Consumo de música em mídias físicas cresce pela 1ª vez em 20 anos
Analisando os primeiros seis meses de 2024, estudo revela que as vendas de vinil, CDs e cassetes aumentaram em 3,2% em relação ao ano anterior
Na virada dos anos 2000, toda a equipe estava de prontidão aguardando a eminente morte do mercado de mídias físicas: médico legista, agência funerária, coveiro e até o padre, pronto para dar a extrema unção. Só faltava enterrar. Mas não é que o moribundo era muito mais forte do que esperavam os especialistas em tecnologia? 24 anos depois da chegada em massa do mercado digital de música, o doente terminal não entregou os pontos, sobreviveu na UTI por muito tempo e vem, recentemente, apresentando diversos sinais de melhora.
Depois de duas décadas, estudos apontam pela primeira vez um aumento real no volume de vendas das mídias físicas (vinil, CDs e cassetes). Analisando dados da Official Charts Company e da BPI (British Phonographic Industry, associação que representa a indústria fonográfica britânica), a revista Music Week concluiu que, nos primeiros seis meses de 2024, essas vendas aumentaram em 3,2% em relação ao ano anterior, com mais de oito milhões de unidades vendidas no período (via DJ Mag). O quanto esse crescimento durará, porém, ainda é nebuloso.
Quando as lojas de MP3, a própria pirataria digital e, anos depois, as plataformas de streaming tomaram conta, a indústria das mídias físicas se viu desintegrar, de uma hora para outra. O que era um mercado milionário foi reduzido a migalhas. Quando a poeira da demolição baixou, um novo tipo de hábito passou a tomar conta de uma parte dos consumidoras: o colecionismo de vinis usados.
Uma vez que o vinil sempre foi considerado um produto “infinito” (desde que, claro, manuseado e armazenado corretamente), o mundo contemporâneo viu à sua disposição uma imensa quantidade de discos disponíveis, produzidos até o final da década de 90. Muita coisa boa dando sopa em sebos por preços ínfimos.
Nostálgicos e audiófilos começaram a encher suas prateleiras com os grandes clássicos da música. Vendedores de discos se multiplicaram e, desde então, a partir dos escombros, a venda de vinil foi crescendo ano a ano. Com o hype, artistas independentes se ligaram da nova possibilidade e trataram de começar a prensar novos álbuns no formato. A “novidade”, então, caiu no radar das grandes gravadoras.
Uma onda cativante, por sinal. O modelo de negócios proposto pelo streaming se mostrou péssimo, tanto pelas gravadoras, quanto para os grandes artistas. A turma viu neste novo comportamento uma alternativa para aumentar os lucros na venda da música. Além de relançar discos clássicos, com prensagens novinhas em folha, as majors também começaram a investir em produtos especiais. Voltaram a pipocar nas lojas os boxes contendo a discografia completa de um grande artista, ou edições especiais, acompanhadas de livretos, encartes e outros mimos.
Vale lembrar que a moda agradou também ao próprio público, que passou a sentir falta de algo mais palpável após o advento do streaming. Algo para expor na estante da sala, diferente ou exclusivo. A soma de todas essas “necessidades” foi ressuscitando algo que muitos tinham como fadado à morte. Embora a venda de discos de vinil tenha crescido aos poucos desde os anos 2000, os relatórios econômicos, que também levam em conta vendas de CDs e cassetes, puxavam o resultado para o negativo.
O primeiro fechamento positivo de vendas em 2024 foi possível graças à entrada em cena de um novo grupo de personagens: a Geração Z, que engloba os nascidos em 1995. Curiosamente, é a chamada geração digital, hiperconectada, que já chegou em um mundo habituado com o uso da internet.
Segundo pesquisa da Key Production (maior empresa de embalagens de vinil do Reino Unido), este grupo é responsável por um renovado interesse pelo consumo de música em CDs e fitas cassetes — formatos que seguiam “esquecidos” pelos colecionadores —, e corresponde à geração que mais curte música em mídias físicas no atual momento.
Os dados vão ao encontro do estudo da Music Week, que apontou que grandes artistas do maistream contribuíram bastante para o fechamento da conta. Ao promover seus últimos lançamentos em formatos como vinil e CD, Taylor Swift e Billie Eilish sozinhas foram responsáveis por 3% de todo o faturamento das mídias físicas no último ano.
O contragolpe das gravadoras e seus artistas, “forçando” a venda das mídias físicas, certamente não vai diminuir. A lucratividade destes produtos é muito maior. E isso indica que poderemos ver, nos próximos anos, um crescimento considerável e uma oferta cada vez maior para os consumidores.
Será que as boas e velhas lojinhas de disco vão voltar a pipocar nos centros das cidades? Isso, só o tempo dirá.