Pragaash Pragaash. Foto: Divulgação

A trágica história da Pragaash, primeira banda de rock feminina da Caxemira, na Índia

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Primeira banda de garotas da região da Caxemira, Pragaash brilhou antes de ser esmagada pelo preconceito

Tudo estava dando certo para que Noma Nazir Bhatt (guitarrista e vocalista), Aneeqa Khalid (baixista) e Farah Hassan (baterista) concretizassem seus planos de “viver o sonho do rock’n’roll”.

Depois de alguns anos ensaiando em garagens e compondo suas músicas, elas foram chamando atenção. Era o primeiro grupo feminino de rock da Caxemira, região dividida entre o Paquistão e a Índia. A banda Pragaash foi formada em Srinagar, uma bela cidade de verão às margens do rio Jhelum, situada no lado indiano, ao norte do país. Uma área predominante muçulmana, que faz divisa também com o Afeganistão, o Tibet e o Nepal.

Com quase um milhão de habitantes — número mais do que suficiente para ter uma cena cultural vibrante —, Srinagar recebia anualmente uma “batalha de bandas”, concurso comum em diversas cidades do mundo. Noma, Aneega e Farah não pensaram duas vezes e inscreveram a Pragaash na edição 2012 da batalha. Era a grande chance de ganhar alguma projeção.

Pragaash

Noma Nazir Bhatt, guitarrista e vocalista da Pragaash. Foto: Reprodução/Youtube

E então, o sonho virou pesadelo

A participação da Pragaash no concurso foi primorosa. Levaram o prêmio de Melhor Performance e começaram, a partir dali, a conquistar centenas de fãs. Filmagens nas redes sociais com a apresentação das garotas na Batalha das Bandas fez grande sucesso. E então, a verdadeira face dos cidadãos da Srinagar começou a ser exposta.

Ao contrário do reconhecimento pela qualidade artística da Pragaash, um tsunami de indignação tomou conta da cidade, chocada pelo fato de um grupo musical ser composto por garotas. O ódio, logo, se tornou violência.

As três musicistas foram vítimas de ameaças vindas de todos os lados. As mais violentas falavam em assassinato ou estupro, caso seguissem com a banda.

O comportamento da população da Caxemira em relação à Pragaash chamou a atenção da Índia e do mundo. Mensagens de apoio às garotas chegaram de diversas partes do planeta. No entanto, as autoridades indianas tomaram outro caminho, o de relativizar os ataques sofridos.

Omar Abdullah, ministro-chefe da região, inicialmente declarou apoio à causa, mas absolutamente nada foi feito para investigar as ameaças. Já Mehbooba Mufti, a então presidente do PDP (o Partido Democrático indiano), veio a público para dizer que o assunto era “mera propaganda feita pela Pragaash”, e que — pasmem! — “comentários virtuais não podem ser considerados como ameaças”.

O que poderia ser a chance de uma carreira no mundo da música, acabou se tornando uma fonte de sofrimento para três jovens mulheres. Nenhuma casa de shows considerava admitir a banda em seus palcos, com medo de possíveis reações violentas por parte da população.

Em fevereiro de 2013, apenas três meses após vencerem a Batalha das Bandas, a reportagem da BBC foi até a Caxemira para entrevistar a Pragaash. A resposta:

“Apenas contem para todo mundo que desistimos”

Para quem quiser saber mais sobre essa dura e triste história de como preconceitos seguem esmagando sonhos, o filme Pragaash (The Song of Silence) foi lançado em 2017, pela Marijuana Films. Escrita e dirigida por Janmejay Singh, a obra conta com entrevistas reais de Noma e outras personalidades musicais famosas da região.

 

 

 

 

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.

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