Lançado em 1999, Play foi um divisor de águas para a carreira de Moby — e para a cena da música eletrônica
O sucesso de Play, quinto álbum de Moby, foi uma surpresa para o artista. O disco, que levou dois anos para ficou pronto, caiu nas graças de absolutamente todo mundo. Crítica, público, o povo do cinema e da publicidade… E eis que o carinha de 34 anos, já conhecido e considerado no circuito underground e de música eletrônica, andava agora com celebridades, ganhava dinheiro e, para onde olhava, via portas abertas. Mas seguia triste.
Ninguém poderia se surpreender. Sua tristeza estava claramente presente nas 18 faixas de Play, um disco sublime que colocou a carreira musical de Moby, antes meio errática, nos eixos. Até Animal Rights (1996), o disco anterior, o DJ atirava para tantos lados diferentes que não seria difícil acertar o próprio pé. Nascido do cenário techno americano em 199o (com o single Mobility), fazia questão de mostrar que era um artista cheio de horizontes. Misturava ambient music, jungle, breakbeat e rock, tudo num balaio só até que, no LP de 96, seu carango criativo começou a derrapar para fora da pista. Mesmo sendo um bom disco, dava a Moby uma característica meio esquizofrênica, mergulhado em uma espécie de punk sujo e apocalíptico. Não era um disco de rock misturado com eletrônica, algo em alta naquele momento. Era um disco com faixas de rock e com faixas de eletrônica.
Com o distanciamento do tempo, vemos que o álbum bagunçado foi uma espécie de tempestade antes da bonança. Quando todos já estavam macambúzios com os rumos da música de Moby, o maluco entrega, três anos depois, um disco perfeito, com uma narrativa amarradinha, do começo ao fim, elevando a eletrônica ao nível de música sofisticada, bem construída, atual e pop.
Uma breve pausa para o contexto. A segunda metade dos anos 90 trouxe a paz à música alternativa. Gente que antes ouvia R.E.M., Sonic Youth e Stone Roses agora começava a ouvir Chemical Brothers, Prodigy, Underworld, tudo no maior sossego. Os muros haviam caído e os artistas estavam ávidos em sugar o melhor de cada cena, gerando uma renovação necessária e saudável na música pop. E Play ajudou muito nesse movimento.
E o mais louco é que, em sua cabeça trôpega, Moby inventou uma imagem negativada do blues na virada do milênio. Um disco que passa longe dos temas psicodélicos dos seus pares. Não há luz nos temas de Play, só túnel escuro. Why Does My Heart Feel So Sad, My Weakness, If Things Were Perfect, todas delatando, sem meias palavras, que algo não estava indo bem em sua cabeça. Se no blues dos sulistas americanos a sofrência vinha da escassez, no daquele branco de classe média, a sofridão vinha do excesso.
O sucesso absurdo do álbum foi gasolina em cima da fogueira que queimava em seu coração. Os excessos só aumentaram quando o cara foi jogado definitivamente no mainstream, a ponto de, menos de dez anos depois, o artista se ver subindo no palco de artistas amigos em Nova Iorque para interromper a música e perguntar se eles tinham drogas. O espiral de autodestruição só foi parar em 2008, depois de uma tentativa de suicídio. Richard Melville Hall, então com 43 anos, entrou para os Alcoólicos Anônimos e não saiu mais. “Minha vida ficou um bilhão de vezes melhor”, disse mais tarde.
O amadurecimento musical trazido por ele se manteve intacto nos 16 álbuns que lançou depois deste. E tem mais um filho chegando, Always Centered at Night, com data de lançamento marcada para 14 de junho.
Atualmente, Moby está em uma pequena turnê de comemoração de 25 anos de Play, prova de que reconhece a importância e o valor desta gema. São apenas sete shows pela Europa, sem “excessos”, para não tirar o artista de seu centro novamente. A verdade é que o LP estabeleceu um nível de qualidade, uma régua na música eletrônica. Nada mais seria o mesmo, nem para Moby, nem para os demais artistas do gênero, e nem para nós, ouvintes.