Review Lollapalooza 2024 Foto: Observadordaimagem/Music Non Stop

Lollapalooza 2024: festival fecha com novinhos, grandes shows e lições para 2025

Claudia Assef
Por Claudia Assef

Com a idade média de público mais baixa dos três dias, o domingo viu nomes como SZA, Sam Smith, Gil e Phoenix brilharem

Com a colaboração de Maravilha, Victor Rocha e Vitória Zane

A idade média do público no último dia (24) de Lollapalooza Brasil baixou bem, espelhando o line-up que tinha como grandes armas o trap e dois ídolos pop, SZA e Sam Smith.

As boas atrações começaram logo cedo, e aqui é preciso pontuar que artistas de peso, com larga estrada, mereciam ser livrados da missão de cortar a fita dos palcos, como foi o caso da cantora Céu, que fez um belíssimo show revisitando a carreira e conseguiu reunir um secto polpudo de fãs logo como primeira atração do Palco Alternativo, às 14h30 da tarde. No sábado, o mesmo aconteceu com Tulipa Ruiz, que foi escalada para tocar no Palco Budweiser, às 13h.

Conhecida por misturar estilos desde o início de sua carreira, a cantora tem como algumas de suas influências Alcione, João Gilberto, Morris Albert e Rita Lee. No palco, uma enorme variedade de instrumentos como atabaque, bongô, pandeiro, violão, guitarra, contra-baixo e bateria pôde ser vista.

Céu apresentou sua poesia musical cheia de delicadeza e amor. A maioria de seus versos era de conhecimento geral, principalmente em Bubuia, A Nave Vai e Gerando na Alta, parte do álbum recém-lançado Novela. A artista ainda fez os presentes se agitarem com o hit O Golpe Tá Aí e Perfume do Invisível.

Review Lollapalooza 2024

Céu. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

As boas atrações logo no início do dia fazem sentido para puxar público para os palcos logo cedo, sabemos. O bombado Hungria lotou, às 14h30, o Bud, enquanto no Perry’s by Johnnie Walker, foi MC Soffia quem arrastou um bom público e mostrou que, apesar da pouca idade (19 anos), sua longa estrada a faz ter uma impressionante segurança e domínio de palco — sem falar que a menina é fera nas rimas.

Como a chuva deu uma trégua, os frequentadores do Lolla puderam aproveitar sem preocupações o alto astral da apresentação do cantor e compositor Rael (Palco Alternativo), que preparou um espetáculo que celebra suas mais de duas décadas de jornada na música. Passando por sucessos como Flor de Aruanda, Tudo Vai Passar, Só Faltou Você e Aurora Boreal, o artista emocionou a todos com as interpretações de Luz das Estrelas, de Djavan, e de Stir it Up, de Bob Marley.

O show ainda contou com a presença de dois ícones essenciais na sua trajetória: Emicida e Mano BrownBem-estar, autoestima, amor, saúde, fé e liberdade são a base da mensagem e trabalho de Rael, que combina reggae, rap, MPB e experimentalismo. Música preta, viva, autêntica e poderosa!

Bem no meio da tarde, no Palco Samsung, o show de Gilberto Gil trouxe um afago à alma, com seu repertório que extrapola idades e gostos musicais. Gil é o famoso junta-tribos; todo mundo ama e conhece as músicas, e ele estava especialmente animado, fazendo dancinhas e brincando com o público. Leia o review completo aqui!

Gilberto Gil Lollapalooza

Gilberto Gil no Lollapalooza 2024. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

50 tons de rock

Um pouco antes, a banda inglesa Nothing But Thieves mostrou que, apesar de não estar na ponta da língua de boa parte da população brasileira, os rapazes são sucesso por aqui, arrastando uma multidão de fãs que gritava e chorava a cada vez que o vocalista Conor Mason se comunicava com (prioritariamente) elas. A banda faz um grunge mais “limpinho”, mostrando que bebeu em fontes como Stone Temple Pilots e Soundgarden.

A apresentação iniciou com o hit Welcome to the DCC e logo de cara se mostrou densa com os marcantes solos de guitarra. Conor arriscou algumas palavras em português e disse estar muito feliz por estar de volta ao Brasil, e que a energia daqui é “diferente”.

