Do gospel às pistas, cantora e compositora Jotta A lança EP eletrônico com remixes do DJ Meme

Claudia Assef
Por Claudia Assef

A combinação de uma voz potente e cheia de personalidade com uma história de vida que poderia virar filme da Netflix fez a cantora e compositora Jotta A ganhar manchetes de jornais pelo Brasil recentemente, por conta do anúncio de sua readequação de gênero.

Além de cantora pop, agora ela quer conquistar as pistas de dança e vai usar como primeira munição um EP de remixes com produção do craque DJ Meme.

O EP Jotta A – Chances (DJ Meme Remixes), lançado em todas as plataformas nesta sexta (14/4), é a primeira investida da cantora no universo dos DJs. A música original faz parte do álbum La Drácula, lançado em fevereiro deste ano. Outro disco de remixes já está previsto para o segundo semestre.

DO RAUL GIL AOS CLUBS LGBT

A vontade de se aproximar da música eletrônica veio depois que Jotta passou a conhecer o trabalho dos DJs em clubes LGBT de São Paulo e do Rio. Nada mais normal para uma jovem de 24 anos, não fosse pelo seu histórico de carreira como garoto prodígio da música gospel, revelado pelo programa Raul Gil aos 13 anos de idade.

Nascido em Guajará-Mirim, Rondônia, filho de pais evangélicos, Jotta encontrou nos corais da igreja Assembleia de Deus, frequentada pela família, uma forma de expressar sua paixão pela música. Aos seis anos de idade, gravou seu primeiro CD, com letras pentecostais, que era copiado de forma caseira e vendido na própria igreja.

A cantora Jotta A deixou a música gospel para investir no pop há três anos. Foto: Gabriel Mendes

O que de início era brincadeira foi virando uma carreira num dos mercados que mais crescem no Brasil, o da música gospel, transformando Jotta num nome consolidado dentro do gênero e chamando a atenção da gravadora Central Gospel Music, de Silas Malafaia, pela qual lançou o álbum Geração de Jesus, que chegou a ser indicado ao Grammy Latino na categoria música cristã em português, em 2014.

Capa do CD Geração de Jesus, de Jotta A, indicado ao Grammy Latino em 2014. Reprodução

TRANSIÇÃO PARA O POP 

Fã de ídolos da música cristã como Kim Burrell, Donnie Mcclurkin e Leonardo Gonçalves e da música secular (forma como os cristão se referem à música sem cunho religioso) como Michael Jackson, Whitney Huston e Beyoncé, Jotta ganhou manchetes pelo Brasil todo quando anunciou em março deste ano em suas redes sociais seu novo nome social, Ella Viana de Holanda, já registrado em seu RG. O nome foi escolhido após o início de sua transição de gênero, em 2022.

Sua transição para a música pop poderia ter acontecido mais cedo na carreira, quando o produtor canadense David Foster, autor de músicas de Celine Dion e Michael Jackson, o procurou quando ainda era adolescente. “Minha mãe não deixou por causa da igreja”, lembra Jotta.

ALVO DE HATERS

Mas o pop não desistiu de Jotta e há três anos ela deixou a música gospel para trilhar um novo caminho. “Tinha uma dificuldade muito grande em sair daquele mercado, primeiro porque eu tinha um contrato que me aprisionava muito. Foi uma carreira que me trouxe muitas oportunidades, tem vídeos meus que têm mais de 60 milhões de visualizações. Mas fui me descobrindo e querendo me expressar como uma pessoa LGBT e estava num meio em que não havia nenhuma referência de pessoas LGBTs. Foi ali que comecei a enxergar que, fora do mundo religioso, eu poderia ser livre”, diz.

Lá se vão três anos desde que Jotta deixou a música gospel, carreira que a abasteceu com fama, conforto e discos de ouro e platina, e dois anos desde que anunciou a transição para o gênero feminino. “Foi uma transição não só pra mim. Teve um choque muito grande no meu público mais conservador, fui alvo de muitos haters, me ameaçando até de morte. Mas quando coloquei os pés no chão e mostrei que não ia abandonar minha identidade, aos poucos as pessoas foram começando a entender, inclusive meus pais”, conta.

JOTTA PARA AS PISTAS

O EP Chances traz referências de ítalo-disco, synthpop e, claro, house music. A musicalidade e a voz de Jotta combinadas com a habilidade de Meme como remixer nos fazem viajar do pop gringo de Anitta em sua versão oitentista de Boys Don’t Cry até os floreios vocais da Pabllo.

Jotta e Anitta, aliás, têm um ponto de intersecção: o produtor musical e arranjador Rafael Castilhol, recém-vencedor do Grammy Latino pelo álbum Numanice #2 de Ludmilla.

Além de cantora e compositora, Jotta trabalha na produção vocal de todas as suas músicas. Com Pabllo, ela enxerga uma similaridade no que diz respeito à performance, seja no papel de atriz em seus videoclipes ou como dançarina, nos shows.

“O trabalho da Pabllo é incrível. Ela e Gloria Groove estão abrindo caminhos pra gente expandir e não segmentar só no mercado LGBT. Apesar de sermos uma bandeira, acho que a música tem que ser levada adiante a todas as pessoas”, acredita Jotta.

 

Claudia Assef

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Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.