Gorillaz

Mita encerra com a genialidade de Damon Albarn e sua banda cartoon Gorillaz. Saiba como foi o festival

Claudia Assef
Por Claudia Assef

FOTOS TATIANE SILVESTRONI

Festival estreante na novamente recheada cena de eventos de música no Brasil, o Mita (iniciais de “music in the answer”) encerrou as atividades no domingo (15) com um grandioso show da banda Gorillaz, liderada pelo genial Damon Albarn, cérebro por traz do Blur.

O Gorillaz nasceu em 1998 na Inglaterra como uma banda virtual, ou seja, em vez de músicos de verdade aparecendo nos shows, eram personagens animados as estrelas. A banda foi idealizada por Damon Albarn e pelo cartunista Jamie Hewlett, cocriador da história em quadrinhos Tank Girl, e tem como integrantes quatro personagens animados: 2-D, Murdoc, Noodle e Russel.

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Toda essa narrativa de HQ, aliada ao som da banda, repleto de instrumentos de timbres divertidos, como a escaleta (um tipo de tecladinho que se toca como se fosse uma flauta) e o vocal de Albarn abafado como se cantasse através de um megafone, fez o Gorillaz desde sempre ser uma banda queridinha das crianças. No fim da tarde do último domingo, foi o que se viu no Mita, um grande reunião de pais e mães com muitas crianças na plateia.

Ao contrário de turnês anteriores, o Gorillaz se apresentou com os músicos no palco e não atrás de uma projeção onde as grandes estrelas costumavam ser os personagens criados para dar vida virtual à banda. Quem foi ao Mita no último domingo pôde ver Damon Albarn, aos 54 anos, em sua melhor forma, tocando vários instrumentos, descendo até a plateia, cantando no seu icônico microfone de rádio amador e sendo muito, muito simpático com os fãs que lotaram a plateia, centenas deles usando camisetas da banda.

Albarn é o coração do Gorillaz e comanda o baile com um jeitão cool de quem sabe que é um líder do bem. A banda escalada para acompanhá-lo era de altíssimo nível, com baterista, tecladista, guitarrista e, um dos pontos altos do show, o groove e a elegância do baixista. Além disso, um naipe de vocalistas de peso, e participações dos rappers do De La Soul nas faixas Superfast Jellyfish e Feel Good Inc, um dos maiores hits da banda.

 

Com um setlit que fez um passeio pela carreira da banda, com direito a projeções dos videoclipes e outras intervenções supermodernas nos telões, o Gorillaz entregou tudo e mais um pouco, empolgando a plateia que cantou junto boa parte das músicas do show. Um domingo para ficar na memória de quem foi, e principalmente uma baita benção para o estreante Mita. Neste sábado (21) tem mais Gorillaz no Mita RJ. Confira o line-up e preços aqui.

SETLIST GORILLAZ NO MITA SP

M1 A1
Strange Timez
Last Living Souls
Tranz
Aries
Tomorrow Comes Today
Every Planet We Reach Is Dead
Rhinestone Eyes
19-2000
Saturnz Barz
Glitter Freeze
Cracker Island
O Green World
Pirate Jet
On Melancholy Hill
El Mañana
Kids With Guns
Interlude: Elevator Going Up
Andromeda
(D.R.A.M. Special vocal outro)
Superfast Jellyfish (com De La Soul)
Feel Good Inc. (com De La Soul)
Dirty Harry (with Bootie Brown)
Momentary Bliss
Plastic Beach
BIS
The Pink Phantom
Stylo (with Bootie Brown)
Clint Eastwood (with Sweetie Irie)

CLIMA TRANQUILO, LINE-UP OUSADO

É verdade que um festival não nasce pronto e perfeito. Mas o Mita conseguiu entregar muita coisa que outros eventos levam anos pra arredondar. Vamos começar pela locação. O novíssimo Spark Arena, que fica ao lado de outra grande casa de shows, a Arca, é um espaço descampado, amplo, plano e coberto com gramado. Para o Mita a organização nas filas de entrada funcionou bem durante boa parte do evento, exceto por alguns momentos de pico. No geral, se saiu muito bem no receptivo, com staff bastante educado e marcado por diversidade (equipe com jovens negros, muitas mulheres, cis e trans, e PCDs).

