Beatles Foto: Reprodução

O Big Bang dos Beatles. Há sessenta anos, Love Me Do, primeiro single da banda, era lançado

Claudio Dirani
Por Claudio Dirani

“Love Me Do” foi lançada em 5 de outubro de 1962 no Reino Unido. Saiba por que a música ainda provoca fortes emoções

A primeira performance do primeiro single dos Beatles, “Love Me Do”, que completa 60 anos neste 5 de outubro, não foi bem recebida. Ao menos, por um dos mais carismáticos membros da família de John Lennon.  Mary Elizabeth “Mimi” Smith – a Tia Mimi – não mediu palavras ao ouvir a demo da música composta pelo sobrinho ao lado de Paul McCartney.

“Se você acha que vai fazer uma fortuna com isso, você pode tirar o cavalinho da chuva”, confessou a enfermeira, então com 52 anos.

Pode se afirmar que a chegada de “Love Me Do” às emissoras de rádio britânicas há exatas seis décadas não foi das mais avassaladoras. Porém, ainda que começo tímido dos Beatles não inspirasse tanta confiança, a previsão pessimista de Mimi jamais se confirmaria. Justamente o oposto.

Em verdade, tanto John Lennon como Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr ficaram atônitos ao ouvir o disco de estreia do quarteto de Liverpool fazer sua estreia nas rádios. Foi como sonhar acordado.

Com sua letra até simplória – e inspirada em parte sobre a namorada de McCartney, Iris Caldwell – a composição iniciada na casa de Paul em 1958 nas dependências de Forthlin Road, e finalizada com ajuda de Lennon em sua residência, em Menlove Avenue, chegou aos ouvidos dos ingleses pelas ondas da rádio Luxembourg, em uma sombria manhã de sexta-feira, em outubro de 1962.

“Me lembro de gritar ao ouvir (Love Me Do) ela primeira vez: Uau! Está no ar!”, relembrou George Harrison em 1964. “Quando a música começou tocar, me arrepiei inteiro”, declarou o guitarrista ainda com apenas 21 anos.

No dia seguinte, logo após o desembarque de “Love Me Do” nas melhores casas do ramo, acompanhada no lado B por “P.S. I Love You”, os Beatles dobraram o esforço em prol de seu primogênito. Para ajudar na promoção do vinil, a primeira tarefa foi autografar algumas centenas de unidades na Dawnson Music Shop, em Widnes. Tudo para compensar a falta de publicidade que o selo Parlophone da EMI ao debut musical dos rapazes.

Ainda assim, o single marcado com o código R4949 não decepcionou, alcançando um singelo 17º lugar no Reino Unido, nas paradas da Record Retailer.

O melhor, é verdade, ainda estava um pouco distante – mas nem tão distante assim. Mais tarde, quando “Love Me Do” foi selecionada pelo produtor George Martin para abrir Please Please Me – o primeiro LP dos Beatles, lançado em março de 1963 – ela seria a primeira faixa do primeiro disco do grupo a conquistar as paradas britânicas. Um feito que se tornaria rotineiro, daí em diante.

“Love Me Do”: uma simples canção com uma longa jornada no estúdio

Com seu estilo melódico inspirado nas composições do ídolo Buddy Holly e harmonia estruturada no blues norte-americano, “Love Me Do” e seus três acordes têm uma história complexa de gravações.

A primeira jornada nas dependências do E.M.I. Recording Studios, em St. John’s Wood (mais tarde, rebatizado como Abbey Road) aconteceu em 6 de junho de 1962, na sessão de estreia dos Beatles pela gravadora. Na ocasião, o baterista ainda era Pete Best.

Quando o quarteto entrou no Studio Two para mostrar o que sabia ao produtor George Martin, outras três músicas foram registradas. Além de “Love Me Do”, o grupo tocou “Ask Me Why” (incluída mais tarde em Please Please Me), uma cover de “Besame Mucho” (sucesso na Inglaterra com os The Coasters) e o lado B do futuro single, “P.S. I Love You”.

Os Beatles não causaram grande impressão naquele dia”, relembra o engenheiro de som Norman Smith, já falecido. “Enfim, não deu para perceber a habilidade de John e Paul como compositores. Eles trouxeram uns amplificadores VOX que não ajudaram muito na performance”, relembrou.

Parte do resultado da sessão com John tocando sua Rickenbacker 325, Paul com seu baixo Hofner 500/1, George dedilhando uma Gretsch Duo Jet guitar e Pete atrás do kit de bateria Premier chegaria aos fãs em novembro de 1995, como parte do CD duplo Anthology I.

Ringo Starr entra na cozinha

Quando os Beatles voltaram à EMI – desta vez, como artistas contratados, “Love Me Do” foi resgatada pelo produtor George Martin em duas sessões em 4 e 11 de setembro de 1962.

Depois de ensaiarem no Studio Three – já com Ringo atrás do kit – a banda mudou de sala para produzir a base de sua primeira gravação oficial no Studio Two. Antes de “Love Me Do”, Martin quis ver os Beatles em ação, com uma versão de “How Do You Do It”, de autoria de Mitch Murray.

“Eu achava que os Beatles deveriam ter lançado “How Do You Do It”. Naquele tempo, eu ainda dava a palavra final no que eles deveriam fazer. Porém, eles tinham confiança em seu material e perguntaram: será que não podemos fazer uma de nossas músicas”, recordou o saudoso Geroge Martin em 1995.

A “uma de nossas”, no caso, seria a já velha conhecida “Love Me Do”. Desta vez, com John soprando a gaita Hohner Melodica, Paul no baixo Hofner 500/1, George tocando seu acústico Gibson J 160E e Ringo na icônica bateria Ludwig.

Tanto o original como a cover gravada naquele 4 de setembro foram selecionados para a sessão de mixagem. Porém, ao gosto de George Martin, a versão produzida naquela tarde apareceria no single de 7 polegadas britânico, mas não no álbum de estreia da banda.

A encarnação definitiva de “Love Me Do” foi esculpida pelos Beatles apenas uma semana depois. Em 11 de setembro, o quarteto entrou no Studio Two da EMI e foi surpreendido pela notícia de que Ringo não poderia tocar.

Descontente com a performance da bateria tocada por Ringo em 4 de setembro, ele decidiu contratar Andy White, um baterista profissional, para dar o ritmo desejado à canção. Ao pobre e decepcionado Ringo, sobrou apenas a função de tocar um tamborim.

“Ele nunca me perdoou por ter chamado White”, brincou George Martin, décadas depois.

No fim de mais um dia de trabalho, o take 18 foi selecionado para ser masterizado e incluído no LP Please Please Me. O resto, claro, é muita história -e milhões de álbuns vendidos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Claudio Dirani

Claudio D.Dirani é jornalista com mais de 25 anos de palcos e autor de MASTERS: Paul McCartney em discos e canções e Na Rota da BR-U2.

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