Público curtindo uma edição do Universo Paralello na Bahia Universo Paralello. Foto: Reprodução/Site oficial

A história e o legado do Universo Paralello, festival atacado em Israel

Jota Wagner
Por Jota Wagner

O evento que, como o próprio nome diz, promove uma experiência utópica em suas pistas de dança, existe há 23 anos e revolucionou o cenário das raves no Brasil

Infelizmente, nesse final de semana o Universo Paralello ganhou as manchetes dos principais veículos do mundo através das terríveis notícias do ataque a bala no início da guerra entre Israel e Palestina, resultando em 260 mortos, até agora, e diversos desaparecidos. O universo real, com suas desigualdades e conflitos constantes, invadiu e destruiu a utopia do “paralelo”. Uma intersecção mortífera de retas, que até então, julgávamos concorrentes.

Idealizado por dois pilares da cena trance brasileira, Juarez Petrillo, o DJ Swarup, e Adriana Peres Franco, a DJ Ekanta — também conhecidos como “os pais de Alok” —, o festival surgiu na região Centro-Oeste no ano 2000, e depois se mudou para o litoral da Bahia (Praia de Pratigi), acontecendo sempre na virada do ano.

Assim como o americano Burning Man e diversos outros eventos similares, que surgiram após seu sucesso de público, o evento busca oferecer aos participantes uma experiência de fuga da realidade. Dias em que você desliga da vida comum e convive em um ambiente hedonista, de música e diversão.

Alok e seus pais

Alok entre os pais DJs, Ekanta e Swarup. Foto: Acervo pessoal

O que é o Universo Paralello?

Público curtindo uma edição do Universo Paralello na Bahia. Dentre as bandeiras erguidas na multidão, encontra-se uma de Israel

Foto: Coletiva a mente/Divulgação

Organizado atualmente em uma fazenda “pé na areia” na Bahia, o festival cresceu e se tornou um dos eventos mais procurados do Réveillon nacional. Festeiros acampam sob os coqueiros para dias consecutivos de música, cultura e convivência em comunidade.

Inicialmente voltado ao trance, foi diversificando seu line up, abraçando outras vertentes de música eletrônica, além de música brasileira e rock alternativo. No já famoso Palco Paralello, já se apresentaram nomes como Caetano Veloso, Os Mutantes, Lenine, Liniker e Djonga.

Sua importância para o cenário de eventos é significativa. O UP inspirou dezenas de outras iniciativas em regiões remotas do país, e consolidou um cenário de “festivais” — mega raves com várias pistas, área de camping e som predominantemente trance — que, sim, podem muito bem ser descritos como universos à parte.

Levando milhares de pessoas para dançar em uma realidade alternativa, este cenário passa longe do apoio financeiro de grandes marcas, e ainda assim é totalmente viável, contando com atrações internacionais, grandes desenhos de palco e contratando centenas de pessoas por edição para trabalhar em suas estruturas.

Quem não é do universo do trance sequer fica sabendo da existência dessa rede de eventos. E tudo isso, em boa parte, existe graças ao Universo Paralello.

A edição da festa em Israel fazia parte de um projeto de internacionalização da Universo Paralello, algo também inédito entre festivais brasileiros, mas comuns a outras marcas gringas, como as holandesas Dekmantel e DGTL, e a belga Tomorrowland. Petrillo licenciou o uso do nome e o conceito do evento para organizadores israelenses (formato bastante comum neste cenário), como já havia feito em diversos outros países, e estava preparando uma turnê mundial do festival. Os planos foram adiados e as postagens nas redes da UP relacionadas a isso, apagados.

A próxima edição brasileira, no entanto, segue anunciada e com venda de ingressos aberta. Acontecerá entre os dias 27 de dezembro a 3 de janeiro, em Pratigi. Juarez Petrillo, que estava na edição de Israel, ainda não conseguiu voltar ao Brasil e, segundo informações de Alok, está protegido em um bunker.

O comportamento hedonista sempre fez parte do universo da dance music. Um espaço onde as pessoas se sentiam livres dos conceitos e julgamentos sociais, e usavam esta liberdade para “limpar a mente”, e a partir do espaço criado, construir novas camadas de discernimento.

No ano em que o planeta tem deixado claro que está de saco cheio da raça humana, a escalada de conflitos e a destruição causada pela guerra invadiu, de forma trágica, estes “espaços sagrados”, gravando na mente de todos a mensagem de que, talvez, não exista mais tempo para nos refugiarmos em universos paralelos.

 

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.

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