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Bob Marley 80 anos: a história antes do reggae conquistar o mundo

Bob Marley

Foto: Reprodução

Filho da jovem Cedella e de um marinheiro britânico ausente, Robert “Bob” Marley nasceu em 06 de fevereiro de 1945

06 de fevereiro de 1945. A parteira da pequena vila rural de Nine Mile, no interior da Jamaica, foi chamada para o sobrado de madeira onde a jovem Cedella, de apenas 18 anos, morava com sua mãe. Um dia quente e seco, típico da estação na ilha. A vila, encrustada na floresta tropical, é minúscula, com menos de dez vielas ligadas à rua principal, Nine Mile Road, onde a família morava. O pai, um marinheiro britânico de 60 anos chamado Norval Marley, não estava lá. Não estaria na maior parte dos primeiros dez anos de Robert “Bob” Marley e, a partir de então, desapareceria para sempre, ao falecer longe de casa em 1955. Dele, Robert herdou apenas o sobrenome, que décadas mais tarde tornaria famoso em todo o planeta.

Cedella Booker [antes, Cedella Marley], a mãe de Bob Marley. Foto: Reprodução/Wikipedia

Dando mais atenção ao futebol do que à escola, que levava em banho-maria, Robertinho absorvia a rumba e o mambo escutados por sua mãe, captados pelas ondas AM das rádios caribenhas. Mais tarde, Bob Marley adicionaria ao molho a melancolia do blues e altas dozes de soul music e doo wop, além do ska e rocksteady jamaicanos — os ritmos da moda no pais entre as décadas de 50 e 60 —, para criar algo único, que conquistaria o mundo.

Dez anos depois, Cedella já havia desistido do relacionamento com o sumido marinheiro, e sua morte consolidou o relacionamento com um de seus vizinhos, Edward Booker. Encontrou enfim um marido. E o pequeno Robert, um pai. Foi Booker quem proporcionou à Cedella estabilidade afetiva, e deu a Bob três irmãos mais novos: Constance, Richard e Anthony. Enquanto o casal observava, do alpendre da casa, o quarteto aprontando e jogando futebol na rua, pensavam sobre o que fazer para botar comida na boca da molecadinha, alheia às preocupações dos pais.

Além de pouquíssimas oportunidades de trabalho, Cedella, apaixonada por música e cantora amadora, estava desamparada. Sua mãe, Omeriah, havia se mudado para Kingston em busca de melhores condições de vida, em um momento de êxodo rural na Jamaica. A decisão estava tomada. A família toda trocaria a calmaria de Nine Mile para ficar mais próxima da vovó, em Trenchtown, uma favela no sul da capital Kingston que, na década de 50, crescia rapidamente abrigando em barracos famílias que chegavam do interior. Cedella e Edward, no entanto, conseguiram um cafofo nos “Government Yards”, conjuntos habitacionais construídos pelos britânicos na década de 40.

A mãe de Bob Marley não sabia, mas fez tudo direitinho, e é possivelmente a maior responsável pelo reggae ser tocado em cada quiosque de praia ao redor do planeta. Encheu a criança de música em seus primeiros anos e, na pré-adolescência, aquela época em que nos tornamos verdadeiras esponjas (para os bons e maus hábitos), o levou para o mais vibrante e efervescente cenário cultural da Jamaica, Trenchtown.

Na quebrada, Robert se aprofundou na música jamaicana, aprendeu algumas regras de sobrevivência de gangues que renderiam alguns rumores controversos de, digamos, “más práticas comerciais”, e a cultura rastafari. Helai Selassie, imperador da Etiópia tido como sagrado para a cultura rasta, ainda não havia falecido (foi assassinado em 1975), e tinha uma multidão de devotos na região de Trenchtown. O maior tesouro que Marley encontraria em sua nova vizinhança seriam os amigos Bunny Wailer e Peter Tosh. Os parças se reuniam em pátio perto da casa da família para tirar um som. Um núcleo de futuros músicos que formariam o Wailing Wailers (posteriormente mais conhecidos como The Wailers). Hoje, o espaço abriga um museu dedicado à memória do reggae de seus grandes heróis. E Bob Marley, sempre que era perguntado sobre a família, incluia Wailer e Tosh como irmãos.

As melhores obras artísticas sobre a guerra vêm de quem efetivamente esteve no front. Curiosamente, melhor fala de paz quem a deseja, e não os que a possuem no dia a dia. Como acontece em toda periferia do mundo, jovens são ensinados a lutar uns contra os outros, e não contra o verdadeiro opressor que renega a suas famílias o mínimo necessário para uma vida digna. Não foi diferente em Kingston com os rude boys, grupos de jovens que se estapeavam pelas ruas.

Bob não precisou de horas de voo para compreender sua missão de espalhar a paz. Primeiro entre os vizinhos, e depois para o mundo. Conseguiu gravar seu primeiro disco, solo, aos 17 anos. Na letra de Judge Not!, um pedido para que as pessoas olhem para si antes de apontar o dedo na cara dos outros. No lado B, Do You Still Love Me, uma reinterpretação do que se ouvia nas letras do soul nos Estados Unidos. Ambas ainda soando como o tradicional ska que se fazia na quebrada. Marley ainda não havia encontrado “o seu som”, e o single acabou passando despercebido.

Foi em sua segunda aventura dentro de um estúdio que o homem explodiu. Joe Higgs, mestre da área, reconheceu o valor dos três amigos, Marley, Wailer e Tosh, e os levou para um papo com Clement “Coxsone” Dodd. Saíram de lá com um contrato para gravar, com o nome de Wailing Wailers, o compacto de Simmer Down. Na capa, três garotos de terno e cabelo curtinho, à moda dos artistas estadunidenses.

Simmer Down, na gíria da época, significava algo como “calma ai” ou”esfria a cabeça”. Era um recado direto aos rude boys. Um pedido para que a galera parasse de se estapear. O resultado? Primeiro lugar nas paradas jamaicanas, com uma mensagem positiva de união. As ruas de Trenchtown moldaram o Bob Marley que o mundo conheceu.

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