Muito além da Netflix. As séries que viraram a cabeça dos seus avós na história da TV.
A séries fazem sucesso entre os consumidores de streaming e TV e esse ‘caso de amor’ não é algo que nasceu na última década. No Brasil a produção de séries para a TV data dos anos 1950, mas nos Estados Unidos essa onda se iniciou nos primeiros anos do século XX.
com colaboração de Jota Wagner
Você sabe quais séries fazem e fizeram muito sucesso no Brasil? Qual a série mais antiga do mundo? Como são definidos os lançamentos das temporadas? Pois agora, faremos uma tour com curiosidades e informações sobre essas produções que nos fazem companhia bem antes da Netflix. Mais precisamente, das priscas eras da televisão brasileira até a década de 1970. Depois que você “maratonar” todas, avise-nos que a gente publica a segunda parte desta divertida enciclopédia, a partir de 1980.
Séries pioneiras, assistisdas pela avó da sua avó
A primeira produção em forma de seriado nos Estados Unidos se chamava What Happened to Mary e foi lançada em 1912. Produzida pelos Edison Studios, do inventor Thomas Edison, era um drama sobre o cotidiano da protagonista Mary (Mary Claire Fuller), distribuída em 12 episódios. Cada um de seus episódios exibiam uma narrativa completa que se caracterizava por ter elementos de suspense e melodrama. Paralela a exibição nos cinemas os episódios também eram publicados na revista The Ladies’ World, da McClure Publication, uma revista direcionada para mulheres na faixa dos vinte anos.
No Brasil as séries foram produzidas desde a criação da TV, com a fundação da TV Tupi, em 1950. A primeira série brasileira era protagonizada por Abelardo “Chacrinha” Barbosa e se chamava Rancho do Mister Chacrinha. Assim, como o título indica, esse seriado era em formato de faroeste, uma paródia, e Chacrinha interpretava o xerife. O Rancho era voltado para o público infantil e foi exibida em 1956.
Ao pesquisar sobre a série pioneira no Brasil é comum se deparar com a indicação de que a primeira seria Rancho Alegre com Abelardo e Mazaroppi no elenco. Entretanto esse programa, exibido em 1950, era um programa humorístico em um formato semelhante ao de programas de auditório como A Praça é Nossa.
Em 1961 o espectador brasileiro viu nas telas a estreia do primeiro heroi 100% nacional, o Vigilante Rodoviário. Produzida pelo cineasta Ary Fernandes, a série de 38 episódios conta as aventuras do policial rodoviário Inspetor Carlos (Carlos Miranda) a bordo de sua Harley Davidson 1952 em companhia de seu fiel cachorro Lobo, que viajava sentado no tanque da moto (oi!???).
Três características das séries
Todo formato ou gênero audiovisual têm características que os define. Dessa maneira a primeira característica das séries ou seriados elas podem ser ficcionais ou documentais. Apesar de ainda usarmos a terminologia série de TV, alguns títulos, nos últimos anos, são feitos para exibição em streaming.
Em segundo lugar, as séries possuem um número predeterminado de episódios por temporada. Esse padrão pode variar. Apesar do modelo estadunidense girar e torno de 13 capítulos as séries mais populares do país têm em torno de 20 episódios por temporada. No Brasil mesmo temos séries com a quantidade de episódios que variam de um ano para o outro. Por exemplo, Toma Lá, Dá Cá tem a 1ª temporada composta por 20 episódios e a 2ª por 37.
Em terceiro lugar as séries podem sofrer alterações em sua trama de acordo com a recepção dos seus fãs. Sempre que uma temporada agrada ao público a tendência é de que a emissora renove o seriado por mais um ano. Entretanto essas mudanças não são a garanta de que uma série ficará no ar, pois audiência baixa é sinônimo de pouco retorno financeiro o que resulta em cancelamento.
Há uma característica particular do mercado televisivo americano que são as datas de lançamento das temporadas. O calendário das emissoras dos Estados Unidos promovem o lançamento das séries mais importantes durante a primavera deles (entre Setembro e Dezembro). Já as séries menos impactantes, mas ainda assim aguardadas são lançadas na midseason, entre Janeiro e Maio.
Grandes sucessos do pré-internet
Quando falamos de séries de sucesso o mais comum é pensarmos nas mais recentes. Wandavison foi o seriado mais assistido em 2020, Lúcifer gera memes nas redes sociais da Netflix cada vez que um fã cobra da plataforma o lançamento da nova temporada. Seguidores de Grey’s Anatomy xingam e esbravejam, mas aguardam ansiosos pela chegada de mais um episódio. Mas se engana quem acredita que sse fenômeno é recente.
Os casais e as famílias
Em outubro de 1951 a CBS lançou uma sitcom (comédia de situação) sobre um casal e sua rotina. A série foi baseada em um programa de rádio chamado My Favorite Husband, também estrelado por Lucille Ball. Na rádio o marido era interpretado por Richard Dennig e na TV por Desi Arnaz, esposo de Ball. Essa alteração gerou alguns conflitos durante a pré-produção, pois Desi era cubano e um casal inter-racial não era bem aceito na sociedade da época.
