Filme satiriza o racismo embutido em querer delimitar a obra de um artista à sua etnia
A dica de hoje levanta um tema polêmico: você acha que uma pessoa deve ter mais espaço e mais holofotes por ser de determinada etnia? Essa é a bola que o espirituoso Ficção Americana levanta, contando a história de Monk (Jeffrey Wright), um escritor que, por acaso, é preto — um detalhe que para ele não entra na equação quando se trata da escrita.
Sua abordagem é humana, mas em dado momento, ele entende que o que o mundo, o mercado e a crítica esperam é que ele escreva apenas sobre ser negro, o que soa preconceituoso e reducionista.
Até que um dia, ele resolve de sacanagem fazer um livro só de clichês sobre ser preto e marginalizado. Carrega nas tintas, arruma um pseudônimo e lança a obra na intenção de provar o absurdo que é colocarem um artista numa caixa de “racializado”. Para seu espanto, porém, o livro é um sucesso absoluto, a ponto de Hollywood querer adaptá-lo para o cinema.
O bota reparo é pra metalinguagem na estrutura do roteiro de Cord Jefferson (roteirista e diretor), que abriga, de forma genial, dois filmes em um. A crítica em tom satírico sobre o dilema do protagonista é o filme A! Mas em paralelo, há um filme B, de drama, acontecendo. Monk perde a irmã, precisa cuidar da mãe com demência e tem dificuldades de se relacionar com o irmão e com a nova namorada.
Ao longo da película, o filme B fica maior e mais importante que o filme A, reforçando a mensagem que a personagem e Jefferson querem revelar: há problemas humanos ainda maiores, mais profundos e mais interessantes do que os clichês étnicos.
Leve, inteligente e provocativo, Ficção Americana não é sobre um escritor preto; é sobre um escritor.
O filme está disponível no Prime Video.