music non stop

Joyce Muniz é a DJ e produtora brasileira que mora na Áustria e já ganhou até benção do Kraftwerk. Conheça!

Ela tem nome de cantora de bossa nova, mas não se engane! A brasileira Joyce Muniz, radicada há 20 anos em Viena, Áustria, vem se confirmando como um dos grandes nomes da música eletrônica mundial, com faixas sendo consumidas e tocadas nos quatro cantos do planeta. Joyce inclusive é das poucas produtoras no mundo a poder dizer de boca cheia que teve uma música com sample do Kraftwerk aprovada pelo próprio Ralf Hütter, um dos criadores do grupo mais importante da história da música eletrônica – quiça da música pop também.

Quando se mudou para Viena, então com 12 anos de idade, Joyce nem sonhava com música eletrônica, porém sua nova pátria vivia um período fértil nesse departamento. Nomes como o da dupla Kruder & Dorfmeister estavam no auge de sua forma. Estamos falando de 1997/1998, momento em que a música eletrônica viveu um flerte intenso com gêneros como o jazz, o soul, o hip hop e a música brasileira. Desse cruzamento veio o downtempo, que naquele momento também ganhou o nome de easy listening, e a Áustria teve sua parcela de culpa nesse boom, com artistas como Tosca – projeto paralelo de Richard Dorfmeister – e o selo G-stone, lançado pelos próprios Kruder & Dorfmeister, endereço certo pra achar boa música com essa pegada mais “dá um tempo”.

Joyce Muniz abraçadinha com o alemão DJ Hell

Mas isso era só a ponta do iceberg. A cena eletrônica austríaca fervilhava em diferentes BPMs. De raves de psy a grandes clubes, passando por uma importante cena de drum’n’bass, que foi a porta de entrada de Joyce na cena local. ” Foi numa festa em Viena, em 1998, quando eu fui ver pela primeira vez o DJ Grooverider, um dos pioneiros do drum’n’bass. Não só a música, mas a energia das pessoas e como elas absorviam o som. Isso me fascinou; como uma pessoa sozinha tinha o poder de comandar uma pista cheia, daquele jeito, e fazer tanta gente feliz. Pensei: ‘eu também quero'”, diz Joyce em entrevista à coluna #MillerMusic.

Corta para 2016. Joyce lança Made in Viena, seu primeiro álbum pelo selo Exploited. Com tracks que viraram hinos, como Back in The Days, a tal música abençoada pelo Kraftwerk, o disco marca um novo salto na carreira da produtora. O disco, que tem várias participações, tem um brilho especial, que não passou batido por DJs e produtores por este mundão afora. Ouça.

Ouça Made in Viena – Joyce Muniz

Como ela saltou da pista para o comando dos toca-discos e daí para se tornar headliner de tantas festas e festivais legais pelo mundo? Você fica sabendo agora. Mas antes dá um play neste set que ela gravou no clube Egg, em Londres, em abril deste ano.

Music Non Stop – Você saiu do Brasil aos 12 anos. Como você vê o Brasil sendo quase uma gringa hoje em dia?

Joyce Muniz – Em termos de musica eletrônica, eu acho que o Brasil evoluiu muito. Antigamente existiam os clubes nas grandes cidades e as famosas raves de psy. Hoje em dia, existem vários grupos e coletivos que produzem várias festas ligadas ao underground eletrônico, e eu acho que isso abriu as portas para a nova geração. A internet também ajuda muito a dar acesso a novos gêneros da música eletrônica, não só techno ou house, mas também abriu as portas para o abstracto.

Music Non Stop – Você foi pra Viena mais de 20 anos atrás. Estava vendo no Vinyl Sessions que você abriu o programa com Follow Me, do Aly Us, que foi clássica em clubes de SP como o Hell’s. Como foi sua formação na música eletrônica, começou aqui ou você se ligou nisso em Viena?

Joyce Muniz – Eu saí do Brasil aos 12 anos de idade e na época eu não tinha nenhuma ligação com a música eletrônica. Quando eu me mudei pra Viena, a cidade estava vivendo o auge da música eletrônica. Não tinha como fugir e Follow Me não foi só um hit no Brasil, mas foi um hit internacional na cena house music.

Music Non Stop – Você se lembra quando foi a primeira vez que teve vontade de ser DJ? Viu alguém tocando que te inspirou ao vivo ou na TV?