Logo em seguida, o palco Bud recebeu o Phoenix, banda francesa responsável por ter colocado o país no mapa do indie rock. Fazendo sua mistura de rock, pop e eletrônico com um som sempre um pouco estranho, seguindo o nicho inaugurado por Talking Heads, e com um vocalista carismático e de voz marcante, Thomas Mars, o grupo já abriu com o seu maior hit, Lisztomania, uma estratégia agressiva e arriscada, mas que manteve a energia lá em cima, emocionando o público mais maduro com pedradas como 1901 e If I Ever Feel Better.

A banda de Versalhes encerrou de forma apoteótica, com uma surfada do vocalista sobre a multidão, que passeou com ele de mão em mão e depois o devolveu para a grade de volta para o palco. É emocionante ver esse tipo de entrega e confiança entre público e artista. Leia o review completo aqui!

Phoenix no Lollapalooza

Phoenix no Lollapalooza 2024. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Dupla de irmãos americanos do pop-rock, The Driver Era subiu ao Palco Alternativo no fim da noite. O projeto liderado por Ross e Rocky Lynch fez uma apresentação consistente e com muita intensidade. O reduzido público compensou com muito barulho e conexão. Algumas pessoas puderam assistir sentadas, próximas ao palco.

A banda, que foi formada após o fim do grupo R5 e lançou o seu primeiro disco apenas em 2019 (X), abriu o show com a recém-lançada Get Off My Phone. O álbum inaugural conta com seis faixas, incluindo o sucesso Nobody Knows, que fez a plateia ferver.

O segundo disco, Girlfriend, também teve espaço com Take Me Away e a derradeira A Kiss. Também merece nota o solo que o ótimo baterista Dave Briggs executou — ele e o guitarrista primo dos irmãos, Riker Lynch, completaram a formação, que veio pela primeira vez ao país.

R&B caprichado

Depois de se apresentar no Rock in Rio 2015 e na edição do Lollapalooza de 2019, Sam Smith estava de volta ao Brasil. O artista pop, que coleciona quatro Grammys, um Globo de Ouro, um Oscar e três Brit Awards e é conhecido por sucessos como Stay With Me e Unholy, apresentou um completo show de talento no terceiro dia de festival.

Já no início de sua apresentação, Sam provocou um coro emocionante emanado por um mar de gente comovida por sua música, que tomava grande parte do Autódromo e dos corações dos fãs que acompanhavam hipnotizados sua performance. 

Além das baladas introspectivas que o consagraram, a apresentação também tomou uma atmosfera dançante, com músicas dos discos Love Goes, de 2020, e Gloria, de 2023, que marcam um momento mais versátil e expressivo de sua carreira.

O repertório encantou jovens e adultos no fim de noite de domingo, e Smith aproveitou a ocasião para lembrar os presentes que sua arte e presença nos palcos é sobre celebração (e reinvidicação) da liberdade como modo de vida. Ele reforça a importância de podermos existir e viver de forma autêntica, apesar dos dogmas e preconceitos.

SZA Lollapalooza

SZA. Foto: Reprodução/Instagram

Mas a grande estrela do domingo era mesmo a norte-americana SZA. Com três prêmios Grammy só neste ano, ela chegou cheia de moral e botou um show pesadão de R&B com muita reverência à sua árvore genealógica — afinal, os EUA são o berço do gênero, além de ser um celeiro gigantesco de mulheres pretas poderosas dentro do estilo.

SZA chegou pintosa, com um microshortinho jeans e um top do Brasil que parecia de loja de departamentos. Seu corpo de baile, também uniformizado de “brasileiros”, a acompanhou durante quase todo a performance. Havia uma cenografia um pouco confusa, que ora lembrava uma comunidade e em outros momentos, um navio. Chamou a atenção a guitarrista Ari O’Neil, preferida das estrelas como Lizzo e Beyoncé. Leia o review completo aqui!

Trap, funk e house

No terceiro dia de Lollapalooza, o palco Perry’s by Johnnie Walker deu espaço aos ritmos urbanos, como o rap, o trap e o funk. E foi surpreendente ver a área lotada às 15h de uma tarde de domingo. O público estava ansioso para ver figuras tão hypadas nos charts nacionais, e vibrou do começo ao fim.

