O hit Mercedes Benz surgiu despretensiosamente há 55 anos
Em agosto de 1970, há 55 anos, Janis Joplin estava bebendo com amigos no bar Vahsen, em Nova Iorque. Próximas a ela sentavam-se o parceiro de composições Bob Neuwirth e os atores Rip Torn e Geraldine Page. Estava “extremamente feliz”, contou Patti Smith em seu livro de memórias Just Kids (Só Garotos, de 2010). A sensação branca do soul não sabia disso naquele momento ébrio, mas estava prestes a escrever sua última música. E um dos seus maiores clássicos.
A noite no Vahsen era uma espécie de sarau com gente do mundo artístico da cidade recitando poesia. Joplin estava na cidade para o show que faria mais tarde no Capitol Theatre. O rolê de “esquenta” no bar de poetas fez a garota de 27 anos, já uma estrela mundial da música jovem, se lembrar de um poema de Michael McLure, cujo primeiro verso era “C’mon lord, wont’ you buy me a Mercedes Benz?”.
Cria do blues, Joplin recitou o verso com uma bela melodia como alicerce, e já foi emendando outros. Neuwirth sacou o momento na hora. Foi até a mesa ao lado, pegou guardanapos e caneta e começou a anotar as palavras que saiam da boca da amiga, contribuindo também com alguns versos, enquanto o pessoal ao seu lado marcava o ritmo batendo com os copos na mesa.
Em poucos minutos, Janis Joplin versou sobre os anseios consumistas do cidadão comum estadunidense. Um carro de luxo, uma TV a cores e um rolê na Broadway. Quem estava no Capitol naquela noite pôde ouvir, em primeira mão, um dos maiores clássicos da história do rock na aurora dos anos 70. “Escrevi essa música agora há pouco, no bar ao lado”, contou a genial cantora antes de começar, acompanhada meio que de improviso por sua banda, Full Tilt Boogie Band. Mas essa não é a versão que o mundo conhece.
Três dias antes de morrer de overdose em um quarto de hotel, em outubro do mesmo ano, Joplin estava gravando o álbum Pearl. Durante um intervalo, a canção feita na mesa de bar veio à sua mente. Sem avisar a banda, entrou na cabine de voz e pediu para o engenheiro de som começar a gravar, enquanto marcava o ritmo batendo os pés no chão. Em apenas um take, estava registrada a versão final, que o mundo conhece, de Mercedes Benz.
Tão visceral e boêmia quanto sua criação, Janis a cantou pela última vez, justamente no dia em que a deixou para o mundo.