Joyce Muniz – Eu nunca vou me esquecer, foi em uma festa em uma fábrica abandonada em Viena em 1998, quando eu fui ver, pela primeira vez, o DJ Grooverider, um dos pioneiros do drum’n’bass. Não só a música, mas a energia das pessoas e como elas absorviam o som. E isso me fascinou. Como uma pessoa sozinha tinha o poder de comandar uma pista cheia, daquele jeito, e fazer tanta gente feliz. Eu pensei: “também quero”. Mas uma das inspirações que realmente me ajudaram muito foi quando o meu melhor amigo e vizinho, Andy, comprou um setup de DJ, e isso acabou virando a nossa escolinha de reforço.

Music Non Stop – Você começou tocando jungle e drum’n’bass com 15, 16 anos… imaginava que isso poderia se tornar uma profissão?

Joyce Muniz – Eu não imaginava que isso seria a minha profissão quando comecei, era mais um hobby. Naquela época, ser DJ não era visto como uma boa profissão, mas eu sabia que seria difícil largar.

Joyce durante o ensaio de fotos que serviu de base para a capa de Made in Vienna

Music Non Stop – Rolou uma conexão Brasil lá em Viena, você  buscou nos seus conterrâneos um porto seguro ou nunca teve isso?

Joyce Muniz – No início da minha carreira como DJ não existia uma conexão entre Brasil e Viena pra mim. Mas eu me lembro, depois de alguns anos que eu já estava tocando, de ter ido ao Brasil para visitar familiares e pude ver que já existia uma cena de musica de eletrônica em São Paulo, e foi aí que eu comecei a me conectar com as pessoas. Na época, eu tinha uns 19 anos e eu conheci pessoas maravilhosas que viraram minhas amigas.

Music Non Stop – Você começou tocando no Dub Club em Viena aos 17 anos. Você já a partir daí assumiu DJing como profissão? Chegou a seguir com estudos “normais”?

Joyce Muniz – Na verdade, levou alguns anos para eu assumir a profissão de DJ. Demoraram alguns anos para eu me estabilizar na cena e ganhar algumas residências na cidade. A partir do momento em que a minha mãe viu que o meu hobby era algo que eu gostaria de seguir profissionalmente e o que realmente me deixava feliz, ela me apoiou, mas queria que eu terminasse os meus estudos. Eu estudei Hotelaria e Turismo em Viena. Eu até tentei seguir o ramo, mas o que fazia meu coração vibrar era tocar.

Joyce chegou a terminar os estudos em Hotelaria e Turismo, mas a paixão pela música gritou mais alto

Music Non Stop – Sua mãe tinha discos de MPB e é muito festeira. Conta um pouco sobre a influência dela na sua formação, por favor.

Joyce Muniz – A minha mãe foi uma grande influência para mim, não só na música, mas como um exemplo de mulher, de tomar as decisões certas e nos momentos certos, como finalizar os estudos, por exemplo. Ela sempre gostou de música e de festa, mesmo morando na Áustria sempre rolava festa em casa. Quando eu comprei os meus primeiros toca-discos, ela me presenteou com a coleção dela de discos de MPB, que é enorme e eu guardo com muito carinho. Um dia eu ainda vou poder passar para os meus filhos futuramente 🙂

Music Non Stop – Você viu Marky e Patife tocando em Viena. Como era ser brasileira e estar na pista deles nessa época?

Joyce Muniz – Foi uma época muito inesquecível para mim e para todas as pessoas que estavam presentes. Na Europa, naquela época, o drum’n’bass estava ficando muito cansativo e passado. Os primeiros lançamentos de d’n’b brasileiro viraram uma febre na Europa, era o que todo mundo estava precisando, uma nova influência. E foi quando vários artistas brasileiros explodiram na Europa, como Patife, Marky & XRS e Drumagick. Como residente do clube e com a minha influência brasileira, eu queria levar todos eles para tocar em nossas festas. E realmente todos eles se apresentaram, pela primeira vez, em Viena, em nosso clube.

Brilhando pelo mundo em festas ao lado de nomes como Dave Clarke

Music Non Stop – Como foi sua entrada na produção?

Joyce Muniz – Antes de começar a produzir as minhas próprias músicas, trabalhei como coproducer e como cantora para vários projetos e, logicamente, depois de ter a oportunidade de trabalhar com tantos produtores e artistas – como Stereotype, Richard Dorfmeister, Sofa Surfers, Munk, entre outros –  eu pude absorver e aprender muitas coisas, o que me deu a vontade de ter o meu próprio estúdio e produzir minhas próprias músicas.

Music Non Stop – Em pouco tempo você se tornou uma produtora muito respeitada. Num mercado tão concorrido como o europeu, você consegue encontrar explicação pra esse boom relativamente rápido?

