Você vai ouvir falar muito de Serge Erege e seu “synth sofrência”
Há uma frase do comediante e multiartista Eddie Cantor que resume bem muitas carreiras. “Levei 20 anos pra fazer sucesso da noite pro dia”. Serge Erege demorou menos. Ele saiu do Piauí há quatro anos e o clipe de Rhythm of the Day, dirigido por Rudá Cabral, com referências de Alejando Jodorowsky e Vincent Moon, zerou o jogo dos artistas novos e o empurrou para a fase seguinte.
Cata aqui esse esculacho que é Rhythm of The Day
Nascido em Piripiri, ele é prova viva de como a informação circula hoje. “Continuo o mesmo menino que gravava mixtapes das rádios pra depois poder ouvir as músicas que eu gostava no meu walkman no quintal de casa e ficar cantarolando junto debaixo de um pé de tamarindo enquanto meus pais dormiam”, conta o rapaz de 29 anos.
A beleza dura de São Paulo, seu ritmo frenético, seu gigantismo, seus sonhos de riqueza, seus fantasmas, não o deslumbram. “Eu já fazia esse som lá, comecei a compor por volta de 2009. A base de Rhythm of the Day, por exemplo, eu fiz enquanto estava no Piauí, há uns quatro anos. Talvez tenha impactado mais nas minhas letras, com a chegada de novas perspectivas. Antes minhas músicas eram mais sonhadoras, agora são mais realistas”, compara.
Ele também dá algumas pistas sobre o processo de composição. “Nem sempre é o mesmo. Às vezes, vem a letra na cabeça e que puxa a melodia, às vezes, vem uma estrofe. No caso dessa música, veio primeiro a melodia, produzi todo o instrumental e depois criei uma letra, que na verdade era completamente diferente. Ela se chamava We Fall e falava sobre algumas frustrações de morar em uma cidade pequena”, bate a fita Serge.
“Aí essa base ficou guardada, e quando a ouvi novamente percebi que a letra não fazia mais sentido. Fui cantarolando e criei outra letra mais simples. Ela fala de processos, paciência, dedicação e desapego”, completa.
Ele nos conta também como é seu set-up no home studio e no palco. “Costumo compor as minhas músicas na guitarra e no teclado e ao vivo estou usando o teclado também, mas com foco na minha voz, que é meu principal instrumento. No palco, uso o teclado pra fazer umas brisas junto com as minhas bases”, exemplifica.
Frequentemente, as pessoas acham que Serge é gringo. “Deve ser porque canto em inglês e faço um som que não é tão assim brasileiro, apesar de termos várias bandas legais do meu gênero. Mas acho divertido, devo estar fazendo algo direito”, brinca.
Já o nome artístico seria uma forma de desvirtuar sagrado e profano, como indicam as referências a Jodorowsky e Moon? “Na verdade, o nome Serge Erege é só porque gosto de nomes que rimam, tirei o H só para não ter obrigação de ser herético e para virar um sobrenome artístico”, explica, confundindo. “Mas sim, adoro heresias, gosto de brincar com o que é sagrado e com coisas que as pessoas levam a sério demais”, pontua.
Entre os nomes que Serge mais gosta e indica da nova música brasileira, ele aponta a “diva e parceira” Érica Alves, o “mestre e parceiro” Pedro Zopelar e Anvil FX.
Synth Sofrência com Érica Alves e Serge Erege
O cara também se revela bastante detalhista em relação ao clipe. “A criação do conceito foi praticamente toda do Rudá, a não ser a paleta de cores que eu selecionei. A estética VHS também foi uma escolha minha. Eu quis incluir algo mais sujo”, resume.
Como o papo resvalou na sétima arte, manancial inesgotável para música mais viajante e conceitual, perguntamos pra Serge também qual foi o último filme que viu e como se dá a assimilação dessas influências. “La Frontière de L’aube, do Philippe Garrel. As coisas não me influenciam de.maneira tão direta, talvez elas fiquem no meu inconsciente e saiam de uma maneira que não sei bem qual é”, dá a fita.
Ponta de uma nova onda sintética mundial, com ramificações tentaculares, ele situa o novo synthpop nos subterrâneos. “Não sei se um movimento, mas já temos vários artistas bons fazendo esse tipo de som. Acho que é um som mais underground, mesmo dentro da cena eletrônica independente. Esse tipo de música acaba sendo mais outsider por não ser simplesmente dançante, é feito para uma pista diferente”, constata.
Mas, ao falar sobre o que pode adiantar sobre o disco que irá lançar em 2016 pela Skol Music, ele acaba entregando a rapadura: “Muito synth sofrência, ecos do além e assobios de ventos distantes”. Se você não se apaixonar por Serge Erege à primeira vista, à segunda será inevitável.