O conflito com a nacionalidade de Desi era tão grande que um episódio, Lucy Vai a Havana, foi censurado e exibido apenas nos anos 1990, pois era proibida qualquer imagem positiva de Cuba. Ainda assim a série conseguiu seu sucesso e foi exibida no Brasil, pela primeira vez, na TV Tupi (1958-1979). Além disso foi responsável por inspirar a série nacional Alô, Doçura!, primeira sitcom brasileira com Eva Wilma e John Herbert como protagonistas.
Outras duas séries inesquecíveis que fizeram parte dos lares brasileiros foram Jeannie é um Gênio e A Feiticeira. A primeira uma gênia da garrafa que foi encontrada pelo astronauta Major Tony Nelson (Larry Hagman) e a segunda uma pacata dona de casa cheia de poderes. Inegavelmente as personagens de Barbara Eden (Jeannie) e Elizabeth Montgomery (Samantha) são protagonistas de duas séries que mostram as mudanças vividas na sociedade. Enquanto a gênia é uma mulher que mora e se relaciona com um homem sem ser casada com ele, a bruxa é constantemente avisada pela mãe (a excelente Endora de Agnes Moorehead) de que precisa querer mais do que apenas viver sua vida com um mortal. Ambas situações se relacionam com as ideias de liberdade da segunda onda feminista, como sexualidade, família e trabalho.
Ao falarmos de família e Major Nelson somos levados a lembrar de outra série para TV, mas essa é um exemplar de intrigas, conflitos familiares e longevidade. Estamos falando de Dallas, drama familiar exibido entre 1978 e 1991. A série gira em torno do Ewings, donos de uma empresa petrolífera e de um rancho de gado, no Texas. A série agradou tanto ao público e a emissora que sua trama se estendeu para filmes, spin-offs e até mesmo uma sequência, mostrando como a vida da família estava vinte anos depois, produzida pela TNT.
Serie estranha com gente esquisita
Seriado de sucesso no começo da televisão brasileira, a Família Buscapé contava a bem humorada história dos Clampetts, uma família do interior que se muda pra Beverly Hills. A série foi filmada por quase dez anos (entre 1962 e 1971) e estrelada por Buddy Ebsen, Irene Ryan, Donna Douglas e Max Baer Jr.
A Família Adams, (1964-1966), surgiu das tiras de jornal de Charles Adams e um enorme sucesso. Inspirada em uma família católica vizinha (gostos góticos, familiares morando junto, crucifixos e imagens, etc), segundo o autor, a série utiliza elementos dos clássicos filmes de terror para contar a linda história de amor de Mortícia e Gomez Adams à sua família. Ganhou até uma concorrente, Os Monstros, também de 1964 a 1966)
Animais bem treinados
É impossível falar de clássicos sem nos lembrar de dois animais que emocionaram gerações. Os cachorros Lassie e Rin Tin Tin forma exemplos de bravura e amizade. Isso sem contar o nosso Lobo, companheiro do Inspetor Carlos.
Em As Aventuras de Rin Tin Tin, Rusty (Lee Aarker) era um garoto órfão, criado por soldados em Forte Apache, um posto da cavalaria dos Estados Unidos. Exibido entre 1954 e 1959, a série mostrava o garoto e o pastor alemão ajudando os soldados em suas ações no oeste americano. Na época a série, como outros filmes, mostravam os indígenas como violentos vilões, tanto que o protagonista perde seus pais em um “ataque indígena”.
De maneira semelhante a rough collie Lassie, vive um laço de amizade e proteção com a comunidade a qual ela sempre ajuda. A série foi produzida e exibida entre 1954 e 1973 e se desdobrou em filmes e sequências. Essa série é uma das que passou pela transição do preto e branco para o colorido. Por ser uma heroína canina a cadela mudou de lar ao longo dos anos. Dessa maneira ela morou em uma fazenda, na cidade e até mesmo próximo a uma floresta.
Monstros, aliens e viagens no tempo
Quem nunca viajou em sua nave espacial também conhecida como sofá? Até os mais jovens podem relatar casos semelhantes de imaginação fértil ampliada pelos seriados de ficção científica. E a lista de séries do tempo das nossas avós são muitas.
Uma delas é Terra de Gigantes (1968-1970)que acompanhava a tripulação da Spindrift que ao realizar uma viagem entre Los Angeles e Londres cai em uma dobra temporal. O resultado, ficar preso em um planeta onde todos, exceto eles, são gigantes. Essa série foi produzida por Irvin Allen, o “mestre do desastre”, também responsável por Viagem ao Fundo do Mar, Perdidos no Espaço e O Túnel do Tempo.