Tz da Coronel e Oruam começaram com um DJ set de funk de Alle da Coro. Em seguida, Tz mandou hits como Anota a Placa, Engana Dizendo que Ama, e Alma.

Logo, Oruam figurou um dos momentos polêmicos mais comentados pelas redes: ele apareceu vestindo uma camiseta com a foto de seu pai, Marcinho da VP, preso por envolvimento com tráfico de drogas, pedindo sua liberdade. Juntos, cantaram Diz Aí Qual é o Plano e Para de Mentir.

MC Livinho no Lollapalooza 2024

MC Livinho no Lollapalooza 2024. Foto: Observadordaimagem/Music Non Stop

Um dos pontos mais altos do dia foi a performance de MC Livinho, digna de headliner de palco principal. Isso porque o artista ainda entrou com 15 minutos de atraso, devido a falhas técnicas. De qualquer forma, ele soube explorar seu potencial como cantor e como dançarino, mostrando sua plena vocação como showman.

Além de seus sucessos, fez uma performance em homenagem a Michael Jackson, dançando e cantando Black and White ao lado de Rodrigo Teaser, intérprete do rei do pop.

MC Davi participou com muita humildade, mostrando-se grato pelo espaço. Sem deixar a peteca cair, manteve a animação do público com hits como Let’s Go 4. Leia o review completo aqui!

“Uau!” Essa foi a nossa expressão ao ver J. Worra no palco. A DJ e produtora, que nasceu em uma pequena cidade de Chicago, está em uma escalada na cena eletrônica internacional. Durante sua estreia no Brasil, ela estava emocionada. O setlist foi marcado por inúmeras faixas autorais, e os visuais incluíam a imagem dela e de seu cãozinho. Uma baita performance durante o anoitecer do palco. 

Dombresky já é um grande conhecido do Brasil, e por isso, sabe ler bem nossa pista! O resultado é um show cheio de acertos, com um som super pra cima e até mesmo com edits mesclando funk e house.

Review Lollapalooza 2024

Meduza. Foto: Observadordaimagem/Music Non Stop

Ainda estamos impactados com a voz de ZHU! Sabíamos do talento e da qualidade do DJ e produtor americano, mas ouvi-lo cantar ao vivo foi incrível. Ele soltou a voz em clássicos que agitaram a pista, como Cocaine Model e In The Morning, e chegou a tocar a mais pedida: Faded.

Agradando à turma da nostalgia, ele também soube mesclar o set com faixas atuais de seu recente álbum Grace, cuja divulgação está pesadíssima. As cores e os visuais exibidos (sempre em tons vermelhos e pretos) remetem à atmosfera do disco, e ele performa utilizando uma espécie de batina (já que a produção foi feita na Catedral Grace, em São Francisco, onde nasceu).

O trio italiano Meduza está sempre junto na hora de produzir, mas quando falamos de apresentações, somente um integrante é quem dá as caras. Geralmente é Mattia Vitale, mas desta vez, no Lollapalooza 2024, quem veio foi Simone Giani.

Talvez por isso o setlist não tenha explorado taaaanto das facetas do underground. O que não quer dizer que foi ruim, tá? Pelo contrário: foi uma apresentação impecável, cheia dos hits do projeto (Lose Control, Tell Me Why, Paradise, Piece of Your Heart…), abusando do CO2 e demais efeitos especiais. Encerrou o palco Perry com chave de ouro!

Cansados, sujos e felizes

No final do Lollapalooza, o público, cansado, pôde ir para casa com a certeza de ter visto grandes shows, com os sapatos e roupas cheios de lama — e talvez alguns machucados, pois não foram poucos os tombos.

Saldo final: 242 mil pessoas e algumas lições de casa para a edição de 2025. Os principais pontos cegos foram a lama, que gerou incômodo e quedas, mas poderia ter sido pior; e os horários de artistas com longa estrada, especialmente mulheres.

Mas quando é pra elogiar a gente fala: no geral, os serviços estavam bons, banheiros limpos e com papel higiênico, e poucas filas para comprar comida, bebida e colocar crédito, além de internet funcionando, coisa rara em festival desse porte.

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Claudia Assef

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Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.