Smashing Pumpkins Foto: Jason Renaud/Reprodução

Review: Smashing Pumpkins devora o próprio passado para se reinventar em ‘Aghori Mhori Mei’

Jota Wagner
Por Jota Wagner

“Aos que viveram o rock alternativo americano dos anos 90 e aos fãs da banda, a audição não é tempo perdido”, reflete Jota Wagner

A banda americana Smashing Pumpkins acaba de soltar álbum “novinho”, Aghori Mhori Mei. O nome vem de uma seita hindu que rejeita convenções sociais e adota práticas extremas, como o canibalismo. Nas dez faixas do disco, Billy Corgan reitera seu apreço por si mesmo e devora o próprio passado.

O lançamento, feito na última sexta-feira, 02, poderia ser um dos grandes de 1994, ano em que a banda explodia para o sucesso e conquistava o mundo com os álbuns Gish e Siamese Dream. A audição chega a dar flashbacks. Mas o curioso é que, em Aghori Mhori Mei, o Pumpkins propõe uma resignificação de seu passado em uma realidade alternativa, que a aproxima dos grupos mais guitarreiros e menos chorões da época do grunge.

Talvez, ao compor as faixas do disco, Corgan tenha desejado corrigir erros de outros tempos, época em que foi ironizado pelos ídolos como Pavement e Husker Dü, pilares do que seria a sonoridade grunge. Bob Mold chegou a classífica-los como “os Monkees do grunge”. Para um artista de ego distorcido e inflado como o líder do Smashing Pumpkins, a rejeição causaria uma mágoa difícil de curar, como vemos no álbum atual.

É difícil achar atualmente uma gravação em que as guitarras soem tão bem como as de James Ilha. Timbres sublimes e mixagem perfeita. As vozes de Corgan estão, também, muito bem encaixadas. Mas as músicas do disco dão à banda quase uma roupa de nu metal, com riffs e solos pesados, que vão de The Who dos anos 80 a Rush, passando por referências mais louváveis, como Jane’s Addiction e R.E.M. Se pudessem começar tudo de novo e voltar no tempo, Aghori Mhori Mei levaria o Smashing Pumpkins para um outro caminho em sua trajetória.

O álbum é pontuado por algumas tentativas de reviver a fórmula que garantiu à banda seus dias de gloria. Pentecost, a quarta música, é a busca por uma nova Tonight, Tonight. Who Goes There (sexta faixa), uma nova 1979.

Claro que Corgan, já chamado de “tirano” pelos colegas de antigamente, é um bom compositor. Tem a capacidade de surpreender levando a música para caminhos inesperados, causando incômodo e provocação. Who Goes There é um grande exemplo. Outro grande legado sonoro do grupo, suas orquestrações de cordas, estão de volta e são responsáveis pelos bons momentos da obra.

Disputando espaço no oceano de lançamentos dos tempos atuais, a proposta do Smashing Pumpkins é justamente se diferenciar começando de novo, fazendo a música que poderiam ter feito antes das depressões de Corgan, antes do baterista Jimmy Chamberlin e o tecladista Jonathan Melvoin terem um overdose em um quarto de hotel (resultando na morte do último), antes da baixista D’Arcy ter abandonado a banda. E, principalmente, antes da chata excentricidade de um band leader gerar mais assunto do que seu próprio som, como declarou Stephen Malkmus (Pavement): “nunca falei mal da sua música, mas de sua atitude”.

Aos que viveram o rock alternativo americano dos anos 90 e aos fãs de Smashing Pumpkins, a audição de Aghori Mhori Mei não é tempo perdido.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.