
“Esperem por mais músicas de protesto sendo lançadas pelo L7”
Jota Wagner conversa com Donita Sparks, frontwoman do L7; grupo chega ao Brasil nesta semana para se apresentar com o Garbage
Donita Sparks é uma das grandes guerreiras do pop-punk mundial desde que fundou, em 1985, ao lado de Suzi Gardner, a banda L7. O grupo, que ainda é formado por Jennifer Finch e Demetra Plakas, já começou batendo cartão em duas das mais icônicas gravadoras do rock alternativo estadunidense, a Epitaph e a Sub Pop. Ajudou a construir, portanto, a onda do grunge rock que acabaria se transformando em um dos maiores movimentos culturais da última metade do século XX.

Donita falou com o Music Non Stop de sua casa enquanto se prepara para voltar ao Brasil, desta vez acompanhada da contemporânea Garbage. As duas bandas tocam no Rio (Vivo Rio, 21 de março), São Paulo (Espaço Terra, 22) e em Curitiba (Live, 23). Divertida e consciente da importância da sua banda no universo do rock alternativo, falamos sobre o futuro, as lembranças do Brasil… e até das viagens espaciais! Confira.
Jota Wagner: você está prestes a fazer sua terceira turnê pelo Brasil com o L7. Tem boas lembranças das anteriores?
Donita Sparks: A primeira vez foi muito especial. E acho que é bastante lembrada também pelos brasileiros. Tocamos com Nirvana, Red Hot Chili Peppers, Alice in Chains e Simply Red. São as que eu me lembro. Foi muito especial, com shows no Rio e em São Paulo. Shows gigantes. Eu não conseguia acreditar na recepção que nós tivemos. Foi tão louco, com pessoas nos seguindo pelas ruas e tal. Mas nas outras vezes em que estive aí, desde a reunião da banda, tem sido maravilhoso. Também estive no Brasil com minha banda solo [Donita Sparks and the Stellar Moments]. O segundo show, em 2019, foi superdivertido.

Donita Sparks se apresentando com o L7 no Carioca Club, em SP, em 2023. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop
Estar nessa vida, com longas esperas e aeroportos, hoteis, é bem cansativo. O que te faz seguir nessa?
É uma das pouquíssimas coisas que sei fazer na vida (risos). Não sei fazer mais nada. Faço várias coisas criativias, mas a maioria é para o L7. Já até dirigi vídeos da banda. Também me dedico a outros projetos de arte. A verdade é que eu não sei como faz para conseguir um “emprego real”. Não fui para a faculdade, só para poder desapontar meus pais. Mas sabe? Eu deveria ter ido. Sei lá, talvez faça alguma online. Não sei o que teria feito na vida, se não fosse o L7. Sigo nessa porque não tenho outra alternativa.
Quando vocês fazem shows tão longe de casa, muda alguma coisa na hora de escolher o setlist?
É interessante pra gente também. Alguns dos nossos álbuns não tiveram uma boa distribuição, então acabamos focando nos que realmente chegaram nos países em que vamos tocar. Fazer o setlist é um processo belo. Sabemos que nos EUA as pessoas conhecem um pouquinho mais do nosso trabalho, mas a gente tenta tocar um pouquinho de cada em todos os shows.
O primeiro trabalho de vocês foi pela Epitaph…
Pois é! E esse é o único álbum do qual não tocamos nenhuma música. Mas vai mudar. Após esse show com o Garbage, vamos fazer uma tour de 40 anos de aniversário. Mesmo que tivemos aquele hiato de vários anos, eu sigo considerando 2025 nosso quadragésimo aniversário, porque eu e a Susie começamos a banda em 1985. Vamos fazer um show comemorativo em Los Angeles em novembro, na segunda edição de um festival que a gente mesmo criou no ano passado [chamado Fast and Frightening Takeover] e foi muito bem sucedido. Lá a gente vai tocar alguma coisa do álbum da Epitaph.

Estamos passando por tempos difíceis. Qual a missão da música do L7 hoje em dia, comparando com a de 40 anos atrás?
Ai, meu Deus… Não anda nada bom hoje em dia, Jota. Você sabe que a última música que lançamos se chama Cooler Than Mars? Fala sobre esses bilionários indo para o espaço quando deveriam estar focados no meio ambiente do nosso próprio planeta, colocando todos os recursos que temos nisso. Dando amor ao Planeta Terra. E fodam-se estes caras indo para o espaço para satisfazer seus egos de merda, entende?
A música é sobre isso. Porque a Terra é muito mais legal que Marte. Temos biodiversidade. Nada contra Marte, é legal também, mas a Terra é do caralho. Escrevi essa canção pela frustração pura desses caras gastando dinheiro indo para lá, poluindo nosso ar, com esses malditos satélites que achamos ser estrelas à noite. Nosso instinto mais primitivo é contemplar as estrelas, e agora isso. Fodam-se estes caras!

Donita Sparks se apresentando com o L7 no Carioca Club, em SP, em 2023. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop
Scatter the Rats é um disco bem legal. Fale um pouco sobre o momento em que ele foi concebido.
Eu tinha escrito somente algumas canções antes de levar a ideia para a banda e o estúdio. Então Suzi escreveu mais uma, Jennifer também… foi sendo feito assim. Na música Scatter The Rats, todo mundo compôs. Eu cheguei com o refrão e cada uma fez um verso. A gente saía do estúdio só com a melodia na cabeça, e cada uma voltava com um verso. Foi bem legal, um experimento interessante. Eu realmente amo essa música.
Isso foi há seis anos. Claro que eu vou te perguntar sobre um novo álbum…
Falando somente por mim, e não pela banda: nós vamos lançar coisas novas no futuro. Mas álbuns são muito caros para fazer, nós não vivemos mais em Los Angeles, e fica mais difícil a gente se encontrar, até mesmo para ensaiar antes das turnês. A gente se encontra quando tem um projeto acontecendo, sabe? Acho que no futuro a ideia é seguir lançando singles. São mais urgentes, rápidos de fazer. Gosto disso. Eu tenho certeza que um dia haverá um novo álbum, mas não há nada planejado.
Não dá para contar quantas garotas montaram uma banda por causa do L7. Como você lida com esse legado?
Cara, numa boa. Se eu achar um dia que nosso som está uma merda, eu pararia. Mas eu não acho que está ruim — ainda (risos)! Os shows que fazemos, o que a gente entrega, estão bem legais. Se um dia eu entender que estão patéticos, não farei mais de jeito nenhum. E entendo que soam bem e fazem sentido para muitas pessoas.

Eu acho que os temas de nossas músicas resistiram ao tempo. Ainda são uma voz de resistência contra o que está rolando agora. Ainda conectam as pessoas. Eu acho maravilhoso bandas que se inspiraram na gente aparecerem e sendo mais politicas. Não se posicionar é bizarro. Espero ver mais bandas fazendo música de protesto, mas sempre conservando algum bom humor. E esperem por mais músicas de protesto sendo lançadas pelo L7!