10 livros essenciais para entender a música brasileira
Para conhecer desde as origens do samba à música eletrônica nacional
Quando é preciso pesquisar história, nada substitui um bom livro, o delicioso calhamaço de papel (ou de dados, se você é um adepto dos e-books) compilando anos de pesquisas sobre um assunto, uma época ou, no caso da nossa lista de hoje, movimentos culturais. No Brasil, muitas páginas ainda estão em branco no que diz respeito à documentação de revoluções culturais que seguem reverberando até hoje. Mas isso não significa que não exista uma boa quantidade de obras literárias para se aprofundar no conhecimento de como se desenvolveu a música em nosso país.
Os livros que falam sobre o mundo da música são, além do mais, muito divertidos. Recheados de histórias sobre as agruras, presepadas e prosopopeias realizadas por músicos, gravadoras, articuladores culturais e “figuras carimbadas” deste universo. Molho apimentado, somente, para temperar as histórias incríveis de luta, superação e aglutinação de gente em torno do novo. Aquele “novo que sempre vem”, segundo o grande Belchior.
Dia 23 de abril, celebramos o Dia Mundial do Livro, objeto que passeia por nossas mentes o dia todo, como fonte de pesquisa para tudo o que você lê aqui no Music Non Stop.
Para comemorar, listamos dez livros indispensáveis para quem quer compreender a música no Brasil. Boa leitura!
Para entender as origens do samba
O paraibano Hermano Vianna (irmão de Herbert, dos Paralamas do Sucesso) é um antropólogo que, por duas vezes, se debruçou na ligação entre a música e o ambiente social em que está inserida. O Mistério do Samba, seu livro de 1995, é um deles. O outro, aliás, também está nesta lista, mas falaremos dele mais tarde.
O samba mistura o ritmo vindo da África com a melodia vinda de Portugal. É, portanto, um gênero musical brasileiríssimo. Mas como foi que ele desceu o morro, nas décadas de 20 e 30 do século passado, se misturou com a classe média carioca, viajou para os Estados Unidos com Carmen Miranda e caiu no coração de toda a comunidade jazzística americana? É isso que Vianna explica.
A febre da MPB e seus festivais
Em meados dos anos 60, os Festivais da Canção chegaram junto com popularização da televisão no Brasil. Acompanhados também pelas revistas e rádios, criaram torcidas de fanatismo capaz de deixar o povo do futebol no chinelo. Foi a febre dos festivais que apresentou ao grande público nomes como Chico Buarque, Nara Leão, Jair Rodrigues e Os Mutantes, entre tantos outros.
Zuza Homem de Mello foi testemunha ocular de tudo isso. Trabalhava como técnico de som do Teatro Record, sede dos primeiros e maiores Festivais da Canção. Bom de texto e de memória, o homem disseca com maestria detalhes dos bastidores dos eventos. Está tudo ali, em seu livro A Era dos Festivais (2003).
A era dos festivais também serviu para amplificar a politizada e sofisticada Música Popular Brasileira (MPB). O movimento corria simultaneamente, com altas doses de rivalidade, com a Jovem Guarda. Vale conhecer também o Jovem Guarda – Em Ritmo de Aventura, de Marcelo Fróes.
E se você quiser voltar um pouquinho no tempo e conhecer as histórias dos cantores e produtores (e suas noitadas em botecos no centro de São Paulo) da era de ouro do rádio (anos 50 e 60), descole também A Era do Rádio, de Lia Calabre, e a engraçadíssima Adoniran – Uma Biografia, de Celso de Campos Jr.
Para entender a importância do tropicalismo
A geração campeã dos primeiros festivais da canção, já conhecidos e admirados nacionalmente, começou a se articular, a partir de 1967, para usar seu poder de mídia em uma guerrilha contra os problemas nacionais que realmente os incomodavam: a ditadura militar e a identidade da arte brasileira. O tropicalismo nasceu com manifesto, coletivo de artistas e se estendeu, além da música, para o teatro, o cinema e as artes visuais.
Em Tropicália – a história de uma revolução musical, lançado em 1997 e escrito pelo carioca Carlos Calado, as causas e consequências do movimento que durou pouco, mas mudou muito, são passadas a limpo.
A importância do Rio de Janeiro na música brasileira
Nelson Motta é aquele carinha boa onda. Conhece todo mundo, é bom de papo e está em todos os lugares, desde os anos 60, em que tem algo relevante na música carioca. Ler Noites Tropicais é pegar carona com o cara e entender, de ponta a ponta, como eram os rolês da turma da Zona Sul do Rio de Janeiro, desde os tempos da bossa nova até a discoteca Frenetic Dancing Days (que era dele, por sinal).
O livro de 2000 é considerado um dos indispensáveis do jornalismo musical, que significa, primordialmente, relatar as bebedeiras, noitadas, afters, furadas, festas e shows como eles eram, testemunhados presencialmente em meio a gênios da música brasileira.
