Tendo despontado ao estrelato há 50 anos, grupo formado por dois casais suecos viveu altos e baixos
O ABBA surgiu na Suécia, conquistou o mundo, emplacou uma porção de hits que se tornaram indispensáveis, desde eventos de família até pistas de dança de todos o mundo, e ainda caiu nas graças dos produtores de cinema. Uma trajetória que colocou a Suécia no mapa do pop mundial.
E os monarcas do país assinam embaixo. Tanto que, no último 31 de maio, o grupo recebeu dos reis Gustaf e Silvia a medalha da Ordem Real de Vasa, celebrando os 50 anos desde que despontou para o sucesso mundial. O rei e a rainha são fãs confessos. Dá até para dizer que o ABBA é uma espécie de padrinho musical do casal.
Afinal, em 18 de junho de 1976, há 48 anos, o grupo se apresentou pela primeira vez em um baile no palácio real, a convite de Gustaf e sua noiva, a futura rainha Silvia. O quarteto conquistou definitivamente o coração dos dois, cantando pela primeira vez uma música que faria gigantesco sucesso mundo afora, Dancing Queen, cujo título pode ser traduzido como “a rainha das pistas de dança”.
Os versos de Dancing Queen contam a história de uma garota de 17 anos que procura, aos sábados, a melhor pista de dança da cidade para “reinar”, com passos cativantes e presença inesquecível. Uma tremenda homenagem para a mulher cujo destino era ser a próxima rainha de seu país.
Ooh, see that girl, watch that scene, digging the dancing queen
50 anos de história
O affair real envolvendo o ABBA veio depois que o mundo se apaixonou pela banda, em 1974. A dupla de casais suecos Agnetha Fältskog, Björn Ulvaeus, Benny Andersson e Anni-Frid Lyngstad cavou um espaço indelével na história da música pop mundial, e no imaginário de toda uma geração, quando apareceu para o mundo lançando seu primeiro álbum internacional, Waterloo. Antes disso, o ABBA já havia gravado um disco anterior, Ring Ring (1973), mas ele teve lançamento local e repercussão apenas em em seu país natal.
Waterloo é um disco ainda da fase pré-disco music do ABBA. Os quatro não haviam empunhado suas picaretas e encontrado a mina de ouro do gênero musical que os enfiou nas pistas de dança, nas “festas da firma”, nos casamentos e nos karaokês para o resto da eternidade. Estavam se preparando para compor e lançar sucessos como Mamma Mia, Dancing Queen, Fernando, Take A Chance On Me e muitos outros hits bailantes. Ensinando ao planeta, ao lado dos Bee Gees, que branco também podia fazer disco.
O Eurovision como plataforma de lançamento
A pedra do estilingue que lançou o ABBA para fora da Suécia foi a faixa-título do álbum, vencedora do concurso Eurovision em 1974. A Europa conheceu pela TV dois casais fazendo pop cativante e docinho. O disco foi distribuído para todos os cantos: Alemanha, Inglaterra, França, Austrália, África do Sul… Todo mundo abraçando a novidade e levando a música ao primeiro lugar em suas paradas locais.
O quarteto nunca foi, no sentido mais estrito, uma banda de disco music, apesar de estar sempre sendo relacionado a este cenário. Seus discos trazem baladas, rock bubblegum e muitas referências ao soul de girl groups como The Ronettes e The Shangri-Las. Mas foram mestres juntando todas essas referências com música dançante, de pista, fórmula que descobriram a partir do álbum seguinte, chamado simplesmente de ABBA e lançado em 1975. A faixa de abertura era nada menos do que Mamma Mia, um dos mais estrondosos sucessos de sua carreira.
A partir dali, não teve para nenhum outro sueco no mundo da música. O grupo conquistou os Estados Unidos, enfileirou um hit atrás do outro (tanto que são muito mais conhecidos graças às suas coletâneas, tipo Greatest Hits) e reinou até 1982, quando, com os dois casais já divorciados, anunciou seu fim.
