Foto: ReproduçãoDa missa à rave: como o catolicismo encontrou espaço na música eletrônica
O DJ Padre Guilherme, que chegou a se apresentar com mensagem exclusiva do Papa no telão, é o melhor exemplo desse crossover
Quem é católico e foi obrigado pelos pais, na juventude, a fazer o catecismo, certamente se lembra de dormir na missa enquanto um padre mal-humorado citava versículos ininteligíveis para um garoto como “E, levantando-se Zaqueu, disse ao Senhor: Senhor, eis que dou aos pobres metade dos meus bens; e, se em alguma coisa tenho defraudado alguém, o restituo quadruplicado” — fórmula infalível para afastar a criançada da religião. Geralmente, aos domingos de manhã, o que restava de consciência na garotada era usada para imaginar, do lado de fora da igreja, os amigos “pagãos” dando rolê de bicicleta, jogando bola ou correndo pela rua.

Alguns missionários, no entanto, se ligaram que era preciso fazer algo, ou suas ovelhinhas iriam trocá-los pelos desejos mundanos. E é por causa desses inquietos dentro da igreja que hoje vemos, por exemplo, um padre tocar em raves faixas de música eletrônica com fogos de artifício, telões e efeitos especiais. É o caso do português internacionalmente conhecido Padre Guilherme.
Nascido em 1974, o mano teve a ideia de misturar música eletrônica com sermões (artifício que a house music usou às pencas nos anos 80, mas com sermões evangélicos, criando até um subgênero, o “spiritual house”), conquistando espaço como DJ em grandes festivais, dividindo a cabine com nomes como Adam Beyer e Charlotte de Witte, além de promover as chamadas “raves católicas”.
Na mais recente, realizada na frente de uma catedral na Eslováquia, com direito a video-mapping e projeções, Guilherme surpreendeu os milhares de fãs presentes com uma intervação exclusiva, pelo telão, do próprio Papa Leão XIV abençoando o rolê, em introdução de sua ainda não lançada faixa de techno melódico Dear Young People. “Papachella”, brincaram alguns, nos comentários do vídeo.
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Para se ter uma ideia do quanto é inserido no cenário eletrônico mundial, o DJ padre é representado pela Koolwaters, mesma agência de outros superstars como Boy George, A$AP ROCKY, Bob Sinclar e Roger Sanchez. Dando rolê com o próprio Papa Leo, imagine o hype espiritual do cara, em tempos atuais.
Padre Guilherme não foi o primeiro
Curioso é que Guilherme não foi o primeiro padre artista a atingir reconhecimento internacional, no mundo da música jovem. Em 1990, o estadunidense Stan Fortuna abalou o cenário rap com produções, discotecagens e lançamentos (dos bons) no universo da música. Franciscano, Fortuna viajou o mundo apresentando seu rap cheio de positividade com a missão de trazer a juventude de volta ao catolicismo. E o mano chegou até mesmo a gravar um videoclipe no Rio de Janeiro, da música Lose Yourself (veja acima).
Apesar de não ser o inventor da era da invasão pop por clérigos, Padre Guilherme certamente é o mais popular. Principalmente, ao deixar o “julgamento” meio de lado e focar na música, deixando a mensagem religiosa nas entrelinhas — sobretudo quando invade eventos tradicionais de música eletrônica como o Dreamfields, no México, o Medusa, na Espanha, e Zamna, no Chile. O superstar DJ também já colou no Brasil, com gig aos pés do Cristo Redentor. Amém!