O fenômeno do rock brasileiro dos anos 80
Durante a década de 80, o gênero musical mais ouvido entre os jovens brasileiros não era o sertanejo, o axé ou o pagode. Era o chamado “rock nacional”. Bandas como Paralamas do Sucesso, Titãs, RPM, Legião Urbana e Engenheiros do Hawaii rodavam o país lotando ginásios, vendendo milhões de discos e ditando a moda entre a garotada. Seu poder era tão grande que, quando o Rock in Rio se popularizou na capital carioca, os artistas brasileiros vendiam mais discos do que os headliners gringos, o que chegou a causar, inclusive, protestos por receberem menos e terem menos potência de som nos palcos do festival.
Fazendo a lição de casa do bom biógrafo, Ricardo Alexandre apresenta um panorama político, econômico e social da década em seu livro Dias de Luta, explicando por que todo mundo resolveu se interessar por rock brasileiro.
As origens do funk carioca
Enquanto as rádios esfarelavam os ouvidos da juventude com Faroeste Caboclo, hit de nove minutos do Legião Urbana, os morros cariocas ferviam. Nos anos 80, o funk carioca dava seus primeiros passos em bailes movimentadíssimos.
Hermano Vianna, de quem já falamos mais acima, é dono de um dos mais importantes estudos sobre a antropologia por trás do movimento do funk carioca nas favelas do rio. A frase “eles fazem música como constroem suas casas” é dele. Seu trabalho é imparcial também, já que há um gigantesco preconceito por trás desta manifestação artística. Tudo isso faz do livro O Mundo Funk Carioca, lançado em 1988, indispensável.
O poder da cidade de São Paulo
A cidade de São Paulo constrói sua música através da arquitetura. Já teve, por exemplo, sua versão do icônico seu Chelsea Hotel, onde viviam astros da música em Nova Iorque. Também teve um teatro, que depois virou editora, que depois virou gravadora, e então o grande epicentro da vanguarda paulista de música — o Lira Paulistana —, por onde circulavam mentes como a de Arrigo Barnabé. A maior banda glam brasileira, Secos & Molhados, aliás, surgiu tocando no hall de um outro teatro, o Oficina, tocando no intervalo de uma peça.
Fabiana Caso e Talita Hoffmann correram atrás de todos esses lugares, juntaram com as pessoas que os frequentavam e um retrato de época para explicar, no livro O Som De São Paulo, de 2021, como os buracos, becos e inferninhos da cidade colaboraram para a criação de movimentos artísticos importantíssimos para a música brasileira, como o rock psicodélico e o pós-punk.
O novo rock brasileiro dos anos 90
A chegada da MTV ao Brasil deu impulso e visibilidade a centenas de bandas de garagem, que finalmente podiam ganhar alguma exposição além das fitinhas demo em cassete, que distribuíam pelos correios para fanzines e revistas. No meio desse movimento estava Gabriel Thomaz, hoje líder dos Autoramas, mas, no começo dos anos 90, mais um garoto em busca do sonho de viver de música.
Com histórias contadas no formato quadrinhos, ilustrados por Daniel Juca, o livro Magnéticos 90 – A Geração do Rock Brasileiro Lançado em Fitas Cassete segue no formato “eu estava lá”, de Noites Tropicais, por exemplo. E como Thomaz estava em todos os lugares, então história boa não falta!
Por que o Pará é tão legal
Basicamente por que nós, do Sul e Sudeste, somos sonsos mesmo. A região Norte é gigantesca, rica em cultura, conectada com referências musicais caribenhas, graças às rádios AM que chegavam até lá na era pré-internet, e responsável por movimentos culturais que como a guitarrada, o carimbó e o tecnobrega, um tipo de música eletrônica tão única quanto o funk carioca, e que movimenta milhares de jovens por aqueles lados.
A distância geográfica (e uma boa lasca de preconceito) fazem com que as novidades demorassem muito a chegar até aqui e, quando chegavam, de forma distorcida, até o dia em que o resto do país se viu inundado por um monte de artistas talentosos, mandando bem demais. Caso de Jaloo e Gaby Amarantos, destaques no line-up do cultuado C6 Fest, dia 19 de maio.
Em Tecnobrega: o Pará reinventando o negócio da música, Ronaldo Lemos e Oona Castro nos ajudam a corrigir essa distorção e compreender o tamanho da revolução cultural paraense.
Para conhecer a história dos DJs brasileiros
Todo DJ Já Sambou, de Claudia Assef, é a bíblia da cultura DJ brasileira. Lançado em 2003, o livro resgata histórias que remontam aos anos 50, época das “Orquestras Invisíveis”, e passa por todos os movimentos musicais em que a presença de um DJ era importante.
O livro cita os principais DJs do país, movimentos como as eras das discotecas, a aurora da música eletrônica brasileira e muito mais, com fotos e entrevistas. Se você gosta desse tema, vai amar o livro.