The Verve The Verve – foto: reprodução Youtube

HITStórias: The Verve e os segredos por trás da clássica “Bittersweet Symphony”

Claudio Dirani
Por Claudio Dirani

Os bastidores do single que completa 25 anos em 2022 e levou o grupo a duelar com os Rolling Stones

O The Verve até pode não ser uma das bandas mais poderosas da história do Britpop. Mas quando “Bittersweet Symphony” retornou às paradas internacionais em 2019, depois que a dupla Mick Jagger e Keith Richards decidiu dispensar a coleta de royalties (Richard Ashcroft perdeu a batalha legal para o empresário dos Rolling Stones por ter extrapolado o uso concedido do arranjo de cordas de “The Last Time”), o CD single lançado originalmente em 16 de junho de 1997 (acompanhado pelas faixas
“Lord I Guess I’ll Never Know” e “Country Song”) invadiu o cenário da cultura pop com força total.

Apenas nos Estados Unidos, o The Verve testemunhou “Bittersweet Symphony” disparar até a 13ª posição na categoria Hot Rock Songs da Billboard graças ao disparo de 132% no número de downloads e dos mais 2,5 milhões de streamings da música apurados no período pela Nielsen Music.

No momento em que “Bittersweet Symphony” completa 25 anos de história (assim com Urban Hymns, o terceiro do The Verve), é mais do que apropriado retornarmos brevemente a 1997 para resgatar as origens da polêmica faixa assinada por Richard Ashcroft que foi parar em escritórios de advocacia.

Bittersweet hit: The Verve resurge com um hit após turbulências

Lançado no verão britânico de 1995, A Northern Soul ratificou o The Verve no fervilhante cenário do Britpop, dominado à época pela guerra comercial e midiática entre Oasis e Blur, e acompanhado de perto por coadjuvantes de luxo como Pulp, Suede e o emergente Radiohead.

O sucesso do segundo álbum do grupo, embalado pelos singles “History” e “This Is Music”, entretanto, não foi resistente o bastante para manter a união de seus componentes.

Desentendimentos criativos e comportamentos alterados por drogas levariam Richard Ashcroft a desaparecer por semana das sessões no Loco Studios, no País de Gales.

Essas constantes turbulências seriam relatadas mais tarde por Owen Morris, produtor de A Northern Soul.

“Eles me deixaram maluco, literalmente. Mas tudo bem. No final das contas, é um excelente álbum. Só que eu nunca passaria por um processo como esse de novo”, reclamou Morris, que naquele mesmo ano ficaria encarregado da produção do clássico segundo disco do Oasis (What’s the Story?) Morning Glory.

Determinado a esquecer as perdas e danos das sessões de A Northern Soul, Richard Ashcroft decidiu se trancar no estúdio e se libertar do clima pesado, marcado principalmente pelas intermináveis brigas com o guitarrista Nick McCabe.

Depois desse período de “exílio forçado”, Ashcroft apareceu com a ideia central para a letra, inspirada parcialmente em seu pai, Frank Ashcroft (morto quando o músico tinha apenas 11 anos), e na dicotomia entre felicidade e dinheiro.

“(Meu pai) costumava trabalhar das nove às cinco da tarde e não chegou a lugar algum. Imediatamente, percebi que aquela vida não seria para mim”, declarou o compositor ao jornal Los Angeles Times em 1998.

Duas décadas mais tarde, Richard Ashcroft ainda sustentava a postura sobre os valores criticados em “Bittersweet Symphony”.

“As pessoas têm comparado, a um prêmio de loteria, a ideia de que muito dinheiro pode resolver todos os problemas. Porém, você olha agora para elas e pensa: se eu tivesse dado X para alguém, nosso relacionamento não teria acabado, mas teria se deteriorado no decorrer dos anos”, filosofou o compositor ao site Songfacts em dezembro de 2018.

