L7 Foto: Reprodução/Internet

Feminismo, grunge e atitude punk: a história do L7, grupo que volta ao Brasil em 6 datas

Music Non Stop
Por Music Non Stop

Em tour sul-americana, banda pioneira do movimento grunge se apresenta em São Paulo, Ribeirão Preto, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte e Rio de Janeiro

Por Bruna Monteiro de Barros

Nesta sexta-feira, 20, o L7 começa por São Paulo uma turnê sul-americana tocando seus clássicos. A oportunidade de ver no palco a formação que interessa de uma das principais bandas do movimento grunge, com suas integrantes revigoradas, é ouro.

Donita Sparks, Suzi Gardner, Dee Plakas e Jennifer Finch vieram do “faça você mesmo” do punk de Los Angeles, encontraram sua turma em Seattle, viveram o auge nos anos 90 e voltaram para o do it yourself. Nessa trajetória, criaram um legado de atitude, feminismo e música rasgada, e ganharam muitos fãs leais.

Foram esses fãs que fizeram a banda querer voltar em 2014 — 13 anos depois de ter parado —, ao mostrarem para o quarteto nas redes sociais o quanto elas eram reverenciadas. O retorno foi anunciado na página oficial do L7 no Facebook, pedindo engajamento dos fãs para convencer os produtores de shows a contratá-las. Deu certo, e elas estão rodando desde então. Passaram por São Paulo em 2018, num show que colocou abaixo o Tropical Butantã, e voltam agora ao Carioca Clube para mostrar seu The Best Of.

O caminho para Seattle

O L7 nasceu quando Donita e Suzi frequentavam a cena punk artística de Los Angeles em 1985, e amigos em comum achavam que elas deviam se conhecer porque ambas tocavam guitarra. Donita, com seu desejo de ter todos os olhos para si, veia política e uma vontade de mudar o mundo, se juntou a Suzi, que era poeta, mas queria ser rocker e expressar suas emoções — e ainda desafiou a mãe, que via o Diabo no som que ela ouvia. 

Suzi mostrou as fitas K7 com suas composições, e o que saiu dos falantes foi um rock “cru, pesado e arrastado”, como Donita descreveu no documentário Pretend We’re Dead. O som conquistou a recém-amiga e virou a base do novo grupo.

A dupla passou quase dois anos tocando em lugares trash, sofrendo para encontrar um baterista e um baixista e lutando para pagar as contas. Em 1987, quando elas estavam quase desistindo, uma frequentadora assídua dos shows colou e pediu para tocar baixo. Era a chegada de Jennifer e a mudança de status. Ela já tinha tocado com Courtney Love e era a garota dos contatos. Baixo, porém, não era seu forte, e ela compensava a inabilidade de tocar com muita atitude headbanger.

Junto ao então baterista Roy Koutsky, as três começaram a fazer shows mais profissionais e, em 1988, gravaram o primeiro álbum, produzido por Brett Guretwitz, do Bad Religion, e dono do selo Epitaph Records. Foi com o Bad Religion, inclusive, a primeira turnê. Na volta, Roy se demite, e a banda volta a penar.

Dee estava ouvindo Patty Smith e fumando maconha quando Danita bateu à sua porta seguindo os rastros da indicação de uma super baterista. Na primeira audição, impressionou. E estava então definida a formação feminina do L7 que se consagrou.

Ser uma banda só de mulheres não era o diferencial que o quarteto almejava. Elas queriam ser reconhecidas como uma banda de rock, e pronto. Com o hard rock tomando conta e a pegada Motorhead nas apresentações, foi a cena metal que falou primeiro delas. Na capa de uma revista especializada, a manchete: “Meninas tocam rock!”.

Pra fugir dessa visão, elas não usavam maquiagem nem roupas sensuais. Tocavam de perna aberta e o instrumento no joelho. Batiam cabelo, caíam de joelho, se jogavam na plateia. Sabiam que eram o oposto da cena rocker de LA, tomada por testosterona e pela misoginia, e daqueles homens que não tinham interesse em tocar com mulheres. Elas tinham que sair dali.

Havia vários selos pipocando pelos EUA. Podiam ir para Mineápolis, Portland, Austin ou Nova Iorque, mas Seattle foi a cidade escolhida. A Sub Pop Records estava grande, e Jennifer e Courtney ouviam muitos discos vindos de lá. A cena grunge estava se formando como resposta à decadência do rock. O L7 não podia ter escolhido um lugar melhor. As minas encontraram uma galera mais progressista e “caras feministas”, como Donita descreveu, que não se sentiam ameaçados por elas e as acolheram como uma banda de rock de verdade.

De novo pelos contatos de Jennifer, a Sub Pop foi vê-las tocar, e logo elas estavam na gravadora de Nirvana, Mudhoney e Soundgarden. A gravação de Shove para uma coletânea virou sucesso no underground. 

Tantos clitóris

Com o novo hit, no qual elas reclamavam de homens que beliscavam a bunda e do chefe que mandava escovar o cabelo, Smell the Magic saiu em 1991. O álbum tinha também Fast & Frightening, com o clássico verso: “ela tem tanto clitóris que não precisa de bolas”. 

