além de Fafá de Belém e Gaby Amarantos.
“Agradeço a São Paulo, que me recebe muito bem — de vez em quando”, lascou, arrancando gargalhadas da plateia. Não teve discurso emocionado, discurso longo, só tiração de onda. Ela estava ali porque merecia e já deveria estar na boca do povo há muito tempo. Sabe disso, mas não se incomoda. Pelo contrário, se diverte. Dona Onete não precisa agradecer a ninguém. Nós é que devemos agradecer a ela, o tempo todo.
Prova disso é a própria Daniela Mercury. De irretocável história na divulgação da música baiana, parecia mais uma adolescente dando de cara com um dos integrantes do BTS. E Dona Onete, como estava? Nem aí. Era só sorriso e doçura, cantando em cima de seu chevete estratosférico.
Ionete da Silveira Gama cresceu entre Belém e Igarapé-Miri, mesma terra do Mestre Aldo Sena, grande propulsor da guitarrada paraense. Terra boa.
Hoje, já contabiliza quatro álbuns lançados, nesta década em que anda “vivendo de música”. E assim segue, na jornada, show atrás de show, homenagens atrás de homenagens.
E a gente vai correndo atrás dela, feito carnavaleiro seguindo bloco.