Dia do Jazz: 10 discos indispensáveis para entender o gênero que encanta o mundo há 100 anos
Hoje é o Dia Internacional do Jazz e para comemorar, nossa especialista Adriana Arakake preparou uma lista com os dez álbuns do gênero que você não pode deixar de ouvir
Muito difícil escolher só dez no dia do jazz. O jazz é uma paixão, como bem retratado em tantos filmes e na animação Soul, a mais recente ganhadora de Melhor Trilha Sonora do Oscar. A Pixar queria fazer um filme onde o personagem fosse profundamente apaixonado por algo, mas não tinham ideia de qual seria essa adoração. Após o diretor do filme assistir uma entrevista de Herbie Hancock em que descreve com emoção um show realizado ao lado de Miles Davis, onde o pianista erra uma nota e Miles transforma aquilo numa coisa linda como num feitiço, a equipe se dá conta de que essa era exatamente o tipo de paixão que procuravam, aquela que vem do fundo da alma, o jazz.
O Dia Internacional do Jazz foi criado há dez anos pela UNESCO, presidido por Audrey Azoulay, diretora geral da entidade e pelo lendário pianista Herbie Hancock, tem o intuito de reunir comunidades, escolas, artistas, historiadores, acadêmicos e entusiastas do jazz em todo o mundo para celebrar e aprender sobre o gênero e suas raízes, assim como futuro e impacto; sensibilizar para a necessidade do diálogo intercultural e da compreensão mútua; e reforçar a cooperação e comunicação internacionais. Todos os anos, em 30 de abril, esta forma de arte é reconhecida por promover a paz, o diálogo entre as culturas, a diversidade e o respeito pelos direitos e pela dignidade humana; erradicar a discriminação; promover a liberdade de expressão e a igualdade de gênero; e reforçar o papel dos jovens nas mudanças sociais.
Confira a programação completa do evento, com várias atividades online, acessando o link .
Para preparar esta lista comemorativa, escolhi 5 clássicos, que estão em em qualquer lista desse tipo, alguns já citei em meus textos anteriores, e para sair do lugar comum, 5 que são alguns dos meus prediletos. A tarefa é árdua, o estilo é amplo e são inúmeros os artistas que mereceriam um lugar nesta relação, mas vamos aos escolhidos:
John Coltrane – Blue Train
O primeiro, óbvio, é Blue Train, de John Coltrane, lançado pela Blue Note em 1958, foi o primeiro álbum de Trane como líder e sinalizou o despertar espiritual que ele perseguiria pelo resto de sua vida, em excelente companhia dos músicos Lee Morgan (trompete), Curtis Fuller (trombone), Kenny Drew (piano), Paul Chambers (baixo), Philly Joe Jones (bateria), produz um disco memorável e indispensável a qualquer coleção de jazz.
Chet Baker – Chet Sings
Meu predileto deste mestre é Chet Sings (Pacific Records, 1954), porque amo ouvir a voz dele, suave, melodiosa, que parece estar sussurrando em nossos ouvidos. As lindas canções My Funny Valentine, I Fall in Love Too Easily, entre outras, trazem a voz de Baker em total conexão com seu trompete e o auxílio luxuoso do pianista Russ Freeman, o baixista Carson Smith e o baterista Bob Neel fazem desse disco um clássico fundamental.
Dave Brubeck – Time Out
O respeitadíssimo pianista e compositor Dave Brubeck não poderia ficar de fora com Time Out (CBS, 1959) atemporal e visionário, o álbum explorou diferentes compassos de jazz, quando o comum eram padrões escritos em 4 ou 3 batidas em um compasso, Brubeck apresenta Take Five. Com Paul Desmond no sax alto, Joe Morello na bateria e Eugene Wright no contrabaixo, Time Out é um clássico absoluto. Take Five, a faixa principal do disco, foi lançado como single e o primeiro instrumental de jazz a vender mais de um milhão de cópias. As experiências musicais na Índia, influenciaram muito no groove de Joe Morello, em cima dessa nova batida, Paul Desmond, coloca uma melodia principal, o grupo improvisa e a grosso modo, nasce daí Take Five. Absolutamente Imprescindível.
Herbie Hancock- Maiden Voyage
Maiden Voyage (Blue Note Records, 1966) encontra Hancock em seu pico criativo, quase no final da década de 1960, é um dos melhores discos do artista, as composições suaves e a interação do grupo fizeram esse disco entrar nesta lista. O time não poderia ser melhor, Freddie Hubbard (trompete),George Coleman (sax tenor), Ron Carter (baixo), Tony Williams (bateria) e claro, o próprio Hancock ao piano. Maiden Voyage, mais de 50 anos e ainda continua fresco, maravilhoso e necessário em uma coleção básica de jazz.
