Cazuza Cazuza – foto: divulgação

De Cazuza a Roberto Carlos. Conheça dez artistas brasileiros que ganharam covers em espanhol

Leonardo Vinhas
Por Leonardo Vinhas

Nosso especialista em rock latino Leonardo Vinhas garimpou 10 artistas brasileiros que tiveram versões de suas músicas gravadas em espanhol

Cover serve para apresentar novos universos musicais? Talvez, talvez… A verdade é que covers nem sempre são feitos por motivos puramente artísticos. Claro que o músico pode gostar daquela canção e querer fazer sua releitura, por prazer ou pelo desafio. Mas muitas vezes a versão é um trabalho encomendado para uma trilha sonora, uma publicidade ou algo do tipo. Ou então o artista malandramente saca a possibilidade comercial de aproveitar uma receita que comprovadamente funcionou, ou – uma quarta hipótese – ele percebe uma gema escondida num repertório que não deu muita sorte comercialmente.

A lista a seguir apresenta exemplos dos quatro tipos. Mas este colunista quer acreditar que também pode servir para apresentar um pedacinho de um novo universo musical. O norte aqui foi pegar canções de um repertório mais pop brasileiro que ganharam releituras em espanhol. Algumas delas se tornaram megahits, outras fizeram alegria de uns poucos sortudos no underground, e tem as que estão no meio-termo entre um e outro.

 

 

Em uma premissa semelhante, seria possível fazer um disco de canções originalmente compostas em espanhol que ganharam releituras em português. Tem material bom, e um bom tanto de porcaria, nesse recorte. Mas isso fica para outra ocasião. Agora é hora de mergulhar no universo das versiones (ou reversiones, valem as duas expressões). ¡Adelante!

“El Tiempo No Para”, Bersuit Vergarabat

A versão para “O Tempo Não Pára”, de Cazuza, é tão popular na Argentina que muita gente por lá nem desconfia que ela é um cover. Foi um hit quando foi lançada no álbum de estreia da banda, ¡Y Punto…! (1992), mas explodiu mesmo na regravação do álbum ao vivo De la Cabeza (2002). Tá aí o vídeo com mais de 35 milhões de visualizações para não me deixar mentir.

“Complicado y Aturdido”, Los Pericos

Da “Mulher de Fases” original só sobrou a melodia: os argentinos Los Pericos pegaram um dos maiores hits dos Raimundos, mudaram totalmente a letra (ficou pura sofrência melancólica) e meteram um arranjo pop reggae. Foi lançada em 2002 e regravada em 2010, sem muitas mudanças, ao lado do Cidade Negra. Fez sucesso? Sim. Ficou boa? Olha…

“Un Millón de Amigos”, Romina Peluffo

Achar covers em espanhol de Roberto Carlos é fácil, difícil é achar uma tão boa quanto essa! A uruguaia Romina Peluffo fez essa versão a pedido do radialista Federico Medina, que queria uma música-tema para seu programa na emissora Radiomundo, também chamado Un Millón de Amigos. A inspiração – assumida – foi Pixies e Nirvana. Dá o play e põe no repeat.

“Perfección”, Attaque 77

Essa versão quase literal, até com um pouquinho de portunhol, dá uma bela acelerada, e acaba tirando um pouco do tom épico do original da Legião Urbana. Mas não dá para dizer que os caras mandaram mal: a urgência e a vigência da letra também se prestam bem a uma pegada punk. Ela é parte do disco de covers Otras Canciones (1998), que também conta com uma versão esquisitona de “Amigo”, do Roberto Carlos.

“O Relógio”, Cafe Tacuba

El Justiciero Cha, Cha, Cha é um tributo latino-americano aos Mutantes que foi lançado em vários países em 2011, mas por várias razões, só ganhou edição nacional em 2021. O quarteto mexicano Cafe Tacuba (às vezes grafado como Cafe Tacvba) nunca decepciona, e coube a eles a versão mais bem-sucedida do álbum – o restante varia entre bom, curioso e… esquisito. Escute e constate por si próprio. 

