Lollapalooza Brasil 2025 Foto: Ariel Martini/Divulgação

Edição 2025 foi a menos ‘hétero top’ da história do Lollapalooza Brasil

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Festival teve menos gente e menos nomões do que costumava ter — e isso não é necessariamente ruim

Com menor público em relação aos anos anteriores, com menos gente sapecolando pelos palcos, correndo atrás de brindes nas ativações e espalhados pelos gigantescos espaços a céu aberto do Autódromo de Interlagos, teria o Lollapalooza Brasil 2025 flopado? Ou será que, passado o estouro da bolha dos festivais, o Lolla foi do tamanho que deveria ser? Lembrando que ainda estamos falando de um rolê com 70 atrações, quatro palcos e 240 mil pessoas distribuídas em três dias, no último final de semana paulistano.

Lollapalooza Brasil 2025

Foto: Ariel Martini/Divulgação

Esse foi o primeiro tema da acalorada discussão que envolveu a charmosa nata da intelectualidade festivaleira, conhecida como redação do Music Non Stop, em completa ressaca física após as andanças implacáveis que um festival como esse demanda. Passeios pelos quatro palcos, pelo curvilíneo espaço entre eles, cheios de barracas de alimentação, bastidores da produção que o público não vê, sala de imprensa lotada de colegas ávidos por novidades, snacks, macarrão e wi-fi, stands de expositores e, aqui e acolá, lagoas de lama formadas pela única intempérie do rolê, na sexta-feira, responsável por parar a festa por 40 minutos graças aos novos protocolos de segurança para tempestades.

Mas o saldo final, passadas as necessárias oito horas de sono horizontal para recuperar os músculos (inclusive os tenares, hipotenares e lumbricais), é de que o Lollapalooza Brasil 2025 foi um festival bastante delicioso. Mais limpo, mais circulável — embora a odisseia para ir e voltar siga a mesma, uma vez que apenas para sair do festival e chegar ao trem leva-se uma hora de caminhada —, mais organizado e diverso. E não é só o número de pessoas que levaram o rolê a valer a pena. Além do clima, saudável para uma aglomeração tamanha, a curadoria, responsável pela programação, ajudou a virar a chave do frequentador. Como notou nosso editor-chefe, Flávio Lerner, foi o Lollapalooza menos “hétero top” de todos no Brasil. E gente… isso faz a diferença.

Não se trata de falar sobre vermos mais mulheres ou homens, mais pretos ou brancos ou mais pobres ou ricos, até porque o Lolla segue sendo um festival classe média para cima, dados os preços dos ingressos. É sobre ver, pelas tarde do rolê, grupos de amigos diversos, espalhados em suas cangas em mood de piquenique. Sobre os postos médicos praticamente vazios todas as vezes em que passamos por eles. Muito menos cosplays de festivaleiros e mais gente como andam na rua, dançando e curtindo o show com um nível de educação inebriante para um festival deste porte.

Lollapalooza Brasil 2025

Marina Lima no Lollapalooza Brasil 2025. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Aí não tem como fugir, entra a questão de um protagonismo feminino no evento. Dentre os headliners, estavam Olivia Rodrigo, Marina Lima e Alanis Morissette, acompanhadas de Justin Timberlake. No palco eletrônico, o grande nome, responsável pela fechamento do festival, foi a belga Charlotte de Witte. Não foram as únicas, tinha muita garota na frente de bandas, e isso ajudou a moldar um mingau que derramou na plateia de todos outros artistas, como os que assistiram ao Sepultura, por exemplo.

Seja por motivos econômicos (as atrações estão cada vez mais caras, e o público, cada vez mais endividado) ou uma aposta de tendência, o Lollapalooza Brasil 2025 gastou o grosso de sua grade de apresentações em artistas do midstream, termo usado para encaixotar quem já saiu do independente, mas não transita na sala VIP do pop, com cachês e demandas de estrutura de palco milionárias.

Em edições passadas, jamais imaginaríamos ver nomes como os argentinos grooventos Ca7riel & Paco Amoroso, sensação do Tiny Desk e agora queridinho dos brasileiros, tamanha competência; Neil Frances, indietrônico de primeira linha; além de Parcels, Barry Can’t Swim e The Marías. Quem diria então da sensação punk Charlotte Matou Um Cara, a ótima Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, e até mesmo os grandes reis do metal extremo, Sepultura? Pois rolou. E foi bem.

Lollapalooza Brasil 2025

Ca7riel & Paco Amoroso no Lollapalooza Brasil 2025. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Claro que o festival não poderia se esquecer do popão, aquele que até sua tia de Monte Alegre conhece. Ou, no caso de Olivia Rodrigo, sua sobrinha de nove anos. A cantora foi a sensação de sexta-feira, reunindo uma multidão de adolescentes apaixonados. Só não foi prazeroso para Luke Steele, do Empire of the Sun, show anterior ao de Rodrigo no mesmo palco. Sem se tocar que a meninada no front estava ali esperando o show de Olivia, desceu no meio do público e esticou o microfone para o povo cantar junto a sua música. Só que ninguém sabia a letra, Rodriguenses que eram.

Uma multidão (entre fãs originais e filhos de fãs originais) assistiu emocionada ao show de Alanis Morissette, que espertamente deixou seus gigantescos superhits dos anos 90 para o grande final. Uma apresentação de festival, épica, que ficará na memória de muita gente. “Sabe a Alanis em 25? Eu estava lá, já te contei?”. Antes da canadense, Marina Lima recebeu o carinho que merecia, com energia e voz recuperada, de um público muito maior do que a gente esperava. A prova de que o frequentador do Lolla mudou este ano.

Teddy Swims, Shawn Mendes e RÜFÜS DU SOL também foram destaque por performances muito bem-recebidas pelo público. Sepultura foi perfeito em competência, mas viu se perder ali, na sua frente, o brilho de um show que seria o último de sua carreira, no Brasil. Muita gente não quis pagar 500 pilas para ver apenas uma banda, a que admiravam, e o restante do público-alvo do Lollapalooza, com exceções, claro, preferiu outros palcos a se despedir do grupo que é um orgulho brasileiro. Tanto que há rumores de um novo show de despedida por aqui.

Teddy Swims no Lollapalooza Brasil 2025

Teddy Swims no Lollapalooza Brasil 2025. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Ao final do festival, faltando apenas os shows principais do domingo, entro na sala de imprensa e vejo grupos de colegas comemorando, com palmas e abraços, a missão cumprida. Descendo a escada, decido, a caminho do show do Sepultura, ir pela “rua de trás”, a área de serviço que passa por trás das lanchonetes, banheiros e postos médicos. São vias de alimentação logística do festival, onde milhares caminham feito formigas, batem cartão, trazem suprimentos e levam lixo para que você se emocione em um festival de música, muitas vezes olhando apenas para quem está em cima do palco.

Com a felicidade gostosa de quem está prestes a receber o pagamento, atendentes de bar em folga comentam das selfies que conseguiram com celebridades durante os dias de festa. Tias da limpeza correm para fechar o que falta de sacos de lixo porque querem “correr para ver o Justin” — em show que ainda teve paramédicos pedindo para trocar de posição para poder curtir um restinho de festival. E uma multidão de técnicos e ajudantes prontos para desmontar a gigantesca estrutura do circo, tão logo as 80 mil pessoas voltassem para casa. De longe, o melhor show. O melhor momento do Lollapalooza Brasil 2025. E a toda esta turma, um saudoso obrigado.

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Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.