Em dia de “cura gay” na internet, Pet Shop Boys deixam São Paulo mais rainbow com show revisitando clássicos da carreira

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Dentre as diversas qualidades que elevam um artista pop ao olímpo dos inesquecíveis, talvez a mais importante delas seja a capacidade de usar a influência conquistada na carreira para extrair de seu público algo maior, nem que seja involuntariamente.

O Music Non Stop já havia dado esta letra no grande almanaque dos Pet Shop Boys, publicado antes do show desta terça (19), que lotou o Espaço das Américas em São Paulo. Eles são uma espécie de unanimidade festeira. Seu som é ouvido e dançado por todo tipo de gente. De garotos à “geração 80”, de gays a héteros, da esquerda para a direita, de cima para baixo, de dentro e de fora dos armários.

Eis que, num momento tão polarizado e, como não dizer, problematizado como o que o Brasil vive hoje, a dupla de simpáticos e amados ingleses Chris Lowe e Neil Tennant chega com um show que se mostrou refrescante, de uma leveza importantíssima para esses tempos.

Classificar o público, de tão diverso, seria andar para trás. A variedade de tipos era tão agradável que seria uma sacanagem rotular ou fazer amostragens. “Estamos todos juntos nesta festa tonight” era uma das mensagens subliminares trazidas pelos Pet Shop Boys no show que traz ao Brasil a turnê de seu último álbum, Super.

Neil Tennant com a mesma voz dos anos 80, resgardada pelo estilo spoken word de cantar

Já na terceira música, a dupla conquistou a platéia. Pop Kids, carro chefe do disco novo, acendeu o pavio e a temperatura foi crescendo como um caldeirão de polenta a partir de então, abrindo caminho para a declaração de amor dos Pet Shop Boys pelo Brasil, a canção Se A Vida É (That’s the Way Life Is), escrita logo após a primeira vindo dos Pet Shop Boys ao país, em 1993.

Outra grande lição de vida subliminar do show veio justamente com essa música, cheia de vibrações praieiras em sua produção e uma letra que recomenda “caaalma…. relaxem… take it easy…”, ou simples e urgentemente: “menas”!!! Se a Vida É caiu em uma São Paulo cabreira como um beijinho no rosto, um sopro de vento fresquinho… um primeiro gole de cerveja gelada com os pés acariciando a areia. Nunca uma música foi tão necessária em uma festa e, na boa, funcionou direitinho.

West End Girls@Espaço das Américas

Com o público da cidade devidamente encantado, o show seguiu na toada de “hoje é noite para se divertir” até o fim, fervendo cada vez mais até chegar ao ponto de mãos pra cima, gente pulando, cantando junto aos berros e fazendo cenografia com a ótima produção de luz e palco, dando o devido suporte à música dos “meninos” que por sinal desafiaram o público com mais uma série de provocações: os seus recadinhos para a timeline da música eletrônica mundial. O show foi permeado por simpáticas cutucadas para mostrar quem manda. Ora a dupla invocava Daft Punk, com os capacetes desenhados para a Super Tour, ora Disclosure em rápidas releituras da acid house, ora Underworld nas camadas rasgantes de sintetizadores e lazers que incendiaram a platéia na metade final do show. Tudo feito com a classe, a elegância e principalmente a leveza dos Pet Shop Boys. Algo como “vocês são lindos e talentosos, mas a gente lacra desde 1981, baby!”

Após pular ouvindo uma sequência final do tamanho de It´s a Sin, Devices, Go West, Domino Dancing e You´re Always On My Mind, o público dos Pet Shop Boys foi embora para casa diferente. Mais leve e com certeza de é mais do que OK ser gay.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.

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