Beyoncé e Kendrick Lamar Beyoncé e Kendrick Lamar. Foto: Reprodução

De Beyoncé a Kendrick Lamar: a arte de transformar surpresas em fenômenos virais

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Rapper americano pegou o mercado no contrapé com o lançamento de GNX, mas está longe de ter sido o primeiro a usar esse tipo de estratégia

Kendrick Lamar conseguiu toda a atenção que pretendia para o seu novo álbum, GNX, fazendo exatamente o contrário do que mandam os manuais de estratégia de marketing musical. Enquanto todo mundo lança um punhado de singles, divulgados através de comunicados à imprensa e postagens em redes sociais, tudo para ir prendendo antecipadamente a atenção do público até o grande dia de lançamento, o rapper decidiu soltar seu disco em todos as plataformas digitais na miúda, quietinho, na última sexta-feira, 22.

Viralizou. Fãs de Kendrick notaram que assim, do nada, um novo álbum com 12 músicas estava disponível. As redes sociais bombaram graças ao comportamento típico do ser humano em ser o primeiro a espalhar uma fofoca. A ideia foi uma forma de nadar contra o tsunami de lançamentos musicais que inunda a internet diariamente. Em apenas um dia, cerca de 120 mil novas músicas são apresentadas nos serviços de streaming. Mais do que no ano inteiro de 1989. É muita coisa. Para conseguir chamar a atenção, é preciso ser criativo.

Kendrick Lamar não inventou a roda. Copiou uma estratégia já usada anteriormente (veja nossa lista abaixo) e se uniu a um seleto grupo de artistas que conseguiu causar com lançamentos malucos. Relembre cinco casos emblemáticos!

Jack White (2024)

Quem comprou na loja da Third Man Records (gravadora de Jack White) em 19 de julho de 2024, recebeu como brinde um estranho disco de vinil. No selo, apenas papel branco. Sem nome de artista, nem de música, nada. Tratava-se do mais novo disco de White, carinhosamente apelidado pelos fãs como No Name. Não bastasse a bizarrice, White publicou um post nas redes sociais pedindo para que os fãs pirateassem o disco à vontade. Saiba mais sobre o episódio aqui.

Beyoncé (2013)

Há 11 anos, Beyoncé inventava a estratégia copiada por Kendrick Lamar. Só que em um mundo ligeiramente diferente. Naquela época, o padrão de consumo era através dos arquivos de MP3, vendidos em lojas como o iTunes e tocado em aparelhinhos minúsculos que levávamos a todos os lugares.

A artista que reinou durante a década toda resolveu fazer uma surpresinha para o mundo: sem nenhum aviso prévio (nem antes, e nem depois do lançamento), seu álbum homônimo apareceu disponível à venda pelo iTunes, causando um tremendo alvoroço, 12 dias antes do Natal de 2013. O pacote ainda veio acompanhado com um videoclipe para cada canção, 20 no total, e ditou uma tendência que dura até hoje: a dos lançamentos musicais serem feitos, via de regra, nas sextas-feiras. Saiba mais sobre o episódio aqui.

Boards of Canada (2013)

Para aproveitar as promoções do Record Store Day, dia de promoções feito em homenagem às lojas de vinil, a banda eletrônica canadense Boards of Canada espalhou cards do tamanho de uma capa de disco de 12 polegadas com enigmas no meio das prateleiras de discos em algumas lojas do país. Fuçando pela loja toda, era possível encontrar todos os cartões e decifrar as pistas, que levavam ao acesso para baixar o novo álbum da banda, Tomorrow’s Harvest. Foi uma febre. Hoje em dia, a coleção de cards pode ser encontrada à venda na internet por quase seis mil dólares.

Radiohead – In Rainbows (2007)

Em 2007, a indústria da música passava por um nevoeiro danado. As vendas de CDs estavam em queda livre. A pirataria bombando (graças aos mesmos arquivos MP3), e muita gente dizia que o futuro da música era ser gratuita. O Radiohead então, saiu na frente e fez mais: apelou para a consciência do seu público. Lançou In Rainbows de forma totalmente independente, sem gravadora, colocando no ar um site exclusivo para fazer o download do disco e “pagar quanto quiser”. Um campo em branco pedia que o fã simplesmente digitasse quanto valia o álbum, incluindo zero libras, para os mais mão de vaca. Em um mês, a banda arrecadou o equivalente a 2,5 milhões de dólares.

Nine Inch Nails (2007)

Após um show em Lisboa, um pendrive foi encontrado dentro do banheiro da casa onde o Nine Inch Nails havia acabado de tocar. Entre os arquivos, estava uma música inédita do grupo e pistas para abrir o portal de um incrível game virtual criado pela empresa 42 Entertainment. Dentro dessa realidade paralela, o aventureiro encontrava um mundo distópico em que, seguindo as pistas certas, resultava no encontro de um novo álbum completo da banda, chamado Year Zero. O jogo virou um sucesso tão grande que a HBO anunciou que vai produzir uma série contando esta história, ainda sem data de lançamento anunciada.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.