Sintetizadores Foto: Reprodução/Synthtopia

Como o Japão ajudou a definir a música eletrônica

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Saiba mais sobre quatro sintetizadores japoneses fundamentais para o surgimento da dance music como a conhecemos hoje

Imagine colocar uma minhoca no anzol, jogar a isca na água em busca de um lambari e acabar pescando um peixe mutante gigante com oito olhos e escamas fluorescentes. Foi o que aconteceu com os fabricantes de “instrumentos eletrônicos” japoneses a partir dos anos 70, época em que o país era a ponta de lança de novas tecnologias — incluindo, claro, os sintetizadores.

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A pequena ilha, destroçada na Segunda Guerra Mundial, encontrou na engenharia uma forma de se reerguer economicamente e, graças ao perfeccionismo de seu povo, marcou um golaço. Com um ferro de solda na mão e uma ideia na cabeça, empresas japonesas fizeram chover no mundo novas invenções, muitas voltadas ao entretenimento caseiro. Foi na década de 70 que o país apresentou ao mundo engenhocas hi-tech como a câmera de vídeo portátil, o walkman, os primeiros microcomputadores, videogames e até mesmo a primeira calculadora de bolso, a Busicom LE-120A.

Além de gostar de inventar eletroeletrônicos, o japonês sempre gostou muito de música. O país é o segundo maior mercado consumidor de mídias físicas do planeta, atrás somente dos Estados Unidos (com uma população absurdamente maior). Junte uma coisa com a outra e, pronto, quem não estava a fim de desenvolver calculadoras começou a imaginar: “o que posso inventar na área que eu mais gosto?”.

Para a Yamaha, que já era famosa através de seus pianos acústicos (a fábrica foi fundada em 1887, fazendo piano de bambu), entrar no universo eletrônico, em franco desenvolvimento nos anos 70, foi um caminho natural. Graça à sua longa história, foi a primeira empresa a se arriscar nas invenções, fazendo com que placas eletrônicas emitissem sons a preços populares. Seus primeiros sintetizadores produzidos em larga escala foram do modelo SY-1, criado em 1974. Mas foi com o DX7, de 1983, que a marca entrou para a história do synth-pop e da música eletrônica mundial.

O curioso é que, no começo da história, quando a forma como fazemos música (a eletrônica) ainda não existia, os inventores japoneses trabalhavam com a cabeça em outra coisas. Emular grandes instrumentos acústicos ou, até mesmo, substituir os músicos. Assim era o projeto das icônicas TB-303 e TR-808, da Roland, no comecinho dos anos 80. Ambas foram projetadas para servirem como “músico de apoio” para acompanhamentos, possibilitando a programação de baixo e baterias eletrônicas, respectivamente. A real é que o resultado final ficou meio esquisito para quem queria um baixista robô para acompanhá-lo em uma churrascaria, mas caiu como uma luva para quem estava afim de fazer sons, justamente, esquisitos. Quando as duas geringonças foram encontradas por produtores dos Estados Unidos, um novo universo foi criado na música.

E a história, nem de longe, para por aí. Apesar de o sampler — outra máquina fundamental na música eletrônica capaz de picotar pequenos pedaços de áudio e organizá-los em loops — ter sido inventado na Austrália, foi a japonesa Akai quem organizou o equipamento e o otimizou em um acessório facilmente utilizável (para os padrões da época) em estúdios. E não para por aí. Quando a empresa lançou a lendária MPC, um sampler com botões “batucáveis”, ajudou a inventar o hip-hop e, mais tarde, o funk carioca.

Juntando os lançamentos da Yamaha, Korg, Akai e Roland, uma boa parte dos estúdios de produção musical em qualquer lugar do planeta funcionava com uma bela parcela de equipamentos e sintetizadores vindos do Japão. Na época em que não existiam plugins de computador potentes na produção digital de música, o país reinava absoluto. Muita, mas muita coisa que você ouve e ama até hoje soa desse jeito graças aos instrumentos nipônicos. Duvida? Olha essa lista:

Yamaha DX7

Sintetizadores japoneses

Foto: Reprodução

Usada por Brian Eno, Phil Collins, Whitney Houston e New Order.

Roland TB-303 e TR-808

Phuture, Afrika Bambaataa, Juan Atkins e Aphex Twin.

Akai MPC

Sintetizadores japoneses

Foto: Reprodução

Gorillaz, Kanye West, DJ Marlboro e DJ Shadow.

Korg MS-20

Daft Punk, Jean-Michel Jarre, The Prodigy e Depeche Mode.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.