Kim Sisters Kim Sisters – foto: reprodução Youtube

Vovós do K-Pop. Conheça as Kim Sisters, grupo feminino de multi instrumentistas coreanas que foi febre nos anos 60

Jota Wagner
Por Jota Wagner

As Kim Sisters são as matriarcas da expansão do pop coreano (hoje chamado de K-pop) pelos Estados Unidos. As três cantoras viraram febre no mercado americano misturando soul  e música popular asiática.

As Kim Sisters, primeiras artistas asiáticas a fazer (um tremendo) sucesso nos Estados Unidos, alavancaram sua carreira graças àquilo que hoje chamamos de “tempestade perfeita”.  Ventos de talento, apoio familiar, bom serviço prestado à propaganda de guerra e perseverança se encontraram para bagunçar os acampamentos militares americanos na Coreia do Sul no final da década de 50.  E criaram a estratégia para a febre do K-Pop!

Filhas de uma célebre cantora local chamada Lee Nan-Young, as irmãs Sue (Sook-ja), Ai-ja, 8 e a prima Mia (Min-ja) começaram a ser treinadas pela mãe antes dos 10 anos de idades.  Com sete filhos e passando severas dificuldades na Coreia assolada pela guerra, Nan-Young teve a ideia de colocar os filhos para tocar músicas americanas nos acampamentos militares. O pagamento era feito com uísque e caixas de cerveja que eram trocadas por arroz e outros mantimentos no mercado negro.

kim sisters com ed sullivan

Kim Sisters com Ed Sullivan – foto: reprodução Youtube

Os quatro elementos do K-pop. Primeiro: faça direito

Eis o primeiro dos elementos presentes na cartilha dos produtores dos fenômenos K-Pop, utilizados de forma pioneira pela família de Na-Young. O perfeccionismo.  As três irmãs tocavam dezenas de musicais diferentes. Somente Sue tocava 13.  Oboé, saxofone, xilofone, bateria, baixo, guitarra e vários do folclore tradicional asiático.

Não bastasse a habilidade capaz de fazer Prince descer do salto, as Kim Sisters ainda cantavam com precisão harmônica de ritmos vocais como doowoop e barbershop , além de dançar e mandar  no palco com um sorridente carisma.  O grupo foi apresentado por militares que estavam na Coréia a um produtor de Las Vegas, que as transformou em sucesso internacional.

Segundo elemento: conquiste o ocidente

As garotas causaram no telespectador americano o mesmo frisson que rolou nas bases militares na Coréia.  As Kim Sisters assinaram um contrato de 21 apresentações no Ed Sullivan Show, o mais importante lançador de sucessos musicais da época nos Estados Unidos e não foi só isso.  Se apresentaram com Dean Martin, foram estrelas de filmes e shows musicais. As Kim Sisters representavam a imagem amistosa, talentosa e carismática dos aliados americanos da Coreia do sul, em plena ascensão da guerra fria. E isso nos leva ao terceiro elemento do feitiço.

kim sisters tocando

foto: reprodução youtube

Terceiro elemento: uma forcinha do governo

Em junho de 1950, a Coréia do Norte (alinhada com a União Soviética) invadiu pela primeira vez a rival sulista atravessando o Paralelo 38, que divide os dois países. Um mês mais tarde, os Estados Unidos entraram na guerra lutando com a Coreia do Sul e assumindo definitivamente a rivalidade com os soviéticos.

Assim como em guerras posteriores, como a do Vietnam por exemplo, o assunto era delicado. Porque rapazes americanos estavam sendo enviados para lutar em um país minúsculo do outro lado do mundo?

Para defender simpáticas garotas como as Kim Sisters das “criaturas do mal”.

A casa em que as irmã moravam foi incendiada pelo exército do norte. Mudaram-se para outro lugar, dividindo o espaço em  22 familiares. A ida para Las Vegas (eram artistas residentes dos hotéis Thunderbird e Stardust) e o rápido sucesso não tiveram a responsabilidade do governo americano, mas a ascenção das estrelas caiu como uma luva para a propaganda de guerra e a partir de então nenhum obstáculo poderia ser colocado no caminho das Kim Sisters. Elas eram imprescindíveis. E todo o show business sabia disso.

Desde que a crise econômica do final da década de 90 assolou o mundo,  a Coréia do Sul adotou uma postura clara e ininterrupta de apoiar artistas que exportassem a cultura nacional, trazendo ao país o mesmo carinho e simpatia que fizeram as Kim Sisters.  Leis que protegem seus direitos autorais em karaokês e a possibilidade de artistas consagrados adiaram o serviço militar obrigatório para depois dos 30 anos são apenas alguns dos inúmeros privilégios que os artistas e as empresas de entretenimento por trás deles têm. A guerra, desta vez, era econômica.

Quarto elemento: fique longe das polêmicas.

Música de protesto, nem pensar. Assim como fazem os integrantes dos supergrupos de K-pop atuais, o ativismo rola dentro do que é quase unânime como a proteção aos animais e ao meio ambiente.  O músico coreano com carreira internacional tem a profunda consciência de que ele é o representante da imagem do seu povo. Não há espaço para individualismos. As Kim Sisters levaram este comportamento à risca e seu código de conduta se repete até hoje. Mas, mesmo assim, não escaparam do fundamentalismo.

Quando as irmãs chegaram aos Estados Unidos,  sabiam do idioma inglês nada mais do que as letras das músicas que cantavam nas bases militares.  O rise and fall das Kim Sisters compreendeu o tempo entre 1960 e 1975 quando o presidente Park Chung-Hee encampou uma “purificação da música popular coreana” basicamente atacando a influência estrangeira, como por exemplo o finérrimo soul que as meninas colocavam em sua música. A viagem conservadora errática, no entanto, foi revisto na virada dos 00 e, vinte anos depois, a música coreana dominou o mundo.

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Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.

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