Boiler Room faz Recife tremer com sets emocionantes e Karol Conka divando
A fila na entrada do Forte do Brum, que sobreviveu às invasões holandesas em Recife, dava pinta do furdúncio bom que seria Stay True Brazil, evento promovido pelo Boiler Room na noite desta quinta (21). O público compareceu cedo – oito da noite já havia fila na porta – para ferver ao som de sete atrações, em festa transmitida ao vivo pelo bem sucedido projeto inglês de noitadas eletrônicas. Teve gente que desistiu de entrar por conta da fila na porta. Mas quem não arredou pé foi agraciado com uma diversidade sonora que fez esquecer esquecer da espera.
A noite começou com prata da casa, o DJ 440, garimpeiro local de músicas brasileiras lado B. Destemido, abriu a noite alternando músicas brasileiras mais conhecidas com pepitas mais obscuras, ganhando gritos, mãos pra cima e gente dançando junto, um sinal próprio da pista pernambucana que se repetiria várias vezes ao longo da noite.
Nos bastidores o clima era de camaradagem pura: copos de drinks e fatias de pizza circulavam entre a equipe Boiler Room inglesa, os convidados da imprensa internacional, os DJs e a equipe local. Um dos seguranças comentava a todo momento, “mas tá tocando música boa né?”. Bom sinal.
Nightmare on Wax circulava pela festa bem antes do seu horário de apresentação, enquanto Gilles Peterson e sua trupe observavam os compactos sete polegadas que DJ Nuts trouxera para tocar. Nuts mostrava para DJ Zegon, seu antigo parceiro de jornada musical, os discos enquanto conversavam sobre a última vez que usaram vinil e como a vida mudou com o Serato. Zegon estava acompanhando sua protegée Karol Konka, artista do selo dirigido por ele e parceira do Tropikillaz. A rapper curitibana estava num misto de excitação e ansiedade. Convidada pelo próprio Gilles para fazer uma participação no set, formato que já fizeram juntos na Europa, ela contou ao Music Non Stop que “tocar com ele é como receber um selo de qualidade, né”. Sim, de fato.
No palco, DJ Tahira exacerbava seu encantamento com Recife. Ele, que pela primeira vez tocava na cidade, juntou a seu repertório de música brasileira suingada os ritmos do maracatu, coco e outras particularidades locais, criando um novo tempero para sua mistura de samba jazz e beats. A pista respondia prontamente, mostrando que estava ali pra dançar. Ninguém arredava o pé da frente da cabine.
Gilles Peterson entraria às 22h30 para fazer seu All Brazilian DJ Set e, como bom inglês, entrou no horário e subverteu tudo. Subiu ao palco com os dois produtores que se juntaram a ele para reimaginar o clássico disco afro-brasileiro Tam Tam Tam. Antes de apresentar o novo projeto, os três ficaram ali se divertindo tanto quanto a plateia. Misturando seu conhecimento de música brasileira com o de música de pista, Gilles não deixou a temperatura cair, e quando Karol entrou para participar com duas músicas, divou. Teve gente que se pendurou no grid de luz para vê-la cantar Boa Noite. Gilles manteve Karol como MC no palco, cantando, agitando e dando a deixa para apresentar o projeto que é sua jóia rara atual.
“A primeira pessoa que me falou do Tam Tam Tam foi o Ed Motta, depois o DJ Nuts falou do disco, eu passei três anos atrás dele, é um disco raro. Quando consegui, ouvi, ouvi e senti que ele deveria ser atualizado, reinterpretado, ir para a pista de dança. Montei a banda e pretendo trabalhar nele este ano. Eu quero fazer um musical, como se fosse West End (a Broadway dos musicais londrinos), quero dançarinas, quero músicos ao vivo. Hoje foi o debut mundial do projeto e quero viajar com ele em diversos formatos” , disse o inglês com exclusividade ao Music Non Stop. Suado e com o sorriso no rosto, Gilles aproveitava o sucesso de sua apresentação de uma hora e meia com a pista nas mãos. E acertava os detalhes com o empresário de Karol para uma participação dela no álbum.
Do lado de lá da pista, Nuts com seus compactos, fez com que boa parte dos artistas e equipe ficassem parados no canto, assistindo. Uma roda de b-girls se formou no canto da pista, pouco importava se estavam de saia ou short, se jogavam no chão fazendo acrobacias enquanto alguns casais se encoxavam no ritmo da música. As transições entre artistas eram quase imperceptíveis, em alguns momentos a sensação era a de que se ouvia um grande DJ set non stop.
Nightmare on Wax entrou tocando Jorge Ben e em dez minutos já tinha jogado os BPMs pra cima, com pronta resposta da pista. Os pernambucanos são surpreendentes quando o assunto é dançar, com a cintura de mola e os pés que não param, balangam com naturalidade do afrobeat para o house sem perder a formosura.
Boiler Room Stay True Brazil por Renata Simões
A entrada de Todd Terry nos toca-discos era o sinal de que a noite estaria caminhando para o fim. Era 1h30 e o cara resolveu incendiar tudo de novo. Até o DJ Zegon, que tinha dito que só esperava a entrada do americano para ir embora, não arredou pé. Todd começou tocando uma vertente quase esquecida, o hip house, fruto do começo da década de 80 quando nos EUA os produtores de house eram conectados com a turma do hip hop. O DJ seguiu solando clássicos da house music com beats diferentes do original. Numa mão coordenava os vocais acapella enquanto na outra soltava as batidas. Usava o botão do CD-J como se fosse bateria eletrônica, e a plateia novamente respondia com gritos e as mãos para cima. De olhos fechados era fácil crer que ali era algum mítico clube e não um forte militar.
Depois de seis atrações e com mais de 40 minutos de set, a pista continuava ali, colada na cabine, esquentando o DJ retribuía, fervendo na música. O nome Boiler Room fez mais sentido do que nunca em Recife.
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