Clássico filme de 1977 está completando 46 anos nesta quinta-feira, 14 de dezembro
Nota da edição: O DJ Mauro Borges (1962-2018) foi um dos grandes responsáveis pela volta da disco music nas pistas no universo clubber em SP, ao inserir pérolas do gênero em seus sets históricos em clubes como Nation Disco Club e Massivo. Ele foi também um grande pesquisador do assunto e colaborou com o Music Non Stop em diversos textos, sendo este sobre a trilha que fez John Travolta virar sex symbol das pistas ainda inédito.
Encontramos esta pérola, nunca antes publicada, nos nossos arquivos, e a adaptamos para o contexto atual — no caso, o aniversário de 46 anos de Os Embalos de Sábado à Noite, celebrado hoje, 14 de dezembro de 2023.
Uma oportunidade de conhecer a história e revisitar a genialidade e bom humor do saudoso Mauro.
Neste dia 14 de dezembro, Os Embalos de Sábado à Noite (Saturday Night Fever) completou 46 anos anos. Este é também o tempo em que fui abduzido pelo mundo em que vivo até hoje: as discotecas.
O clima do clássico estrelado por John Travolta e dirigido por John Badham transformou minha vida. Só na estreia, assisti três vezes, sem sair do mesmo lugar no cinema. Também pudera. No conjunto da obra, está o melhor do som disco, impossível de resistir!
Surgido nos primeiros anos da década de 70 como uma resposta a dominação do rock, a disco music valorizava o ritmo acima de tudo, e uniu negros, latinos, gays e mulheres em torno do globo de espelhos e do hedonismo das recém-criadas pistas de dança. O termo “disco” vem do francês “discotheque” (os franceses foram os primeiros a curtirem baladas com som pré gravado — as discotecas), e o som inclui baixo funkeado, vocais soul e ritmos latinos, como salsa, e muita eletrônica.
Claro que a influência dos arranjos luxuosos da Motown arrematava o produto final. Solos de guitarra eram raros, já que o instrumento cumpria principalmente papel rítmico (Nile Rodgers que o diga). A partir de 1975, explodem os primeiros astros do novo som, que se tornam tão populares quanto os rockstars da época: KC and the Sunshine Band, Gloria Gaynor, Donna Summer, Barry White, Andrea True Connection, Boney M e os renascidos sob a strobo, Bee Gees.
E é exatamente a banda dos irmãos Gibbs — ingleses criados na Austrália e vindos da cena folk-psicodélica dos anos 60 — o alicerce para um dos maiores fenômenos da cultura pop em todos os tempos: a trilha sonora de Saturday Night Fever, lançada em 1977. Com material inédito e hits de 1975 e 1976 de artistas como Yvonne Elliman, The Tramps, KC and the Sunshine Band e Kool & the Gang, acima de tudo, é um disco dos Bee Gees.
Os irmãos vinham de um período decadente, no qual foram do folk ao country, mas se reiventaram aderindo à disco com o álbum Main Course, de 1975, e os hits Nights on Brodway e Jive Talkin’ (que também faz parte da soundtrack de SNF).
Mas foi com o álbum Children of The World (1976) que eles reconquistaram o estrelato, radicalizando na disco e atingindo o topo das paradas com Love So Right e a hiperdançante You Should Be Dancing, também presente no filme. Nesses dois álbuns, surgiu o famoso falsete de Barry Gibb, uma das marcas do grupo.
O convite que viraria o jogo veio em 1976, do antigo produtor da banda, Robert Stingwood, agora envolvido na produção de cinema. Em pouco tempo, aquele som conquistou o mundo e se tornou um fenômeno globalizado, como a Beatlemania. Tudo remetia à disco: roupas, patins, danças, programas de tv, filmes…
As músicas escritas originalmente para a trilha foram Staying Alive, More Than a Woman, How Deep is Your Love e Night Fever (minha preferida!). Todas alcançaram o primeiro lugar em vários países. Outro número um do álbum escrito pelos irmãos foi If I Can’t Have You, na voz de Yvonne Elliman.
Ainda constam no pacote outros sucessos que atingiram as paradas, como a regravação maravilhosa de More Than a Woman, com o grupo vocal Tavares; o hino Disco Inferno, com os poderosos The Trammps; KC, com o hit Boogie Shoes; e Walter Murphy e sua versão disco da Quinta de Beethoven.
Em números, a coletânea de Embalos de Sábado à Noite é a segunda mais vendida em todos os tempos, perdendo apenas para a de O Guarda-Costas (1992), e é o sétimo disco mais vendido na história, com mais de 40 milhões de cópias.
O sucesso foi tanto que fez dos Bee Gees os artistas com maior quantidade de hits número um nas paradas americanas em toda a década de 70. Somente Beatles, Elvis, Madonna e Paul McCartney os superam em recordes de vendas e prêmios. Assim, o grupo fechou a década de 1970 no auge absoluto.
Entre 1978 e 1979, os irmãos Gibbs estavam em tudo e em todos os lugares ao mesmo tempo. Participaram da trilha sonora de Grease, com a música tema na voz de Frankie Valli; foram número um com Emotions, na voz de Samantha Sang; lançaram a carreira solo do irmão mais novo, Andy Gibb, com o disco hit Shadow Dancing; atuaram também no filme e na trilha de Sgt. Peppers Lonely’s Hearts Club Band (que foi ofuscada pela soundtrack do próprio Embalos); e lançaram o álbum Spirits Having Flow, com mais hits de pista e das paradas, como Tragedy e a balada Too Much Heaven, que também atingiram número um em todo o mundo.
Os Bee Gees tocavam nas rádios à exaustão, tanto que, em 1980, algumas anunciaram que não reproduziriam suas músicas, como forma de atrair público. A verdade é que, no início dos 80, nos Estados Unidos, a cena rock se sentia ameaçada, e uma onda de preconceito — inclua racismo e homofobia na lista — varreu o país contra o som disco e tudo que ele representava.
Disco Sucks era o nome do movimento, e como os ingleses eram os maiores da cena, acabaram levando a principal paulada — e de volta ao ostracismo. A banda, é claro, se reergueu. Na mesma década, Barry Gibb produziu Diana Ross, Dionne Warwick, Barbra Streisand, Dolly Parton… E nos anos 90, foram introduzidos no Rock and Roll Hall of Fame, voltando a ser reconhecidos como influentes e poderosos produtores.
O legado de Saturday Night Fever parece ser infinito, e basta citar o nome do filme ou de suas músicas, e uma era de glamour e alegria vem imediatamente na mente de qualquer um, em qualquer geração.
Dedico este texto à memória de mina amada mãe, que amava me ver dançando disco.