Conheça a história da maior parada LGBT+ do mundo
Quem olha para uma multidão de pessoas celebrando o orgulho LGBT+ em São Paulo, na maior parada do mundo, certamente se pergunta como foi que tudo começou. Em sua 28ª edição, a Parada LBGT+ espera um público de milhões de pessoas celebrando sua existência, o amor, o respeito e festando com a colorida animação que tanto nos encanta. Já considerado um dos maiores eventos turísticos do ano para a cidade, a Semana do Orgulho LGBT+ toma conta da cidade desde o feriado de Corpus Christi, na quinta-feira.
A história da Parada LGBT+ envolve emocionantes elementos de união, surpresas e claro, uma luta daquelas. André Fischer, um dos seus fundadores, conta que o evento foi precedido por anos de discussão entre organizações não governamentais, como o pioneiro projeto SOMOS, com o apoio da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do próprio PT.
A primeira tentativa de reunir a comunidade em São Paulo foi em 1996, na Praça Roosevelt. A ideia partiu depois de um encontro em São Paulo com exposição de um documentário sobre a Revolta de Stonewall, conflito entre a comunidade gay de São Francisco, nos Estados Unidos, e a polícia local em 1969, responsável por criar a primeira Parada do Orgulho Gay do mundo.
Em 28 de junho de 1969, a polícia de São Francisco deu uma batida no bar Stonewall Inn, utilizando de violência incomum, quase nos moldes da Polícia Militar paulista. A abordagem resultou em diversos protestos espontâneos reunindo a comunidade da cidade, uma das mais progressistas dos Estados Unidos. O episódio teve enorme repercussão, e mostrou ao mundo (incluindo o pessoal da Parada de São Paulo) que a união seria uma saída para a busca do reconhecimento de seus direitos.
Para se ter ideia do momento em que vivíamos nos anos 90, durante a divulgação do encontro da Roosevelt, a tensão era tão grande que a organização sugeriu que os participantes fossem ao evento mascarados. O rolê acabou não acontecendo, mas o esforço foi a fecundação da Parada LGBT+, que rolou pela primeira vez em 1997.
Segundo nos conta Fischer, então jornalista da Folha de São Paulo e responsável pelo portal Mix Brasil, a produção da primeira parada foi totalmente independente: um encontro marcado na escadaria do prédio da Gazeta, na Av. Paulista. André sentiu que algo estava acontecendo de verdade naquele 29 de junho quando viu um ônibus vindo do interior de São Paulo chegar ao evento, lotado de drag queens. “Pelas minhas contas, a primeira parada uniu em torno de duas mil pessoas, e acabamos ocupando uma faixa de veículos da Paulista.”
A partir de então, a Parada LBGT+ em São Paulo seguiu acontecendo, e crescendo. Ainda na base da resistência, seguiu ocupando a Av. Paulista anualmente, com público cada vez maior, por quase dez anos, quando começou a chamar a atenção do poder público e dos patrocinadores.
Só para se ter uma ideia do tamanho do buchicho, em 2003, seis anos após juntar duas mil cabeças na Paulista, o público presente já bateu um milhão de pessoas, segundo os organizadores, e 800 mil, na conta da Polícia Militar. Em 2007, décima edição, a presença foi de sensacionais 3,5 milhões. Quase metade (42%) era de turistas.
O primeiro objetivo da parada, portanto, já havia sido conquistado logo no primeiro terço de sua vida: a visibilidade. A população brasileira de todos os cantos do país começou a perceber que aquela comunidade existia, era enorme e, principalmente, era gente boa demais. Por que cargas d’água, então, tinham seus direitos negados o tempo todo?
“A parada foi responsável pelo avanço de muitas pautas, que começaram a avançar depois dela. A união civil, o reconhecimento do direito das pessoas trans… Apesar de sabermos que, na prática, a aplicação desses direitos já reconhecidos ainda passaria por muitas dificuldades, essa discussão avançou muito” — André Fischer.
A briga é constante. Seja pelo reconhecimento de direitos que são obrigatórios a todo ser humano, seja para impedir o retrocesso da situação que já foi conquistada, tema da Parada LGBT+ de 2024.
“A parada, acima de tudo, está capitaneando a luta de toda esta comunidade por ter seus direitos garantidos. Ela funciona como um catalizador destas pautas. O tema deste ano, Basta de Negligência e Retrocesso No Legislativo, tem a ver com o fato de praticamente todas as decisões referente aos nossos direitos terem sido tomadas a partir do Judiciário. Nada partiu do Legislativo”, segue Fischer.
Para segmentar o fato de que esta é uma exigência que parte de cidadãos brasileiros, a organização está convocando as pessoas a usar as cores verde e amarela na parada. “São cores da nossa bandeira que foram sequestradas pela parte mais retrógrada da sociedade”, completa.
O que não falta para os organizadores da Parada LBGT+ é apoio. Além dos milhões que se reunirão na Avenida Paulista, há um extrato muito maior da sociedade formada por amigos, familiares e simpatizantes da causa, amplificando o barulho a um volume impossível de ignorar. Afinal, temos a maior parada do planeta!
Nelson Feitosa, atual presidente da Parada SP, conta como se sente ao subir num trio elétrico 28 anos depois de um grupo ter se unido, bancado o risco e, com o festivo apoio de um ônibus cheio de drag queens, desfilado pela principal avenida de São Paulo:
“Subindo hoje num trio elétrico e vendo a maior parada do mundo tomando conta da Avenida Paulista, junto com a diretoria, nosso sentimento é de imenso orgulho e emoção. É incrível testemunhar o quanto crescemos e como nossa luta por direitos, visibilidade e respeito alcançou tantas pessoas. Desde os primeiros passos, enfrentamos muitos desafios, mas ver essa multidão diversa e vibrante é uma prova de que nossa voz ecoou forte e que a união faz a diferença. Este momento é uma celebração de conquistas e um lembrete de que a jornada continua. É um dia de comemorar nossa identidade, nossa força e a certeza de que estamos construindo um mundo mais inclusivo e justo para todos”.
Todos desejamos que a Parada LBGT+ 2024 seja a maior de todas. E que siga crescendo, exponencialmente. Basta de retrocesso.