Duke Ellington – Far East Suite
Para continuar, preciso citar Duke Ellington que teria feito aniversário ontem (29/04) e pra essa celebração dupla, indico o disco Far East Suite, ganhador do Grammy de Melhor Performance Instrumental de Jazz, do ano de 1968. A turnê da Ellington Orchestra à Síria, Jordânia, Índia, Sri Lanka (então conhecido como Ceilão), Paquistão, Irã (então Pérsia), Líbano e Turquia, foram a grande inspiração das composições de Ellington e Billy Strayhorn, pensadas com a intenção de transmitir a emoção e admiração sentida pela banda ao viajar por terras que eram totalmente exóticas para eles na época. Esta obra prima é uma verdadeira viagem musical.
George Benson e Jack McDuff
Este disco entra na minha lista porque simplesmente amo os acordes da guitarra de Benson e pelo soul do organista McDuff, artista por quem sou completamente apaixonada. Briar Patch é uma das músicas de jazz mais divertidas na minha opinião, fico feliz toda vez que ouço e tenho vontade de sair dançando, sendo assim a entrada aqui foi necessária. O disco de 1977, lançado pela Prestige Records, é uma festa.
Charles Kynard – Afro-Disiac
O talentos excepcionais de Grant Green (guitarra), Houston Person (saxofonista), Jimmy Lewis (baixo) e baterista Bernard “Pretty” Purdie (bateria), em conjunto com o virtuoso organista Kynard, fazem do disco Afro-Disiac (Prestige,1970) uma delícia muito fácil de ouvir, que você não quer que acabe nunca.
Jimmy McGriff – The Worm
Outro incrível músico das teclas, destaco o álbum The Worm (Solid State Records). Gravado no verão de 1968, com uma forte influência funk, a faixa título, composta por McGriff em parceria com o saxofonista Fats Theus e o produtor Sonny Lester dá o tom do disco, com solos vigorosos e um soul pesado é um álbum monstruoso e marcante.
Lou Donaldson – Blues Walk
As capas de todos os discos do saxofonista Lou Donaldson são as que considero mais bonitas, além dos conteúdos sublimes, é claro, mas já comece apreciar pelas capas. Blues Walk (Blue Note Records, 1958) é um dos grandes momentos da carreira de Donaldson; gravado no Estúdio Van Gelder, vale destacar as congas de Ray Barreto. Nenhuma coleção BeBop está completa sem essa preciosidade.
Stan Getz e João Gilberto
Aqui o clássico que figura em quase todas as listas de melhores de todos os tempos e não podia faltar, Getz/Gilberto lançado pela Verve Records, em 1964, tem um time de dar inveja, Tom Jobim (piano), Milton Banana (bateria), João Gilberto (violão e voz). Stan Getz (sax tenor) e Sebastião Neto (baixo), as canções contam também com a voz doce e suave de Astrud Gilberto. A química do grupo é visceral, os grooves de Banana e Neto são impecáveis, tudo isso somado ajudou a alçar Girl from Ipanema e Corcovado à fama mundial e tornar o jazz bossa nova uma febre na época.
É claro que não dá pra falar aqui de todos que mereciam, Miles Davis, Mingus, Art Blakey, Dizzy Gillespie, entre tantos inúmeros nomes que produziram e elevaram o jazz. A intenção aqui foi trazer alguns dos mais importantes e outros que não costumam entrar nessas listas, mas são tão bons que estão neste despretensioso rol comemorativo. O jazz é um gênero amplo, e como eu disse no começo do texto, apaixonante.
Espero sempre com as minhas palavras abrir um pouco o repertório de quem não conhece muito e trazer lembranças boas para os entendedores, o que importa mesmo, no final das contas é celebrar a música e toda sua grandeza. Finalizo esta pequena contribuição ao Dia Internacional do Jazz com a mensagem de Herbie Hancock, Embaixador da Boa Vontade da UNESCO:
“Quando um ser humano é oprimido, a tendência natural é sentir raiva. Jazz é uma resposta à opressão que não é balas e sangue. Jazz é a expressão de harmonia … e ao mesmo tempo de esperança e liberdade.”
Agora, mais do que nunca, vamos nos unir e espalhar a ética do movimento global do Jazz Day em todo o planeta e usar isso como uma oportunidade de ouro para a humanidade se reconectar, especialmente em meio a todo esse isolamento e incerteza. ”