Foram muitos shows incríveis no SXSW 2018 (vi uma média de 10 por dia), muitos deles no Radio e International Stages, que ficam dentro do Centro de Convenções de Austin e rolam à tarde durante 4 dias. O Radio Stage é comandado diariamente por uma rádio diferente, que faz a curadoria dos artistas que lá se apresentam. A sala, que até então abrigava os keynotes da conferência de interatividade, ganha um bar e se transforma num palco. Raramente há erro por ali. A curadoria é sempre apurada, mas só passam artistas norte-americanos. Vi ótimos shows no período, mas quem ganhou meu coração foi a cantora sw rock e country (sim, country!!) Nikki Lane, de Nashville. Ela é o Neil Young de shortinhos e de pernas longas.
Já o International Stage reúne uma amostra da música de artistas de outros países. Entre os shows que assisti, três marcaram especialmente. Lali Puna foi uma artista que ouvi muito no início dos anos 2000, mas nunca tinha assistido ao vivo. Pude vê-la duas vezes. O primeiro show teve problemas técnicos no som e foi apenas razoável. Já o segundo, no International Stage, me surpreendeu e fez valer a pena a espera de anos.
O Gato Preto mistura o groove sul-africano ao funk carioca e o kuduro angolano. O resultado é que, quando você percebe, já está cantando junto com a vocalista Gata Misteriosa e dançando às intensas batidas do Lee Bass. A performance da Gata Misteriosa é de tirar o fôlego. Ela dança, pula e faz todo mundo dançar e pular com ela. Para fechar o show com chave de ouro, ela ainda fez uma homenagem à Marielle Franco.
A israelense Lola Marsh, uma versão da Penélope Cruz mais jovem, esparrama sua languidez e simpatia pelo palco. Seu indie-pop, que ficou conhecido com o hit Wishing Girl, foi atraindo todos os passantes pelo corredor do centro de convenções, que entraram e não saíram de lá antes dela encerrar o show. A agenda cheia da artista já mostra que ela não vai virar, já virou. Vê-la tocando para uma plateia de cem pessoas vai com certeza render comentários no futuro (próximo), quando ela estiver de headliner em festivais bacanas por aí.
Uma das maiores surpresas pra mim (e para muitos) foi Sudan Archives. A descrição da artista (de LA) no evento e uma rápida ouvida no spotify, trouxe a certeza de que ela seria aposta certa. Não deu outra. Eu assisti três vezes o seu show, um diferente do outro. Além da brilhante performance de palco, a artista mistura R&B e música eletrônica experimental como poucos. Ela traz elementos da música sudanesa para o seu afinado violino, que é acompanhado de sua voz doce. O show é hipnotizante e crescente. A Sudan Archives anda, dança, desfila, toca vários instrumentos e nos seduz com seus sorrisos e olhares. Que mulher! Se tem alguém que vai dar muito o que falar, vai ser ela (na real já está dando). Ela, inclusive, está escalada para a próxima edição do Coachella. Se estiver por lá, não perca.
O grego Theodore chegou até a mim via release. Cliquei no vídeo Towards, single que tinha acabado de ser lançado, e não tive dúvidas. Eu precisava vê-lo ao vivo. Theodore é multi-instrumentista, compositor, vocalista e performer. Com apenas um show escalado na Central Presbyterian Church, foi a minha escolha pra fechar a noite do dia 16 de março. Foi literalmente um show lindo de chorar. Música eletrônica de câmara, que se encaixa bem tanto em igrejas quanto em clubes. Acordes clássicos misturados a batidas eletrônicas modernas e etéreas. Kaoss Pad, glockenspiel, piano, trompete, sintetizadores, bateria e guitarra são os instrumentos utilizados por ele e pela banda. Imagina a sonoridade de tudo isso ao vivo, acompanhado de um vocal poderoso, uma performance de palco única, em que ele se contorce, senta no chão e se joga em cima dos instrumentos. Além disso tudo estar acontecendo num altar de uma igreja. Então….
O show da banda punk Pussy Riot foi uma grande manifestação. Pussy is the new dick era a frase que ilustrava a bandeira que cobria os fundos do palco. As russas, conhecidas ativistas que usam a música como plataforma para protestos, surpreenderam ao levar ao palco a Chelsea Manning, transexual norte-americana presa por ter divulgado documentos oficiais ao Wikileaks. O show foi barulhento misturando techno, punk, entre outras batidas e frases não identificáveis. Não foi exatamente o show que me chamou a atenção, mas a performance da banda. Foi um dos shows mais lotados em que fui durante todo o festival.
Eu perdi, mas meus amigos foram conferir o show da dupla alemã Joasihno, e o colocaram na lista de melhores shows que assistiram. O máximo que eu consegui foi um CD dado pela dupla quando eu os abordei na igreja antes do show do Theodore. Duo bem nerd que se apresenta com uma mesa cheia de parafernália misturadas aos instrumentos, muitos deles não identificáveis. O supra-sumo pra quem gosta de música eletrônica experimental cheia de groove e psicodelismo.
O MEUTE, uma banda alemã de marchinhas de techno, fez um dos shows mais divertidos do SXSW. Eles tocaram em diversos lugares, mas, para quem ama um bom Carnaval, a melhor apresentação foi um cortejo da German Haus até o ACC, que durou uma hora. Hey Meute, miss you already!
Tem dia que a gente quer mesmo é uma festa com DJs que botem fogo na pista. Elas rolam em menor escala, já que os palcos são tomados, na maioria, por bandas. A Nancy Whang (LCD) fez um set disco, com alguns altos e baixos, para uma pista toda vestida de led (até hoje não entendi se era alguma festa de spring breaker, pois a data costuma coincidir com o SXSW), mas a noite foi dos californianos Honey Soundsystem, que fez um set eletrônico cheio de rebolation do jeito que a gente gosta.
As ruas de Austin também são cheias de surpresas. É possível encontrar com uma banda robô, um carro portátil que carrega uma banda completa de um homem só e, até mesmo, terminar a noite com uma “bus band” tocando ao vivo enquanto circulamos no busão pelas ruas de Austin. Essa é a magia do festival, atentar sempre ao inesperado, pois ele está em todos os lugares.
Uma das boas surpresas no encerramento do festival foi o show do Albert Hammond Jr., do Strokes, que fez um show caloroso no fim de tarde, no Lady Bird Lake. O show à beira do principal lago de Austin, onde instalaram um grande palco vazado, em que era possível ver o skyline da cidade atrás, encerrou o SXSW com chave de ouro.
Se animou para o ano que vem? O SXSW 2019 já tem data. Ele rola entre os dias 8 e 17 de março.