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Em novo doc, Noam Chomsky e Celso Amorim analisam cem anos de manipulação política

Utopia Tropical

Foto: Reprodução/Internet

Dirigido por João Amorim, Utopia Tropical foi lançado no último dia 07, no Festival do Rio 2023

Atenção: alerta de spoilers para quem tem acompanhado as notícias e a história só pela grande mídia.

Noam Chomsky é uma das vozes mais contundentes contra a opressão dos EUA no cenário global desde os anos 1960. Um ancestral de Julian Assange, Aaron Swartz e Edward Snowden com seu livro Manufacturing Consent. Celso Amorim é um diplomata brasileiro que já foi embaixador e ministro das relações exteriores do Brasil por mais de 50 anos, com uma posição assumidamente progressista.

No novo documentário de João Amorim, Utopia Tropical – A História não se Repete, mas às vezes rima, o diretor organizou entrevistas que analisam um século da estratégia destrutiva do capitalismo e das potências econômicas sobre o seu quintal das Américas. O filme foi lançado no Festival do Rio 2023, no último dia 07.

Um fato tem sempre uma história que se desdobra como um fractal, um zoom-in até onde puderem chegar os nossos registros. A situação atual da América Latina tem um roteiro que vai em marcha-à-ré da ascensão da extrema-direita no cenário político mundial, remete ao impeachment de Dilma Rousseff, à crise dos sub-primes, à Guerra ao Terror dos anos 1990, ao governo Reagan, aos golpes patrocinados em repúblicas da América Latina, à crise do petróleo dos anos 1970, ao assassinato de JFK, à Segunda Guerra, Grande Depressão de 1929, à Revolução Industrial e à colonização britânica.

O filme cria um panorama resumido e surpreendente para quem nunca tinha ligado os pontos ou sequer sabia que esses pontos existiam. “Utopia Tropical vai além da América Latina. Explora temas que ressoam em todo o mundo, incluindo economia, paz, desigualdade, mudanças climáticas, pandemia. O documentário transcende fronteiras geográficas, oferecendo perspectivas que ecoam globalmente”, comenta o diretor.

Desde a Grande Depressão, quando as famílias não tinham renda, os sindicatos eram ativos e pelo menos havia esperança. Havia partidos políticos, escritórios anarquistas e muita cultura. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Inglaterra se tornou uma assistente dos EUA e a hegemonia precisou de uma estratégia que eliminou acordos de desenvolvimento na região. Um Secretário da Guerra dos EUA chamava a América Latina de “our little region over here” (“nossa pequena região ali”).

Em um mosaico sócio-econômico, Chomsky e Amorim explicam as flutuações e mutações da política econômica externa dos EUA para a América Latina. Primeiro, uma questão estratégica e política, que ao longo dos anos 1950 até 1970 servia para contrapor estrategicamente o inimigo na Guerra Fria.

A questão geográfica deixou de ter importância quando, nos anos 1970, com elementos como Guerra do Vietnã, Richard Nixon e a crise do petróleo, as cartas mudaram de mão. Os democratas dos EUA deixaram de representar a classe trabalhadora para serem representados por jovens de carreiras corporativas bem-sucedidas. Com a desregulação da economia, abriu-se uma avenida que transformou a política global em interesses capitalistas. A desregulação teve um efeito bizarro e imediato, forçando os governos a saldar as dívidas de bancos, empresas e outras instituições financeiras. Antes, não haviam crises. Hoje, elas são corriqueiras.

De uma maneira ou de outra, a instrumentalização da América Latina no tabuleiro internacional sempre acarretou perdas à sua população. Quando há uma luz de esperança, forças internas e externas se movem para retroceder as conquistas sociais e econômicas. A utopia tropical, portanto, permanece sendo um plano impossível de ser consumado.

A guerra híbrida de hoje não conta com armas e bombas, mas com o controle das federações nacionais, do empresariado, da mídia e das redes sociais. Desde a depressão até a “década de ouro” (2003-2013) dos países mais pobres, chegamos ao cenário atual: nada de melhora nas condições de vida da população ou distribuição de riquezas.

Ficha técnica:

Direção: João Amorim

Roteiro: João Paulo Reys e João Amorim

Argumento: João Amorim e Rafaela Camelo

Elenco: Noam Chomsky e Celso Amorim

Direção de Animação: César Coelho

 

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