Nosso colunista Marco Androl revisita o futuro (sim, aqui no Music Non Stop isso existe) para indicar aos leitores quais os caminhos que a música alternativa possivelmente irá tomar em 2021. Desfrute desta lista e sinta quais rochas os tentáculos criativos dos artistas mais ousados irão tocar.
Ao invés das listas de final de ano, a Senoide resolveu mostrar um guia ou um panorama do que vem rolando ultimamente na música alternativa. A que experimenta ir adiante e gerar no ouvinte/leitor a vontade de imaginar o que pode estar surgindo nos próximos dois ou três anos.
Meth Math _ Perreando y Llorando
Repararam na leva de músicas meigas dos últimos anos? Elas têm vocal, mas são o oposto daquelas americanas explosivas de um Super Bowl. A nacionalidade e a língua da cantora (ou cantor) já não importam. Percebam a conexão entre elas além dos gêneros.
Fiona Apple – Fetch The Bolt Cutters
Negro Leo – Tudo Foi feito Pra Gente Lacrar
Grandes letristas não se sustentam só no verbo. Esse é o erro do poeta que pensa que um arranjo ou instrumento qualquer vão alcançar maior público, ou mesmo aquele cuja intenção é a mensagem sócio-política. Negro Leo e Fiona Apple aqui constam porque são geniais também no pacote que embala suas canções. Talvez por isso a música nacional dos anos 70 ainda é insuperável.
Matthew D. Gantt _ Luxe Market Intermediary
Racine _ Quelque Chose Tombe II
Against All Logic (Nicolas Jaar) _ You (Forever)
Alva Noto _ A Forest (The Cure cover)
Na última década, a música sem bateria explodiu como nos anos 70; não tão popular, mas muitíssimo diversa. Algo ficou evidente: Não dá mais para chamar tudo de Ambient. Influências da Música Alternativa Acusmática (leu a Senoide passada?) e tecnologias de desenho de som do Cinema nos levaram a um mundo para lá de Brian Eno. Interessante notar que algumas têm partes com bateria/percussão e outras longas partes sem, o que pode ser visto como a real liberdade do artista: a música deixa de ter uma função utilitarista – não é feita só para dançar ou relaxar, ela é o que é e basta-se em si mesma. Às favas as fórmulas!
Arca _ Time
OPN & Caroline Polachek _ Long Road Home
Mutantes Grimes e Arca ainda precisam ser apresentadas? Acredito que aqui não. E o verdadeiro inventor da Vaporwave (em 2009) – Oneohtrix Point Never – que se transformou diversas vezes desde então? Dessa leva saíram os melhores álbuns de 2020. Uwe Schmidt é tão mutante que virou avatar do Instagram.
Grischa Lichtenberger _ SNT 2CX
Ido Plumes _ Away From The Reign
Ritmos sofisticados e originais que não chegam a ser experimentais, mas também não são facilmente enquadrados num único gênero. Afrikan Sciences é o que mais se aproxima do Jazz (com IDM). O termo Leftfield que existe há décadas vem sendo usado para descrever algo mais elaborado e indefinido – várias das músicas abaixo também podem ser classificadas como tal, apesar de mais dançantes. Música Alternativa
Significant Other _ Mike’s Gone Back To Manchester
PISTA! A maior leva e talvez o ramo da música eletrônica que mais vem passando despercebido ultimamente é a retomada do Pós-Dubstep do ponto onde parece ter parado há uma década – agora vem mesclado ao Breakbeat Techno. A vertente inglesa foi ficando cada vez mais experimental, mas de repente olhou para trás e quis ser pista de novo – muito mais intensa e bem acabada que na época, consciente da onda airy (músicas com poucas batidas) cujo auge foi em 2017; e às vezes até misturando a um pouco de Juke. Os principais selos são os já renomados *Whities* e *Houndstooth*, entre outros.
Mutate3k _ Jun
Creep Woland _ 0800 Falkirk Triangle
Gabber Eleganza & Panacea _ Grande Raccordo Anulare
Já faz uns anos que o Jungle voltou; seria quase um revivalismo formulaico, mas não, Mutate3k e Creep Woland mostram que o Jungle está mais Jungle que o Jungle original.
Há também o bom revival do Hardcore (30 anos depois) nos casos de Mssingno & HXE e Gabber Eleganza & Panacea, que não usam a mistura desnecessária ao Hardstyle 00s. Mesmo tendo passado por Zomby em 2008 ou Special Request, já não era sem tempo!
Yan Higa _ Sterile
Advanced Audio Research featuring Somec _ Nizmo
Metal Preyers _ Snake Spit Defender
Jan St. Werner featuring Mark E. Smith _ Back To Animals
O número de músicas experimentais em 2020 é menor do que o de 2019, que é menor que o de 2018. O que significa que a década de 10 já pode ser chamada de década do experimental, mesmo assim houve alguns ótimos highlights. Destaque para o EP de 7 faixas do brasileiro Yan Higa, que está só começando e já tem identidade própria.
Tunes Of Negation & Shackleton _ Your Message Is Peace
Vague Imaginaires _ Là-Haut Sur La Dune
Gqom, o gênero eletrônico originário da África do Sul, parecia estar quase esgotado até que o EP de Menzi abriu uma nova alternativa, a das fusões. O EP inaugurou algo que pode ser chamado de Hard Gqom; o DJ que souber tocá-lo na hora certa vai fazer da pista uma locomotiva sem freio.
Por outro lado, Nazar, cujas referencias também são africanas, continua a linhagem que começa no Dub, passa por Basic Channel (90), principalmente Burial (00) e vai até Andy Stott (10).
Já Shackleton continua sua saga pela música tribal, dinâmica e psicodélica para as gerações futuras.
Gilbert Cohen & Ariel Kalma _ Tu Ne Peux Pas Savoir
Oneohtrix Point Never _ I Don’t Love Me Anymore
Die Orangen featuring Eva Geist _ Burnt Bay
Moor Mother & Olaf Melander _ Hemlock
Cucina Povera _ Haaksirikkoutunut
Jay Glass Dubs _ Suffix Harness
Orgânicas e com vocal, algumas atemporais. A volta de Salem depois de uma década tem que ser frisada. E por que poucos dizem que Moor Mother deveria ser nomeada a rainha do rap? Que mulher!