Nazia Hassan Nazia Hassan – foto: divulgação

A história da estrela mirim que decidiu dedicar sua vida à luta contra a guerra

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Nazia Hassan virou estrela da Disco Music e estava no topo das paradas do sul asiático aos 15 anos de idade. O que fazer com a fama? Mudar o mundo.

O que uma menina que alcança um estrondoso sucesso aos 15 anos de idade, unindo os povos de dois países em guerra, faz com a fama? No caso da artista paquistanesa Nazia Hassan, a resposta é surpreendente: você recusa papéis no cinema, vai estudar nos Estados Unidos, se torna uma das maiores líderes mundiais pela paz e contra a desigualdade e assume cargos na ONU e na UNICEF. Tudo isso em apenas 20 anos, já que Hassan infelizmente faleceu aos precoces 35 anos, vítima de câncer.

A história da filha de uma empresário e de uma ativista social que recebeu a carreira artística quase como um presente é uma daquelas verdadeiras fábulas do mundo da música. Não à toa, o documentário que conta a história de sua curta vida, lançado em 2007 e dirigido por Ahmad Haseeb, se chama A Music Fairy (Uma Fada da Música). A pré-adolescente Nazia Hassan estava em Londres quando conheceu a estrela de filmes indianos, conhecida como Bollywood, Zeenat Aman, acompanhada do diretor de cinema Feroz Khan, ambos indianos. A dupla se encantou com o talento da menina e a empurraram para conhecer o produtor musical Biddu, um conterrâneo que vivia em Londres e que o Brasil conhece muitíssimo bem: o cara foi o compositor do hit dos bailes black brasileiros, Kung Fu Fighting. Biddu era, na época, um da mais renomadas cabeças da onda Disco Music na Inglaterra.

Em 1979, ano do encontro mágico na Inglaterra, India e Paquistão seguiam se estranhando por causa de uma disputa pelo território da Caxemira, desinteligência que dura até hoje, mantendo os dois países em um eterno pé de guerra. Quando o negócio é música, derrubar fronteiras, além de um prazer, é uma missão de paz. Em apenas dois anos Nazia Hassan, ao lado de seu irmão Zoheb, eram os dois artistas musicais mais famosos, tanto da India, quanto de seu país natal, o Paquistão.

Um sucesso absurdo graças ao single Disco Deewane, composto por Biddu, uma música que se tornou monstruosamente grande em 1981, tocada à exaustão nas rádios e TVs dois dois países (muitos dizem que a música ajudou os dois povos a se estranharem menos). Para se ter uma ideia do impacto da música, Disco Deewane foi o primeiro disco a atingir o topo das paradas indianas sem ser uma trilha sonora de filmes de Bollywood. Além dos dois países brigões, a canção ainda atingiu o top 10 de mais 14 países, incluindo a Inglaterra.

O sucesso, claro, fez com que a indústria da música crescesse os olhos em cima da dupla de irmãos. Nazia foi convidada para ser a estrela de uma superprodução de Bollywood, chamada Star. A garota fez uma recusa genial. Propôs, em vez de ser a protagonista das telonas, cantar na trilha sonora, que também fez um baita sucesso. Até 1992, Nazia e Zoheb Hassan mais quatro álbuns de estúdio. Mas a carreira no show buziness não estava mais entre as prioridades da jovem prodígio. Seguindo os passos da mãe ativista, a garota achou tempo para se matricular na Universidade de Richmond, Londres, e se formar em Economia e Administração. A partir daí, se envolveu em dezenas de projetos de proteção às crianças e mulheres, tanto da Índia quanto do Paquistão. Em 1991 se juntou ao Conselho de Segurança da ONU e, dois anos depois, na UNICEF. Sua estratégia era clara: seguir fazendo música e usar a fama para mudar o mundo, como já fez aos 15 anos ao unir paquistaneses e indianos.

Nazia e Zoheb Hassan

Nazia e o irmão Zoheb Nassan – foto: divulgação

Disco Deewane deixou um legado de paz e compreensão entre os povos: uma artista paquistanesa aceita e amada na Índia (foi a primeira) e na mão contrária toda a cultura de cinema e música indianas tomando conta das casa e bailinhos de seu país natal. Em 1999, Hassan foi convidada para mais um baita rolê em sua carreira social, um convite da Universidade de Colúmbia para comandar um programa de jovens líderes, mas recusou devido ao câncer que a levou de nós tão cedo. Hoje a carreira da artista é celebrada em shows beneficentes, prêmios com seu nome e diversas outras homenagens.

Tanto no Paquistão, quanto na Índia.

 

 

 

 

 

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.