No quesito artístico, dá pra dizer que o festival foi bastante ousado. Um line-up que se pode chamar de pouco comercial para um evento com capacidade para 10, 15 ou até 20 mil pessoas, não é para amadores. O bacana é que impactou gerações diversas, da moçadinha bem nascida que curte o som eletrônico pop dos australianos do Rüfüs du Sol até Gilberto Gil, um dos pais da música brasileira, o espectro do Mita foi bem amplo, mas não passou por música que necessariamente faz a cabeça de multidões.

Gilberto Gil com a neta Flor. Emocionada, ela não segurou as lágrimas. Crédito: Tatiane Silvestroni

Alguns momentos vão ficar para a posteridade, como o show de Gil, que trouxe vários integrantes da família para o palco. Emoção foi a mil quando ele chamou a neta, Flor Gil, de 13 anos, para subir ao palco e cantar com ele. Emocionada, ela acabou caindo no choro – como o próprio Gil disse, foi a primeira vez que a neta se apresentou com ele num festival.

A inclusão de um bom número de mulheres da nova MPB, como Marina Sena, Letrux, Luedji Luna, Larissa Luz, Alice Caymmi, Liniker e Xênia França, despertou o interesse de quem consome brasilidades, e artistas como Matuê, Heavy Baile, Marcelo D2 e Jão trouxeram um público ainda mais jovem. Isso sem falar na inclusão de Marcos Valle & Azymuth, puro deleite para fãs de jazzy bossa nova, e do Two Door Cinema Club, para os nostálgicos da cena eletrônica dos anos 2010.

Letrux passando a mensagem no Mita SP 2022. Crédito: Tatiane Silvestroni

O Mita é o primeiro festival produzido em parceria pelas empresas Bonus Track, de Luiz Oscar Niemeyer e Luiz Guilherme Niemeyer, e 30E – Thirty Entertainment, e vai acontecer anualmente. A curadoria musical é assinada em parceria com a MangoLab, plataforma musical que também ficou responsável pela criação visual do projeto. O evento fez um esforço para ter áreas de respiro, como uma grande praça de alimentação com mesas e bancos e muitos bares espalhados pelo espaço (o que não impediu imensas filas nas proximidades dos palcos, para comprar cerveja e comida – eu mesma passei quase 1 hora na fila para pegar hamburguer e batata frita para minhas filhas).

Assim como faziam festivais finados como o Terra, o Mita tinha dois palcos, com programação alternada, o que reduzia a espera entre os shows. Era o tempo de as pessoas se locomoverem de um palco para o outro.

O público aproveitou as mesas da área de alimentação do festival para descansar e comer. Crédito: Tatiane Silvestroni

Nos dois dias de festival era nítido que havia muitos convidados, com pulseiras VIPs. Normal. Para um primeiro ano, sem nenhum conhecimento prévio sobre a marca Mita e com um line-up sem nomes supercomerciais, era preciso ter público. Não sabemos sobre números finais, mas era nítido que caberia muito mais gente, o que criou uma sensação de conforto para quem estava lá. Mesmo para quem estava com crianças, como eu, não houve grandes tensões ou preocupações em nenhum momento.

Outro ponto que merece aplausos foi o som. Com graves potentes e um volume agradável, era possível ouvir bem os shows de diversos pontos da plateia. A gente sabe o trabalho e o custo que isso acarreta, portanto, clap-clap-clap!

Final de festa no domingo e claro que a dispersão seria um problema. Não por conta da saída do festival, que ocorreu sem grandes sufocos, mas sim porque o gargalho sempre ocorre em grandes eventos envolvendo transporte. Para quem não quis encarar a caminhada até a estação de metrô mais próxima, o jeito foi amargar valores exorbitantes praticados pela maioria dos taxistas. Por sorte, embarcamos com o Everaldo, autoproclamado “o taxista mais feliz de São Paulo”, que se manteve firme na cobrança do valor exibido no táximetro. Como ele mesmo nos disse ao entrarmos no táxi, “sorte não existe, tudo é merecimento”. Que assim seja para o Mita e que venham futuras edições.

 

 

Claudia Assef

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Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.

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