O mês de março encerrou com um acontecimento triste para os fãs de música, da clássica até o hip hop. Anunciada no domingo (2), a morte do músico, compositor, arranjador e ator japonês Ryuichi Sakamoto se deu de fato no dia 28 de março. Ele se tornou amplamente conhecido por seu trabalho inovador tanto em música eletrônica quanto clássica e por suas contribuições para o mundo da trilha sonora.
Sakamoto lutava contra um câncer havia vários anos e a notícia de sua morte foi recebida com muita tristeza e homenagens de fãs e colegas de todo o mundo.
Nascido em Tóquio em 1952, Sakamoto começou sua carreira musical como membro da influente banda eletrônica japonesa Yellow Magic Orchestra no final dos anos 1970. Ele passou a ter uma carreira solo de sucesso, lançando vários álbuns que misturavam elementos da música eletrônica, clássica e mundial. Sakamoto também foi um prolífico compositor de filmes, e seu trabalho em obras como O Último Imperador e Feliz Natal, Sr. Lawrence rendeu a ele aclamação da crítica e inúmeros prêmios, incluindo um Oscar, um Globo de Ouro e um Grammy.
Sakamoto não era apenas um músico talentoso, mas também um ativista e filantropo dedicado. Ele foi um defensor de causas ambientais e trabalhou para promover a paz e o entendimento entre as culturas. Em 2011, ele foi diagnosticado com câncer na garganta, mas continuou a se apresentar e criar música durante todo o tratamento e recuperação.
Sakamoto fala sobre o improviso em seu trabalho
Sua morte deixou um vazio gigante no mundo da música e da cultura. “Ryuichi Sakamoto foi um precursor especialmente criativo da música eletrônica e um artista com um talento raro pra fundir gêneros musicais, tanto com a Yellow Magic Orchestra como com inúmeros projetos solo e trilhas sonoras. Sakamoto transitou por synthpop, disco, música asiática, música de videogame, city pop japonês, bossa nova, jazz e ambient, e mais, sempre com habilidade”, diz o jornalista, DJ e pesquisador musical Camilo Rocha.
Um dos maiores legados do trabalho de Ryuichi Sakamoto foi absorvido pela cultura hip hop. Uma de suas faixas mais famosas, Riot in Lagos, lançada em 1980 como parte de seu trabalho com a Yellow Magic Orchestra, foi sampleada por artistas de hip hop como Afrika Bambaataa, Grandmaster Flash e Public Enemy. O uso da faixa de batidas eletrônicas e linhas de baixo pesadas a tornou uma das favoritas entre os primeiros DJs e produtores de hip hop, que a viam como uma precursora do futuro do gênero.
A influência de Sakamoto continuou na década de 1990, com sua música sendo sampleada por artistas como Jay-Z, Nas e Kanye West. A importância de Sakamoto para o hip hop reside não apenas em sua música, mas também em seu espírito pioneiro e vontade de experimentar novos sons e gêneros. Seu trabalho ajudou a quebrar barreiras entre diferentes estilos de música e abriu caminho para artistas de hip hop explorarem novos territórios sonoros.
Sakamoto também emprestou seu talento à música pop, em colaborações com artistas como David Bowie, Laurie Anderson, Robert Wyatt, Iggy Pop, Brian Wilson, além dos brasileiros Marisa Monte e Jaques Morelenbaum.
A ORQUESTRA MÁGICA AMARELA
Yellow Magic Orchestra, ou YMO, foi uma banda pioneira de música eletrônica formada em Tóquio em 1978, formada por Ryuichi Sakamoto, Haruomi Hosono e Yukihiro Takahashi. O som da banda era uma mistura única de música eletrônica, pop e música tradicional japonesa, tornando-a uma das mais inovadoras e influentes de seu tempo.
O álbum de estreia do YMO, Yellow Magic Orchestra, foi um sucesso comercial e de crítica no Japão e ajudou a apresentar a música do país a um público global. O álbum trazia o hit Computer Game, que se tornou um marco do hip hop e da música eletrônica devido à sua melodia cativante e ao uso de sons de videogame.
A banda lançou vários álbuns ao longo da década de 1980, incluindo Solid State Survivor e Technodelic, que ajudaram a consolidar seu status como uma das bandas de música eletrônica mais influentes de todos os tempos. Sua influência se estendeu além da música, já que seu estilo e senso de moda ajudaram a definir a aparência e o som da época.
Nos últimos anos, Sakamoto ressurgiu com vigor renovado. Seu álbum de 2017, Async, pinta um retrato em áudio da passagem do tempo, gatilho acionado por sua recuperação de um câncer na garganta. Num documentário lançado no mesmo ano, Ryuichi Sakamoto: Coda, dirigido por Stephen Nomura Schible, ele viaja para o Ártico para gravar o som da neve derretida. Em outra cena, ele toca um piano “afogado” que foi encontrado na Prefeitura de Miyagi durante o os resgates do terremoto de 2011, que desencadeou um desastre nuclear em Fukushima, no Japão. “Nós, humanos, dizemos que [o piano] fica desafinado”, diz Sakamoto em Coda. “Mas isso não é exatamente preciso. A matéria está lutando para retornar ao estado natural.”
R.I.P., gênio.