Altos e baixos, maus pedaços e boas histórias
Depois da separação, o ABBA foi sendo esquecido no mundo pop e virando influência para muita gente. Waterloo é incrivelmente parecida com Call Me, da Blondie, por exemplo. Todo os roqueiros que se enveredavam pela disco music (e não foram poucos) têm um pouco dos suecos no meio da receita.
Principal executivo da banda, o fundador Björn Ulvaeus cuidou para que outras coletâneas fossem sendo lançadas constantemente, mas aos poucos o grupo foi caindo no esquecimento pelo público, reforçado pelo ranço que a superexposição da disco causou no mundo, na década de 80. Curiosamente, coube à classe artística a tarefa de cuidar para que eles jamais fossem esquecidos.
Dez anos depois do final do ABBA, em 1992, o duo de synth-pop Erasure lançou o EP Abba-Esque, só com covers da banda, fazendo com que uma nova geração revisitasse o trabalho do grupo sueco. No mesmo ano, os irlandeses do U2 chamaram Ulvaeus e Andersson para o palco durante um show em Estocolmo, para tocarem juntos a música Dancing Queen. As homenagens renderam. A canção voltou, no mesmo ano, ao Top 20 das paradas inglesas.
A nova onda de atenção ao ABBA foi completada pela inclusão das músicas do grupo na trilha sonora dos filmes Priscilla, a Rainha do Deserto e O Casamento de Muriel, em 1993. Daí para a frente, meu amigo, ninguém mais segurava a volta do grupo. Sua coletânea ABBA Gold vendeu mais de 20 milhões de cópias.
E então, Deus botou Madonna para salvar o ABBA
Tudo indica que, nas festas celebradas no paraíso celestial, os anjos DJs tocam vários hits do ABBA para os consagrados bailarem. Afinal, só mesmo a providência divina podem explicar a forma como Björn Ulvaeus se safou de uma tremenda cilada, aos 45 do segundo tempo.
Em 2005, o músico foi condenado pelo governo sueco por evasão fiscal e multado em mais de 12 milhões de dólares. Se não pagasse a conta, a história poderia render até mesmo cadeia. Björn estava desesperado. De onde tirar aquela montanha de dinheiro? Foi então, do nada, que o músico viu bater à sua porta um emissário da Madonna, com um disco da cantora nas mãos e uma carta. A diva estava implorando para que o grupo liberasse a utilização de partes da canção Gimme! Gimme! Gimme! (A Man After Midnight) para serem usadas em um novo single, Hung Up.
Ulvaeus e Andersson eram conhecidos por jamais autorizar algo do tipo. A única exceção havia sido para o grupo de rap The Fugees, que conseguiu em 1996 a liberação para usar pedaços de The Name of the Game na faixa Rumble in the Jungle.
Nem Madonna sabia do desespero financeiro de Björn, e nem o ABBA sabia do interesse de Madonna. No clássico exemplo de “juntar a fome com a vontade de comer”, ambos disseram “sim”, e Hung Up fez um estrondoso sucesso, permitindo que o músico pagasse suas dívidas com o goveno e seguisse sua vida.
Cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça. Depois do susto que passou, Ulvaeus resolveu cuidar melhor do legado do ABBA, transformando-o em um tremendo negócio, que inclui desde bandas covers oficiais autorizadas por ele, até shows holográficos e musicais. Mamma Mia, que começou na Brodway e depois foi para o cinema estrelado por Meryl Streep e Pierce Brosnan, foi lançado em 2008, com grande sucesso.
De volta ao seu merecido posto da música, Ulvaels e Andersson agora trabalham para que o ABBA nunca mais deixe de ser relevante na condição de patrimônio cultural da música de pista. Pelo jeito, o rei e a rainha da Suécia estão com eles nesta briga.