Kraftwerk Autobahn Foto: Reprodução

Obra-prima do Kraftwerk, ‘Autobahn’ faz 50 anos

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Revolucionário álbum foi lançado em 1º de novembro de 1974, pela Philips Records

Saul Smalzys, nos estúdios da rádio onde trabalhava como DJ em Chicago, chamada Triad, olhava para a capa do disco de um quarteto alemão que acabara de chegar em suas mãos. Uma mistura de placa de estrada com ícone gráfico, em branco sob um fundo azul. Minimalista, com apenas “Krafwerk” e “Autobahn” escritos, no conceito criado pelo artista Emil Schult. Hora de escutar aquele treco. Ao tirar o vinil da capa, um susto. A música-título tomava nada menos do que um lado inteirinho do álbum, com incríveis 22 minutos e 47 segundos de duração.

Smalzys ouviu a música e não teve dúvida. Subvertendo todas as regras básicas de um programa de rádio (que sempre dava preferência para músicas curtas), tocou em Chicago Autobahn, de ponta a ponta, e criou um verdadeiro frisson nos Estados Unidos ao colocar uma música completamente diferente do que estavam acostumados, poucas semanas após o lançamento do álbum na Alemanha, dia 1º de novembro de 1974.

A maluquice kraftwerkiana se alastrou pelo país. Uma música que reproduzia sons de uma autoestrada. Buzinas, motores e, pela primeira vez na história, a reprodução em um álbum de música do efeito Doppler. A atenção foi tamanha que o grupo começou a ser chamado como “os Beach Boys alemães”, graças à semelhança sonora da letra “Wir fahr’n, fahr’n, fahr’n, auf der Autobahn”, do refrão, com Fun, Fun, Fun, do grupo de rock estadunidense.

O álbum não virou de ponta cabeça apenas as concepções musicais dos Estados Unidos. Causou o mesmo efeito na Europa, consolidando o Kraftwerk como ponta de lança do experimentalismo eletrônico. Mas na terra do Tio Sam a coisa foi febril. A gravadora Philips correu para lançar o disco nos Estados Unidos já no ano seguinte, mas aí com uma versão “radiofônica” incluída no pacote, com menos de quatro minutos de duração.

Lembrem-se, estávamos em meados dos anos 70. Não havia new wave, não havia synth-pop e muito menos a música eletrônica como a conhecemos. O Kraftwerk foi fundamental em influência na criação de todos esses gêneros. E Autobahn, sua mais louca e hipnótica pérola. O primeiro disco do DEVO, Q: Are We Not Men? A: We Are Devo!, grandes colegas do Kraftwerk em termos de inventividade com instrumentos, só chegaria às lojas quatro anos depois, em 1978.

Autobahn era tão estranho e inovador que confundiu a grande imprensa musical. Basta ler as resenhas do disco publicadas atualmente com as que foram escritas na época de seu lançamento. Demorou para entendermos tudo o que o disco significava, enquanto especialistas em música. Com o público e os músicos, no entanto, foi bem diferente. Amor à primeira ouvida.

É difícil mensurar o tamanho da influência do Kraftwerk, e de Autobahn, no mundo da música. E há também o imenso universo de uma certa referência terciária. Um artista é influenciado por outro, que foi por sua vez influenciado por Kraftwerk. Nem mesmo a tecnologia de produção musical eletrônica, tão melhor, mais rápida e potente do que a usada pelos geniais garotos de Düsseldorf, consegue fazer com que sua obra soe desatualizada.

Meio século nos separa do dia de lançamento de Autobahn. 50 anos! A estrada que propuseram em seu épico de 22 minutos segue movimentada. Artistas de todo o mundo a atravessam, antes de se aventurarem a escrever as próprias músicas. Que bela rodovia!

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.