Fora das quatro linhas: a batalha pelos créditos de “Bittersweet Symphony”

No final de 1965, o arranjador/produtor dos Rolling Stones, Andew Loog Oldham, decidiu criar versões instrumentais para uma coleção de hits da banda britânica, incluindo a canção-assinatura da dupla Jagger-Richards “(I Can’t Get No) Satisfaction” e “The Last Time”, ambos singles lançados pelos Stones naquele mesmo ano.

Três décadas mais tarde, o aparentemente inofensivo LP orquestrado por Oldham voltou aos holofotes, após despertar algumas ideias malucas em Richard Ashcroft.

Intrigado pela versão “The Last Time” repaginada por Oldham, o líder do The Verve se inspirou para criar um acompanhamento orquestral para o primeiro single de Urban Hymns.

“Eu ouvi uma das faixas do álbum e tive a ideia do arranjo (para “Bittersweet Symphony”), como se fosse algo parecido a um trabalho atual de Ennio Morricone”, explicou o artista inglês ao jornalista David Fricke em 1998.

“Então, depois de algum tempo, a música foi se transformando nessa ‘parede de som’ – uma verdadeira peça concisa de música pop”, refletiu Ashcroft.

Com a ideia consolidada – e a música completamente gravada pelo The Verve, com a supervisão de Youth (codinome do baixista do Killing Joke, Martin Glover) no Olympic Studios, em Londres – o empresário do The Verve, Jazz Summers, se dirigiu ao escritório da gravadora Decca, solicitar permissão para o uso comercial de seis meros segundos extraídos do instrumental de “The Last Time”.

O que Summers parecia não estar ciente naquele momento era da necessidade de solicitar permissão para a ABCKO – companhia do poderoso empresário nova-iorquino Allen Klein – a verdadeira e única detentora do copyright das músicas dos Rolling Stones.

Já com “Bittersweet Symphony” passeando pelas ondas de rádio de todo o mundo no final do primeiro semestre de 1997 (os EUA precisaram esperar até o começo de 1998), Klein entrou em cena para clamar seus direitos.

O resultado da intervenção foi avassalador. Além de precisar estampar no encarte de Urban Hymns “Música por Mick Jagger e Keith Richards com letra de Richard Ashcroft”, o The Verve precisou assinar um contrato autorizando a ABCKO a contabilizar todos os royalties da canção, que naquele momento estava em 2º lugar no Reino Unido e no Top 20 dos EUA.

Já Ashcroft – o verdadeiro gênio por trás do arranjo orquestrado por Wil Malone – teve de se contentar com um cheque de 1000 libras esterlinas, depois de concordar com o trato firmado com a empresa de Klein.

“Nós sampleamos apenas quatro compassos”, apontou Ashcroft. “E isso ficou em apenas um canal. Depois ocupamos mais 47 canais da mesa de som, usamos nossos próprios músicos na orquestra e ainda estão dizendo que Bittersweet Symphony é aquela mesma canção (dos Stones)”, reverberou o compositor.

Em meio ao imbróglio que só terminaria em 2019 com a cessão dos direitos autorais da música para Richard Ashcroft, outra curiosidade que envolve relação entre o The Verve e os Rolling Stones dá um tempero a mais ao histórico de “Bittersweet Symphony”.

Enquanto a música do The Verve deve ( ao menos em inspiração) ao clássico dos Rolling Stones, não se pode esquecer de que “The Last Time” também surgiu após Mick Jagger e Keith Richards ouvirem outro clássico: “This May be the Last Time”, gospel gravado pelas Staple Singers em 1961 no LP Swing Low.

Ao saber de todas as ligações da música responsável pelo caos legal envolvendo “Bittersweet Symphony”, Richard Ashcroft não se omitiu.

“Me pressionaram até o fim para me desvencilhar de uma das maiores canções de todos os tempos”, lamentou.

 

Claudio Dirani

Claudio D.Dirani é jornalista com mais de 25 anos de palcos e autor de MASTERS: Paul McCartney em discos e canções e Na Rota da BR-U2.

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