“Emociones”, La Derecha

Não falei que era fácil achar versões do Roberto Carlos em espanhol? Fácil de explicar: Robertão teve grandes hits nos outros países latino-americanos, tanto em espanhol como em português. Mas até que esse groovezinho simpático da banda colombiana La Derecha funciona bem, Inofensiva, é verdade, mas cativante e nada óbvia.

“Despedida”, Hablan por la Espalda

Se você que é brasileiro não conhece o Figueroas, imagina os uruguaios. Mas a veterana banda de hardcore mezzo psicodélico Hablan por la Espalda pegou esse “não-hit” da banda alagoana, injetou peso, manteve o sotaque e fez uma versão sem medo de ser feliz, Funciona, e deixa o ouvinte feliz também.

“Unos Versos”, Acorazado Potemkin

O power trio argentino não brincou ao fazer essa reinterpretação de “Uns Versos”, de Adriana Calcanhoto: meteu peso e ambiência soturna no que era (bela) melancolia acústica. Na única entrevista da banda para o Brasil, o vocalista e guitarrista Juan Pablo Fernández contou a história e a proposta da versão:.”Eu escutava muito o disco Público, da Calcanhotto, em dado momento da minha vida – um momento bem triste, como você pode imaginar. (…). Para a versão, fizemos um exercício de manter o tempo e a melodia tais como eram, mas todo o resto era o som do Potemkin: com volume, com delay, potência. (…) Eu diria que também envolveu o desafio de nos apropriarmos de um estilo de música muito diferente do nosso, mas pensando bem, vejo que ela tem uma dívida muito grande com a música gaúcha”.

“Coração Tranquilo”, Dadalu

A multiartista chilena Dadalú flerta com rap, funk, r&b e até com o lo-fi em sua carreira. A moça não tem medo de se arriscar, e a prova disso é que encarou fazer uma versão em português para “Coração Tranquilo”, hino mântrico de Walter Franco. A canção está presente em Um Grito que se Espalha, álbum feito em homenagem a Franco em 2018. Vale apontar que Dadalú também regravou “Não me Estrague o Dia”, dos Paralamas, também num álbum-tributo aos brasileiros. E por falar nisso…

“Una Brasilera”, Bareto

O Bareto é um dos maiores responsáveis por reapresentar a chicha (cumbia peruana) para as novas gerações. Sua versão de “Una Brasilera” (é, aquela dos Paralamas) foi um pequeno hit em seu país natal, e faz parte de Caleidoscópio – Um Tributo Ibero-brasileiro aos Paralamas do Sucesso, lançado pelo selo Scream&Yell em 2015, com outras 17 canções do trio regravadas.

Um disco inteiro de versões…

Brasil También Es Latino foi outro lançamento do Scream&Yell só com artistas dos países de hablaespana fazendo releituras de canções originalmente gravadas em português. O leque vai de Mutantes (“Baby”, feita pelos venezuelanos La Pequeña Revancha) ao Sepultura (“Refuse/Resist”, em uma versão surf instrumental pelos argentinos Lefunders), passando por Novos Baianos, Nação Zumbi e até a obscura dupla pernambucana Rubinho & Mauro Assumpção. Na versão para download tem faixa bônus exclusiva, mas você também pode ouvir no seu streaming de preferência.

… e outro também

Esse compilado indie mexicano bebe principalmente na fonte dos anos 1960 e 1970, e oscila entre versões comportadas para canções de Caetano Veloso, Chico Buarque e Tom Zé, e umas mais saidinhas para temas de Herivelto Martins e de Baden Powell & VInicius. Mas a mais inusitada do disco é uma esquisitíssima versão de “Ilariê” ao piano e com vocais psicodélicos feita por Carla Chinski.

 

 

Leonardo Vinhas

Leonardo Vinhas é jornalista, escritor e produtor cultural na ativa há mais de 20 anos. Escreve para o Scream&Yell desde 2000, já produziu 19 discos para o selo S&Y, e foi co-responsável pelo Festival Conexão Latina.

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