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Por que Lewis Hamilton é o herdeiro de Senna no coração do Brasil

Lewis Hamilton

Hamilton e Lay, do trio Tuyo. Imagem: Divulgação

Cidadão honorário brasileiro, piloto encontrou a banda Tuyo e arriscou uns acordes da clássica Garota de Ipanema

A etapa de São Paulo do Grande Prêmio de Fórmula 1 rolou envolta em uma polêmica: a escolha do piloto inglês Lewis Hamilton para pilotar a McLaren clássica de Ayrton Senna para dar uma volta de apresentação no circuito de Interlagos. Muita gente criticou, incluindo o ex-campeão Emerson Fittipaldi, dizendo que a honra deveria ter sido dada a um brasileiro. Se esqueceram de que, se considerarmos o posicionamento de Lewis e as absurdas demonstrações de racismo que sofreu durante a carreira, ele se aproxima muito mais de um brasileiro do que qualquer outro piloto ou ex-piloto (muito bem) nascido por aqui.

Se depender de Hamilton, no entanto, essa discussão se dissipa rapidinho. Afinal, o cara simplesmente topou se encontrar com a molecada do trio curitibano Tuyo, formado por Lio, Lay e Machado, para uma minijam session na qual lhe ensinaram a tocar no violão o clássico da bossa-nova brasileira Garota de Ipanema, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes — o mais reconhecido hino do gênero e cartão de visitas da música brasileira desde que foi lançado, em 1964, no seminal álbum Getz/Gilberto. O encontro rolou no final de semana e foi possibilitado pela marca de roupas Tommy Hilfiger, da qual Hamilton é embaixador. No meio de um desconstraída conversa, Lay e o piloto, ambos com violão em punho, tocam alguns acordes da canção (veja acima).

Lewis Hamilton e o Brasil têm namorado bastante nos últimos anos. O maluco se emocionou tanto com a possibilidade de entrar no cockpit de Senna que arrebentou com o protocolo. Era para ter dado uma volta de apresentação, mas ele não parou. Deu três. E com isso, vai seguindo firme no propósito de se tornar o Bruninho Mars do automobilismo. Gente boa, acessível, respeitoso e, um ponto muito positivo, dada a sua influência, nunca fugiu da reta quando o assunto é engajamento.

Negro, sofreu ataques racistas pesados em 2007 e 2008 vindo de torcedores e imprensa espanhola (êêêê Espanha…). Transformou sua cabreragem em atitude, ajudando a fundar o Race Against Racism, que luta contra a repetição de episódios criminosos como os que sofreu, e também pela diversidade dentro de um esporte tão elitizado como a Fórmula 1. Mas sua voz não se levantou apenas no âmbito do esporte que pratica. Entrou de cabeça na campanha Black Lives Matter, que se levantou contra o assassinato de George Floyd, nos Estados Unidos. Unindo-se a diversos outros esportistas, ficou de joelhos durante sua apresentação em todos os grandes prêmios da temporada 2020. No pódio do GP da Itália, apareceu para o mundo inteiro com uma camiseta onde se lia “prendam os policiais que assassinaram Breonna Taylor“, em referência à médica negra morta depois que a polícia invadiu sua casa, também nos EUA.

Direitos Humanos também entraram na pauta do piloto, de uma forma triste. Antes de viajar para Bahrein, onde participou de mais uma etapa do campeonato, também em 2020, recebeu uma carta de um garoto contando que seu pai estava condenado à morte no país, após confessar um crime sob tortura policial. Mesmo envolto em um bilionário mundo de contratos, patrocinadores e governos que financiam o tal “circo da Fórmula 1”, Hamilton botou a boca no trombone. “Não tenho autoridade para escolher em qual país vamos correr. Mas isso não significa que temos de ficar com a boca fechada.” Enquanto estava no Bahreim, procurou pessoalmente o governo local e organizações não governamentais para tentar libertar Mohamed Ramadhan, cujo caso entrou em reconsideração após sua campanha pública.

Na Bulgária, Hamilton desceu a lenha nas leis anti-LGBT+ do país. Vegano, é ativista dos direitos dos animais. Já fez feat com Christina Aguilera, assinando com o pseudônimo de XNDA e, fechando com chave de ouro, encantou os brasileiros tentando tirar Garota de Ipanema com o Tuyo.

Lewis Hamilton não deveria ter pilotado o carro do Senna na homenagem do GP de São Paulo? Bem, encontre outro piloto afrodescendente, que se levante contra o racismo, os direitos humanos e as causas LGBT+, que seja cidadão honorário brasileiro (nessa, ele já está na frente do Bruninho) e que, ainda por cima, se arrisque a tocar Garota de Ipanema. Então, a gente conversa!

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