Dubstep é o som que faz tremer as entranhas. Conheça

Claudia Assef
Por Claudia Assef

No Brasil, quem puxa o carro do dubstep é Bruno Belluomini, da festa Tranquera

A história nos ensina que novos movimentos musicais costumam sair das profundezas do underground e ganhar notoriedade apenas depois de serem processados para agradar a uma audiência mais acostumada a padrões estéticos que habitam os perímetros da normalidade. Foi assim com a disco music, com o punk, com a new wave e com o techno, gêneros que nasceram extremamente ligados a um estilo de vida e que explodiram como tendência depois de ganhar versões mais “lights”, pensadas para um plateia genérica.

Se há hoje um novo gênero que pode se candidatar à vaga de novidade capaz de vir a explodir para um público maior, o dubstep parece ser o candidato perfeito. E “explodir” é realmente o verbo mais adequado, porque, quando se fala em dubstep, logo vem à cabeça a pressão e os graves deste gênero musical tão jovenzinho, mas repleto de seguidores apaixonados.

Nascido no sul de Londres no começo dos anos 2000, o dubstep mistura elementos do dub (pioneiro estilo de música feito em estúdio, criado na Jamaica, uma espécie de reggae mais lento, com ênfase no baixo e na bateria) com house tipicamente inglesa (UK garage), geralmente mais acelerada e com influência de hip hop.

Para quem ouve pela primeira vez, a impressão é de um som sinistro, que pode fazer cócegas na caixa torácica, dependendo da proximidade que o ouvinte esteja da caixa de som. Assim como o drum”n”bass, o dubstep é quebrado, não linear, e tem entre as principais características o fato de ser um som “gordo”, para ser ouvido num sistema de som potente e com graves proeminentes.

Em 2010, o dubstep ecoou bem além das festinhas de gueto, que ajudaram a construir sua reputação de som de meninos marrentos. Até DJs mais comerciais, como o francês David Guetta, já colocaram pinceladas do gênero em seus sets, sem contar em seus remixes – fazer uma versão de dubstep passou a ser praticamente uma obrigação para qualquer produtor de música eletrônica mais antenado.

Britney Spears no gueto. Vou arriscar um jeito rápido de explicar o dubstep para quem nunca ouviu: é como ouvir uma faixa de drum”n”bass numa rotação mais lenta, arrastada, com mais efeitos sonoros, como barulhinhos de videogame e ringtones – a exemplo do grime, gênero inglês que tem origem no mesmo contexto, só que com um jeitão mais hip hop de ser.

Um dos maiores responsáveis por lançar holofotes sobre essa cena antes restrita à periferia foi o inglês Burial e seu segundo disco, Untrue, lançado em 2007. Da capa à última faixa, Untrue é um álbum denso, carregado de novidade, porém com pinta de ter sido feito por um cara com uns 100 anos de experiência só no ramo de calibragem de áudio. Um divisor de águas.

Além do destaque em festivais internacionais, o dubstep já tem produtores que conseguem travar um diálogo amigável entre o underground e o mainstream. Talvez o mais articulado nesse ofício seja o inglês Rusko, que foi convocado pela montanha-russa do pop Britney Spears para trabalhar em seu próximo álbum. Um dos artistas sensação do festival americano Lollapalooza deste ano, Rusko também já trabalhou com Rihanna, Santogold e com o rapper T.I.

Outro cara que entraria em qualquer top três de artistas mais legais do dubstep é o londrino Ollie Jones, mais conhecido como Skream. Um dos maiores divulgadores do gênero, esse garoto de pouco mais de 20 anos lançou em agosto deste ano seu segundo álbum, Outside The Box, para muita gente um dos melhores álbuns de 2010.

Outros nomes que não podem faltar na sua lista de iniciação ao dubstep são Benga (praticamente um dos criadores do estilo), Kode9 (pioneiro, já veio ao Brasil), Magnetic Man (projeto que reúne os produtores Benga e Artwork), Zomby (que sempre aparece usando uma máscara), o americano Bassnectar e Digital Mystikz (dupla formada pelos produtores Mala e Coki).

Tranquera. No Brasil, o gênero tem uma festa que traduz o espírito do dubstep para os trópicos, a Tranquera, organizada pelo DJ e produtor paulistano Bruno Belluomini. Desde a primeira vez que ouvi falar do Bruno, lembro dele agitando as bandeiras do grime e do dubstep. Por isso, fui saber dele a quantas anda o dubstep e qual a sua representatividade no Brasil:

O que te atraiu no dubstep a ponto de você ter se tornado o grande entusiasta do gênero no Brasil?

Bruno Belluomini – A atitude. O punk rock hardcore foi minha escola por muito tempo e vejo bastante semelhança entre essa sonoridade e o dubstep: o espírito “do it yourself” (faça você mesmo) e a vontade visceral de fazer música viva, explosiva, principalmente. Em essência, o dubstep é um gênero que carrega uma energia muito intensa. O grave é tão forte na pista que faz as entranhas tremerem como gelatina.

Você acha que dá para desenvolver uma cena local no Brasil?

BB – Faço a minha parte e espero que o resultado do meu trabalho esteja colaborando para isso. Mantenho a festa Tranquera no Vegas e agora estou levando-a para outras cidades. Já rolaram edições bem legais em Porto Alegre e Belo Horizonte. Além disso, faço minhas próprias produções e procuro colaborar com artistas daqui e de fora do país. Esse intercâmbio é muito importante.

Se um ET chegasse hoje à Terra e perguntasse o que é esse tal de dubstep, como você explicaria para ele?

BB – Levaria ele ao porão do Vegas para sentir a pressão do grave. Para saber o que é o dubstep, só experimentando de verdade mesmo.

Quais são seus discos essenciais para entender o gênero?

BB – O Midnight Request Line, do Skream, o Knowledge, do Toasty, e o Anti War Dub, do Digital Mystikz. Essa trinca é matadora.

Quem são hoje os grandes nomes do dubstep na sua opinião?

BB – Skream e Benga. Eles são os principais.

Texto originalmente publicado no Estadão de 30 de outubro de 2010

Claudia Assef

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Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.

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