Spotify Imagem: Yalcin Sonat/Shutterstock/Reprodução

Músicas sem plays, faixas ilegais, playlists para plantas e outras bizarrices do Spotify

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Plataforma de streaming criada em 2006 domina o mercado mundial. E gera, além de polêmicas, estatísticas bem estranhas

Quando foi criado em Estocolmo, na Suécia, o Spotify aproveitou-se do fato de aparecer para o mundo na hora certa: a democratização da internet de banda larga. Tudo se encaixou direitinho. Um aplicativo disponível para celulares e desktops, bonitinho e fácil de usar, e que reunia boa parte do catálogo musical disponível à distância de um clique. Cada cidadão do planeta (no Brasil, o serviço foi disponibilizado em 2014, há exatos dez anos) era dono de uma gigantesca biblioteca universal de músicas.

Acompanhado por concorrentes como Apple Music, Amazon e Deezer, a plataforma virou de cabeça para baixo o mercado da música. Acabou com a venda de arquivos em MP3, facilitou a entrada de novos artistas no mercado e se estabeleceu como a forma mais comum de se consumir música.

A empresa sempre esteve envolta em polêmicas. Demorou a dar lucro e, ainda hoje, tem resultados bastante moderados. Em 2023, faturou cerca de 3,6 bilhões de dólares, com lucro de menos de 1%, mesmo sofrendo reclamações e retaliações de artistas sobre o baixo valor pago aos criadores para cada play em suas músicas. A gritaria é geral, e vem desde grandes figuras, como Snoop Dogg e Joe Cocker, até os independentes.

Lucrativo ou não, o Spotify segue aumentando sua participação e dominando o mercado a cada ano. É o que investidores chamam de “poder de destruição” de um aplicativo. Os grandes jogadores do mundo capitalista colocam rios de dinheiro em uma companhia de tecnologia não só pelo lucro que ela gera, mas na aposta de que ela se tornará “obrigatória” para os usuários, caso de aplicativos como Uber e WhatsApp, por exemplo.

O resultado financeiro do serviço não é o único número bizarro conhecido. O Spotify, ao seus 18 anos de idade, gera números e estatísticas pra lá de absurdas.

Um gigantesco depósito de música

O Spotify divulgou que abriga, em sua base de dados, mais de cem milhões de músicas, além de cinco milhões de podcasts e 350 audiolivros (nova aposta da empresa). Não são, como alguns pensam, todas as músicas do mundo. Muitos músicos decidem não disponibilizar seu catálogo na plataforma, buscando outras mídias ou, até mesmo, aplicativos alternativos, como o Bandcamp e o SoundCloud, em busca de receitas melhores.

Além dissos, muitos artistas que lançaram músicas antes do advento do streaming, principalmente os que não estão mais atividade ou já falecidos, simplesmente não digitalizaram seu acervo e o registraram no universo digital, fazendo com que só existam em sebos de discos, arquivos piratas ou vídeos no YouTube.

Uma pirâmide com topo bem exclusivo…

Levando em conta todo esse gigantesco universo musical disponível no Spotify, a concentração de audiência é gigantesca. Apenas dez faixas geram mais de um bilhão de plays cada. Considerando que a plataforma contabilizou 29 bilhões de plays em 2023, dá para se ter a noção do quão seleto é o topo desta pirâmide.

…e uma base afundada no deserto

Uma em cada quatro músicas disponíveis no Spotify não teve um só play em 2023. Ou seja, 25 milhões de faixas foram simplesmente esquecidas pelos usuários da plataforma, morando em um imenso deserto de dados, sobre o qual se ergue uma seletíssima pirâmide. Dos 11 milhões de artistas inscritos na plataforma, apenas dez mil, no mundo todo, recebem mais do que cem mil dólares por ano, segundo relatório da própria empresa.

Um mundo alternativo de faixas ilegais

O movimento gerado pelo Spotify causou um efeito pra lá de estranho no mundo da música. Tanto a plataforma quanto seus concorrentes permitem o upload de músicas manipuladas, não autorizadas pelos seus criadores. Músicas com velocidade aumentada ou diminuída, diferentes da original, ou com tonalidades modificadas, por exemplo, são consideradas como “manipuladas”.

Mais de um milhão de arquivos desse tipo rodam nos players mundo afora, alguns gerando audiências gigantescas. Apesar de detonar o trabalho original sem a anuência dos compositores, quem apronta esse tipo de coisa não recebe direitos autorais indevidos. A grana continua indo para quem compôs a música.

Um exemplo de quão malucos somos

O Spotify divulga relatórios anuais contabilizando as tendências de crescimento entre estilos musicais, artistas, playlists e muito mais. Escavadores digitais se debruçam sobre os números, que identificam o quão estranho é o comportamento humano no mundo dos streamings.

Em 2021, por exemplo, as playlists de “músicas para plantas ouvirem” cresceu enormes 1.400% na plataforma. Outras, relacionadas a OVNIs (geralmente podcasts), já foram executadas 25 milhões de vezes mundo afora. É possível encontrar outras bizarrices, como playlists que executam som de ar condicionado, jazz para gatos ou ruídos para bebês dormirem.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.

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