Gilberto Gil e Chico Buarque Foto: Reprodução

Plágio? Entenda a treta entre Chico Buarque, Gilberto Gil e a ex-baixista do Pixies

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Novo single da argentina Paz Lenchantin é praticamente idêntico a Cálice, um dos maiores sucessos de Chico e Gil

Uma nova indignação sobre plágio veio à tona. Envolve Argentina x Brasil, e nem todo o pano disponível no mundo seria suficiente para passar em Paz Lenchantin, baixista argentina que tocou nos Pixies entre 2021 e 2024 e agora se lança em carreira solo. Para o single Hang Tough, a artista teve a manha de copiar absolutamente todas as melodias e acordes, tanto nos versos quanto no refrão, de Cálice, composta por Chico Buarque e Gilberto Gil em 1973. A única “criação” de Lenchantin foi arrancar a letra pesadíssima da dupla, feita durante a censura dos Anos de Chumbo, e escrever uma nova, sobre as dores da separação amorosa.

Tão logo o single foi lançado na última semana, um aperitivo para seu novo álbum, os advogados de Chico Buarque e Gilberto Gil se ouriçaram feito porco-espinho. No momento, uma notificação foi enviada pedindo um acordo, antes do processo ser efetivamente protocolado. Lenchantin não se pronunciou até agora, mesmo com a avalanche de brasileiros inundando a caixa de comentários do videoclipe oficial da artista com comentários como “depois dos Pixies, hora de fazer um pix para Chico e Gil, minha filha!”; ou “gringos amam a música brasileira, só não gostam de dar os créditos”.

Até Kiko Loureiro, guitarrista da banda Angra, deixou sua bronca lá: “roube como um artista, não como um ladrão!”.

Tem desculpa?

Uma escala de piano tem sete teclas brancas e cinco pretas. Ali, toscamente falando, estão todas as notas musicais do mundo. Combinadas, podem compor acordes e melodias com milhões de possibilidades, sem descontar as que soam horríveis ao ouvido comum. Ainda assim, as possibilidades de construção de uma canção são infinitamente menores do que as bilhões de músicas já escritas na história da humanidade. Tudo, portanto, já foi feito, e é claro que se pode encontrar muitas canções bastante parecidas.

Além dessa limitação, existe aquilo que George Harrison sentiu na pele, chamado pelo juiz da corte de “plágio inconsciente” em 1976, quando os autores da canção He’s So Fine, gravada pelo grupo The Chiffons, o processaram por tê-la copiado em seu superhit My Sweet Lord.

O termo colou, a ponto de outro rockstar pego nas calças curtas, Rod Stewart, tê-lo usado em sua autobiografia para falar de outra famosa treta legal: nosso Jorge Ben o acusou de plágio quando viu que o refrão de Da Ya Think I’m Sexy? era idêntico ao de Taj Mahal.

Conhecido por ser da turma dos malucos gente boa da música, Stewart reconheceu a semelhança publicamente, explicou que já havia visitado o Rio de Janeiro e portanto seria muito possível que estivesse escutado a música de Ben, que ficou esquecida nas gavetas da memória. A solução foi proposta pelo próprio rockstar inglês: transferiu os royalties da canção para a UNICEF, e Jorge Ben retirou o processo. Todo mundo amigo.

Será que Paz Lenchantin vai meter essa?

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.