A invasão cult britânica
E ainda nos anos 1960, do outro lado do oceano, alguns britânicos tiveram a ideia de produzir uma série sobre um senhor do tempo alienígena que vive em uma máquina do tempo em forma de cabine policial. Dessa forma, em 1963, nasceu Doctor Who, série mais longa em duração, até hoje. A ficção teve 26 temporadas, exibidas entre 1963 e 1986, a chamada Era Clássica quando foi suspensa. Em 2005, a BBC voltou a produzi-la e o seriado está no ar até os dias atuais. Nesse hiato, foram feitos filmes, livros, contos e até audiobooks com histórias do cânone e também versões de fãs.
Os britânicos também criaram uma das mais cultuadas séries de todos os tempos. O Prisioneiro, estrelado por Patrick McGoohan (que também criou e escreveu os roteiros) foi ao ar originalmente em 1967 e teve 17 episódios. Brilhantemente descrita na Wikipedia como uma série de “ficcão científica social avant-garde”, o programa conta a história de uma ilha utópica para onde são enviados agentes secretos aposentados após uma lavagem cerebral. O roteiro segue forte a linha do drama psicológico que amamos em filmes como Ilha do Medo e O Farol. Sim, Lost bebeu desta fonte até não poder mais.
Gente, isso era muuuuito Black Mirror!
Não podemos falar de séries longas e aclamadas sem citar a avó de Arquivo-X e Dark, Além da Imaginação. Criada por Rod Sterling em 1959, o seriado de terror, suspense, aventura e ficção científica ficou no ar por cinco anos. Nos anos 1980 três temporadas intituladas Novo Além da Imaginação foi criada e também entre 2002 e 2003, mais uma temporada, com o mesmo título da original. O programa usava da ficção científica para fugir da censura e abordar temáticas sociais e políticos da época como a guerra nuclear.
Da mesma forma os anos 1960 foram marcados pelas aventuras da nave USS Enterprise e sua tripulação desbravadora do espaço. Os personagens Kirk (William Shatner), Spock (Leonard Nimoy) e Uhura (Nicole Nichols) são lembrados até hoje pelos fãs de ficção científica. Criada em 1966, Jornada nas Estrelas teve um sucesso tão grande que gerou inúmeros spin-offs sendo o mais recente uma animação chamada Star Trek: Lopes Deck.
O Elo Perdido (Land Of The Lost) permance até hoje no imaginário de quem assistia à TV nos anos 70. A série americana contava a história da família Marshal, que viajou acidentalmente à epoca dos dinossauros.
O final ano 70 ainda viu nascer outra série cujo roteiro influencia muita coisa do que assistimos hoje em dia. Em A Ilha da Fantasia, turistas iam a um estranho resort onde qualquer desejo poderia ser realizado. Todos os hospedes chegavam em um hidroavião e eram recebidos pelo criador do resort, um misterioso Senhor Roarke (Hervé Jean-Pierre Villechaize) e seus assistente Tattoo (Christopher Hewett). Com ar meio luciferiano, Roarke realizava os desejos de todos, que deveriam arcar com as consequências de suas escolhas. O bom e velho “cuidado com o que você quer, pois pode conseguir”.
Faroeste para deixar o xerife Longmire de queixo caído
A vida na era do velho oeste foi bastante retratada em séries americanas e responsáveis por roteiros de sucesso também no Brasil. Várias delas falavam da rotina de famílias que desbravaram o oeste como Bonanza, que por 14 anos contou a história do rancheiro viúvo Ben Cartwright (Lorne Greene). Laramie, filmada entre 1959 e 1963 e reproduzida com sucesso no Brasil, trazia a saga dos irmãos Shermann em seu rancho.
Um policial rural usando uma inexplicável máscara negra sobre os olhos botava ordem no velho oeste na série O Cavaleiro Solitário (The Lone Ranger), filmada entre 1949 e 1957 nos Estados Unidos. No Brasil, a série foi apresentado com o nome As Aventuras de Zorro, gerando uma tremanda confusão com o personagem mexicano mascarado inimigo do Sargento Garcia.
Vila Sésamo
A série infantil Sesame Street era tão bem sucedida em seu país que aos poucos foi chegando em outras nações. No dia das crianças do ano de ano de 1972, estreou no Brasil, na Rede Globo e Rede Cultura de São Paulo. A série foi exibida nos dois canais até o ano de 1974, pois antes dessa data a Globo não possuía estúdios para gravar os episódios.
O seriado tinha caráter educativo de maneira espontânea e criativa, mesclando em seu cenário pessoas e bonecos. Letras, números, educação, saúde e meio ambiente eram alguns dos temas que guiavam os episódios e como complemento eram exibidas animações e canções assinadas pelos irmãos Marcos e Paulo Sérgio Valle. Como consequência, algumas gerações depois, a TV Cultura foi responsável pela exibição de séries clássicas em formato semelhante, como Rá-Tim-Bum e Castelo Rá-Tim-Bum. Em 2018, uma nova versão foi produzida com o nome Sésamo.