Lá pelos idos de 2006, 2007, a noite de São Paulo fervia em clubes como Gloria, Vegas Club, Bar Secreto, Amp Galaxy, além de festinhas em apartamentos. A cidade como sempre recebia muito bem os DJs gringos que passavam por aqui – e eles acabavam se jogando e muito na nite.
Nomões que hoje tocam em estádios e festivais enormes, naquela época topavam tocar em pequenas cabines, em clubes onde ainda era permitido fumar e o povo suava muito a camisa nas pistas. Registrando tudo isso de perto estava a fotógrafa Renata Chebel.
Jornalista de formação, Renata encontrou na fotografia uma maneira de ficar mais perto de duas outras paixões: a música e a dança. Foi fotografando noite em São Paulo, em registros que estão até hoje publicados na série SP 00, no Flickr, que ela foi conquistando experiência para entrar no mundo do vídeo.
Depois de criar vídeos para artistas como Thiago Pethit e Soul One, ela entrou dentro do “sonho de uma sereia alienígena” e o traduziu em forma de imagens tão lisérgicas que poderiam servir pra descrever uma boa viagem de ácido no clipe que produziu para o equatoriano Nicola Cruz, o novíssimo Tzantza.
A música faz parte do novo EP de Nicola, Cantos de Visión, e traz toda aquela estética latino-americana impressa numa mistura de beats eletrônicos com instrumentos como a marimba, tão característico do trabalho desse produtor e DJ que está num momento bem importante da carreira, abrindo cada vez mais portas internacionalmente.
VEJA O CLIPE TZANTZA
Falamos com Renata sobre o videoclipe, fotografia, noite e seus momentinhos como DJ – ela fazia dupla com Giuliana Viscardi e juntas tocavam sob o aka SRY, na festa Soul Sorry.
Music Non Stop – Como rolou a ideia pra fazer o clipe?
Renata Chebel – Conheci o Nicola quando estava trabalhando em Mykonos em agosto do ano passado. Estava atrás de um projeto criativo e lancei a ideia de fazer um clipe, então ele me disse que tinha essa música ainda sem lançar. Quando ouvi pela primeira vez, talvez já influenciada por estar na Grécia, fechei os olhos e a marimba me remeteu à dança sensual das algas debaixo d’água, lembrei de um dia em que a gente foi mergulhar… Conversamos sobre as cores que a música tinha, o Nicola queria que fosse algo mais abstrato. Então pensamos numa sequência de sonho, no que sonharia uma sereia alienígena.
Music Non Stop – Explica pra nós, leigos, como você processou as imagens? Quanto tempo levou pra fazer?
Renata Chebel – O processo foi longo porque fiz tudo sozinha, da maquiagem à finalização. Tinha muitas imagens, mas nem sempre elas casavam com o ritmo da música, eram muito contemplativas. Gravei a sequência das mãos em um lago em Berlim, daí fui revirar meu arquivo atrás de mais imagens. Os raios eu gravei num temporal elétrico na Chapada dos Veadeiros. Tem uma cobra que tinha filmado pra um trabalho, uma performance de projeção que fiz numa estátua em Copenhagen. Uma amiga brincando com cristais em Joshua Tree. Fui jogando efeitos, testando, achando simetrias, mexendo nas cores pra que tivessem esses tons, que é como enxergam as abelhas, em ultravioleta. Foi quase como montar um quebra-cabeças sem saber qual a imagem final. Por fim, faltava uma peça. Foi quando fui numa festa e vi uma performance da Euvira com essas franjas prateadas. Era aquilo! Filmei na sala de uma amiga. O processo todo levou quase quatro meses.
Music Non Stop – Você também é DJ. Isso ajuda na hora de editar, né?
Renata Chebel – Ah, não gosto de dizer que sou DJ! Já fui no máximo uma seletora. Hoje em dia deixo isso para os profissionais. Mas acho que ter estudado música quando criança me deu um ouvido musical, e talvez isso ajude a achar ritmo nas imagens, o timing certo dos cortes e movimentos.
Music Non Stop – Você tem uma relação forte com a noite, já fotografou e muito os rolês e tal…
Renata Chebel – Foi como comecei a carreira de fotógrafa. Eu sempre fui apaixonada por música e por dançar, pelo ritual que é uma festa. Celebração é cerimônia, diz um adesivo que eu tenho aqui. E tudo acontece na noite, principalmente numa cidade como São Paulo. Então fez sentido que começasse assim pra mim.
Music Non Stop – Como foi a caminho de transição da fotografia pro videoclipe?
Renata Chebel – Chegou uma hora em que só fotografia não me satisfazia, queria ver as coisas se mexendo, vivas na minha frente. Toda a minha trajetória acho que é nessa busca de querer dividir da melhor forma possível como eu experimento o mundo: do jornalismo para a fotografia para o vídeo, é a tentativa de comunicar minha experiência de maneira cada vez mais completa. Fora que desde criança eu tenho uma relação quase sinestésica com música, meu pai botava um Pink Floyd no carro e eu ficava vendo coisas na minha cabeça.