Joyce Muniz – Primeiramente, muito obrigada. Eu acredito que foi uma combinação de vários fatores. Eu nunca tentei seguir uma moda, o que pra mim foi muito importante e me ajudou a evoluir o meu som. Eu demorei pra achar o meu estilo. Mas a partir do momento que eu encontrei a minha própria receita do bolo, eu tive um insight e vi que aquele era o caminho que eu tinha que seguir. Eu também tive oportunidades de trabalhar com outros artistas e também remixar vários nomes importantes, como Blaze, Amp Fiedler, Shonky, Tosca, Dnox & Beckers, Claptone, German Brigante DJ Hell, Paul Simon… Com isso, eu pude fortalecer o meu estilo e me diferenciar.

Music Non Stop – Back in The Days tem um sample de It’s More Fun to Compute, que foi aprovado pelo Kraftwerk. Me conta isso, por favor.

Joyce Muniz – Na verdade, a música Back in The Days não foi produzida para ser lançada. Eu tenho uma grande coleção de vinil, uns 3.000 e, muitas vezes, quando eu não me sinto inspirada, tento encontrar alguma coisa na minha coleção. Nesse dia, em 2012, por acaso, me inspirei na musica It’s More Fun to Compute. Passaram alguns meses e eu fui tocar em Londres. Um grande amigo meu, o cantor Rob Birch (Stereo MCs), apareceu no meu show, junto com o Mc Bam do Jungle Brothers e me apresentou a ele. Depois disso, eu convidei o MC Bam para um studio session em Viena, mas quando ele chegou eu tinha apenas esse beat do Kraftwerk. Ele pirou com a ideia e já começou a escrever uns textos, e eu disse: “vamos fazer um vocal em cima, mas não vamos utilizá-lo como beat oficial”.

Nós finalizamos a música e adoramos o resultado, mas sabíamos que a gente não poderia lançar. Mesmo assim, passei para o meu manager e publisher. Eles também amaram a música, mas com a situação do sample, deixamos meio que de lado. Em 2013, recebi uma mensagem na minha página do Facebook, me perguntando quando Back in the Days seria lançada. Fiquei muito surpresa ao saber que ele tinha ouvido a música, porque apenas quatro pessoas no mundo inteiro poderiam ter tocado ela. Perguntei onde ele tinha ouvido, foi quando ele me passou um link do Boiler Room do Richie Hawtin praticamente abrindo o seu set com a música. Várias pessoas começaram a falar sobre e me escreveram perguntando quando ela seria lançada. Foi quando o meu publisher me escreveu dizendo que ele havia passado a música para o Richie Hawtin, mas ao mesmo tempo ele disse que a gente não poderia lançá-la e que não era para eu passar para ninguém. Como o assédio estava tão grande, ele decidiu tomar as suas próprias providências e entrou em contato diretamente com o manager do Kraftwerk. Passaram uns seis meses, até que um dia recebemos um email diretamente do Ralf, dizendo que ele amou a minha interpretação da faixa e que ele, pessoalmente, iria liberar o sample para a minha música. Foi assim que tudo aconteceu. Final feliz! Foi muito gratificante, o pai da música eletrônica gostou do meu trabalho.

Antes eram ídolos, agora são migos: Joyce Muniz agora é parça de vários artistas de quem era fã. Foto: Albina Maks

Music Non Stop – Quem são os artistas mais incríveis de quem voêc era fã e hoje são amigos?

Joyce Muniz – O meu horizonte musical sempre foi muito aberto. Faz nove anos que eu trabalho para a FM4, que é uma rádio alternativa, onde eu tenho o meu próprio show. Por trabalhar lá e ter acesso a tantos gêneros musicais, eu tive a oportunidade de conhecer vários artistas. Um deles, alguém que sempre me influenciou na música e virou um grande amigo é o cantor Rob Birch (Stereo Mcs). O DJ Hell foi pra mim uns dos personagens importantes da cena de techno/electro, sempre amei os seus sets e fico feliz der ter remixado uma track de se atual álbum. Umas das mulheres que ganharam uma importância grande na cena eletrônica em pouco tempo, a Maya Jane Coles, também virou uma amiga. E também é uma honra ter uns dos bateristas mais foda do mundo, o Iggor Cavalera, como amigo. Hoje eu divido o estúdio em Berlim com o DJ T, que também é uma importante personalidade de música eletrônica. Acho que a amizade entre artistas funciona quando existe respeito, independentemente da idade e do estilo de música. Contudo, fico muito feliz de ver amigos da minha geração nos grandes line-ups do mundo, como: Emanuel Satie, ANNA, Claptone, Kim Ann Fox, Matjoe, entre tantos outros.

PRÓXIMAS DATAS NO BRASIL

16 de setembro – Laroc em Valinhos

22 de setembro – Leeds em São Paulo

23 de setembro – BASE no Rio de Janeiro

QUER MAIS #MILLERMUSIC? AQUI

 

Sair da versão mobile