A maior convenção de cultura pop no mundo reuniu mais de um milhão de pessoas em São Paulo
Entre os dias 30 de novembro e 03 de dezembro, na São Paulo Expo, a CCXP, que já era a maior convenção de cultura pop do planeta, comemorou dez anos com recorde de público, no que foi chamada pela própria organização de “edição épica”.
Passear por seus corredores, por entre stands gigantescos de produtoras de TV, cinema, séries, games e livros (especialmente quadrinhos), é entrar de cabeça em universo que surgiu descolado da realidade, marginal, e que agora movimenta uma nave mãe de dinheiro utilizando uma estrutura de marketing que transforma clientes em fãs obcecados, a ponto de frequentar um feira lotada de gente com uma pesada fantasia de super-herói, debaixo de um calor intenso.
A CCXP brasileira surgiu há apenas dez anos, na esteira da pioneira Comic Con, em San Diego, nos Estados Unidos. Já na metade de sua vida, ultrapassou a original e se tornou o evento que mais movimenta gente e grana em todo o mundo. Tudo construído em volta da cultura geek, formado por uma nação cada vez maior de consumidores de obras de entretenimento dedicadas ao universo dos super-heróis, da fantasia e da comédia.
Popular?
Hoje, tanto ela quanto os meios de comunicação em geral se referem à convenção como um evento de cultura pop. De “popular”, no entanto, não tem quase nada. Viver dentro desse mundo paralelo envolve, necessariamente, consumir. E consumir com paixão fervorosa. O que o afasta da maioria da população brasileira, como se pode claramente perceber observando quem a frequenta.
Hélio de La Peña, do Casseta & Planeta, que chegava para o lançamento de seu livro Aventuras De Um Pijamão, pela Banca do Minhoca, me disse, ao chegar: “Vim direto da ExpoFavela. Saí de um evento de preto para chegar num evento de branco”.
Mas isso não a torna menos impressionante. Cultura geek, para quem pousou hoje no planeta, surgiu entre os jovens (e muitos que, hoje, já não são tão jovens assim) com dificuldades sociais, meio deslocados do resto da sala de aula, que usavam o tempo livre para se especializar em um profundo conhecimento em assuntos tão específicos quanto uma língua falada somente em uma série de TV espacial, quanto mapas geográficos de uma terra que só existem em livros da fantasia.
Em dado momento da história recente, esse tipo de cultura virou uma febre, tomando conta das produções cinematográficas e adjacências, angariando público cada vez maior e resultando em eventos com as Comic Cons.
Nada de sexo, drogas, nem rock’n’roll. O mundo mudou.
Escapando para os metaversos
Uma das explicações para isso é o escapismo. Em um mundo em que as informações são metralhadas o tempo todo em gerações que não precisam mais lutar por libertação, os jovens que não passam fome nem pegam três horas de ônibus para chegar ao trabalho acabaram se encanto com os metaversos. E na cultura geek, o que não falta é opção.
Vai desde jogos de realidade virtual — sem esquecer dos RPGs, em que os jogadores interpretam personagens de uma história — até a criação de conteúdo de entretenimento construído sobre um universo fantástico, em camadas de sofisticação que vão desde uma convidativa porta de entrada para um novato até profundas tramas que instigam o fã a mergulhar cada vez mais fundo.
A cultura do consumo também ajudou a inflar este nicho. E dentro da CCXP, é possível perceber como, e para quem, trabalha a indústria do entretenimento mundial.
Não faz muito tempo que as grandes corporações venceram a pirataria. A solução foi trocar a venda pelo aluguel. Com o streaming, paga-se por mês para assistir filmes e ouvir música em vez de pagar para comprar um álbum ou DVD. A indústria dos games pegou o mesmo caminho. Com isso, fortaleceram-se financeiramente e passaram a dedicar suas pesquisas a uma forma de capturar o consumidor, mantendo-o dentro de seus produtos.
E, para enfiar um ser humano dentro de um produto, nada melhor do que os universos virtuais.
User experience como estratégia
Surfando na onda das estratégias criadas pelas grandes empresas de redes socais, que estudam formas de manter o usuário em suas plataformas (a tal da user experience, ou UX), as empresas foram desenvolvendo maneiras de dar continuidade a tudo. Tanto que os grandes sucessos do cinema geek são, quase sempre, as intermináveis franquias. Guerra Nas Estrelas, trilogia criada por George Lucas, já contabiliza 12 filmes em sua saga.
Com isso (e vale para todos os produtos do universo geek), os enredos vão ficando cada vez mais labirínticos, e os produtos, colecionáveis. A ponto de gerar toda uma cadeia orbital, que vai desde livros dedicados a explicar as coisas, até especialistas, que acabam virando profissionais, de tão fãs.
Na CCXP, era possível assistir debates sobre os “universos” de determinada marca com a profundidade de quem falava de Platão. Em outros stands, jogadores profissionais dos chamados e-sports (esportes eletrônicos) disputavam partidas para uma arena lotada. Os fãs, já habituados, pegam longas filas para viver alguns minutos de “experiências”, que vão desde fotos com celebridades a brindes e jogos.
Provando que a user experience é a tendência deste novo mundo, cada vez mais empresas e agências de publicidade estão imergindo no mundo da CCXP. Ha stands que vão de fabricantes de macarrão instantâneo a eletrônicos, todos de olho na habilidade que os “players” deste mercado tem em transformar uma pessoa comum em ardoroso defensor da sua marca.
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