Mas o feminismo extrapolava as letras e as atitudes no palco. Foi em 91 também que elas criaram o Rock for Choice, um festival que apoiava a liberação do aborto, o direito da mulher sobre o seu corpo, arrecadava fundos para a causa e estimulava a galera a se registrar para votar.

Na primeira edição, Kurt Cobain abriu o show com a frase: “Mantenham as suas leis longe do corpo das minhas irmãs”. Além do Nirvana, se apresentaram Pearl Jam, Bad Religion, Stone Temple Pilots, Bikini Kill, Hole, Red Hot Chilli Peppers, Rage Against the Machine e muitos outros.

O Rock for Choice era também uma fundação, virou um disco ao vivo e durou até 2004, além de ter inspirado os filhotes Rap for Choice e Rave for Choice.

Anos 90

Da Sub Pop, o L7 foi para a Slash Records, pela qual lançou em 92 seu terceiro álbum, Bricks Are Heavy (produzido por Butch Vig, produtor do Nirvana), que trazia o que seria o grande hit definitivo da banda para todo sempre: Pretend We’re Dead

Daí em diante, tudo o que rolou foi uma avalanche de sonho rock’n’roll: turnê europeia, estouro na Inglaterra, limusines, estúdios incríveis, entrevistas em programas pop… E festivais. E festas. E drogas, muitas drogas. “Heroína caía dos bolsos”, Donita descreveu uma vez.

A autenticidade das meninas imperava: maquiagem extremamente borrada, cabelos coloridos, roadies pelados no palco, calça baixada ao vivo na TV. A atitude não tinha limite. No festival britânico Reading, de 1992, abrindo para um Nirvana que já era gigante, elas entraram no palco sem passar som e fizeram um show bem questionável. O público começou a jogar lama. A resposta foi Donita arrancando o OB e tacando na plateia: “Comam meu tampão, idiotas!”.

Show histórico no Brasil

Quando pisaram no Brasil para o Hollywood Rock em 1993, Donita, Suzi e companhia ficaram de queixo caído com meninas esperando no aeroporto aos berros, cantando o nome do L7 no térreo do hotel, seguranças armados, escolta da polícia. Mas foi a reação épica do mar de gente ao show enérgico e surpreendente que fez com que a passagem ficasse marcada na memória da banda como uma das melhores da carreira. E, claro, na do público também.

Então o tempo foi passando, o disco de ouro nunca veio, a grana não entrava como se imaginava, as coisas foram perdendo o sentido. A morte de Kurt Cobain e depois a de um roadie querido dentro do trailer da banda foi mudando o clima. No Lollapalooza de 1994, as minas tocaram de dia, num galpão, o que as deixou bem putas e desanimadas.

Hungry for Stink é lançado nesse contexto. Mais pesado. As letras políticas e festeiras dão lugar à paranoia (Can I Run: “quando ele está me seguindo, ele não é meu irmão, é meu inimigo”) e à depressão (Questioning My Sanity). A Rolling Stone crava que o L7 abandonou o grunge.

Em 1997, Jennifer manda um bilhete avisando que deixaria a banda. O quinto disco sai pela Warner com The Beauty Process: Triple Platinum, com uma baixista convidada em algumas faixas. 

Em 1999, elas decidem criar sua própria gravadora, Wax Tadpole Records, quando se veem sem contrato, e lançam Slap Happy já com outra baixista, com baladas e referências a outros estilos, como rap. Num programa de TV, elas justificam a empreitada: “Cansamos dos executivos ficando com todas as prostitutas e a cocaína. Queremos as prostitutas e a cocaína para nós”.

Segundo o documentário Pretend We’re Dead, as vendas foram baixíssimas e a distribuidora devolveu os CDs, que foram destruídos. Ainda assim, o L7 ainda estava vivo. Mas não sobreviveu à saída de Suzi Gardner. Donita foi avisada por telefone. A parceira estava em uma crise de meia-idade e achava que tinha jogado a vida fora com a banda. Em 2001, melancolicamente a banda acabou, sem qualquer aviso.

O retorno com Donita, Suzi, Dee e Jeniffer rendeu um single contra Donald TrumpDispatch from Mar-a-Lago, e outro chamado I Came Back To Bitch, no qual elas pedem para os “filhos da puta gananciosos” respeitarem a palavra rockstar: “Você não é um rockstar, mas você está olhando para uma”. 

Vê-se que a atitude continua intacta. E o som no palco só melhorou. O L7 que roda agora pela América do Sul é o autêntico, e continua entregando tudo. 

L7 no Brasil

Voltando ao país depois de cinco anos, o quarteto se apresenta nesta sexta-feira, 20, no Carioca Club, em São Paulo, com abertura do Cólera e do Mercenárias, clássico grupo do punk rock brasileiro.

Depois, parte para Ribeirão Preto (22/10, no Quinta Linda), Curitiba (24/10, no Tork n’ Roll), Porto Alegre (25/10, no Opinião), Belo Horizonte (27/10, no Mister Rock) e Rio de Janeiro (29/10, no Sacadura 154).

Ainda haverá shows em Buenos Aires (31/10), Santiago (02/11) e Bogotá (04/11).

L7

Imagem: Divulgação

× Curta Music Non Stop no Facebook