Álbum gravado pelos amigos Milton Nascimento e Esperanza Spalding chegou nesta sexta-feira, 09 de agosto
“Minha história está contada. Eu vou me despedir”, canta Milton Nascimento, muito bem acompanhado da amiga Esperanza Spalding, em Outubro, terceira faixa do álbum Milton + Esperanza, lançado nesta sexta-feira (09). Ok, aeroportos são um saco e a logística de uma turnê é difícil para alguém cuja jornada artística completa mais de 60 anos.
Mas, calma Milton. É bom que você, se não nos palcos, siga entre a gente por mais um bom tempo, para poder desfrutar tudo o que esta geração tem lhe reservado. O patrimônio mineiro é uma unanimidade entre o público popular no Brasil e entre os jazzistas lá fora. A novidade é que a qualidade de sua obra está atravessando tais fronteiras que Nascimento vai ganhando cada vez mais espaço entre os jovens pelo mundo, estimulados pelo culto ao vinil (e por consequências, suas obras clássicas) e por um olhar um pouco mais distante dos tempos da visão colonizadora, que separava a música feita fora da Europa e Estados Unidos como “world music” ou “étnica”.
Milton Nascimento vem sendo descoberto, revisitado e, em um sensacional ato de safadeza, lança um discaço cheio de significado e expressão. Milton + Esperanza é uma celebração. O LP começa com um doce diálogo entre os dois amigos, meio que cantado a esmo durante as sessões de estúdio. Pinta uma Spalding deslumbrada, dona de uma paixão de pureza infantil pelo mestre, e um Milton Nascimento de voz cigarrática e fala mole de dentes soltos, que passeia pela boca. Não se engane ou se assuste. É um embuste do mineiro, que a partir da segunda faixa, apresenta uma voz sublime na interpretações de todas as canções.
Bituca, o carinhoso apelido que o cantor tem desde criança, encontrou na companheira de disco uma nova Elis Regina, cantora de quem foi grande amigo e comparsa musical. Em dados momentos do álbum, a interpretação de Spalding (que assinou a composição de quatro canções do álbum) lembra mesmo a da diva brasileira. O grave rugoso de Milton e o agudo jazzista de Esperanza caminham juntos, de mãos dadas nas canções.
Os músicos experientes, tarimbados, sabem que ao fazer uma reinterpretação de Beatles, não dá para tentar ser melhor que eles. A saída é ir para o lado oposto, e foi o que a dupla fez na dificílima tarefa de reinventar A Day In The Life, composta por Paul McCartney. As alternativas que a dupla propôs para a música são fantásticas. Milton + Esperanza ainda tem mais uma reinvenção: Earth Song, do Michael Jackson, liderada pela voz da convidada Dianne Reeves, que arrebenta no vocal.
Incluindo participações de Paul Simon, Guinga, Elena Pinderhughes, Orquestra Ouro Preto, Lianne La Havas, Maria Gadú, Tim Bernardes, Lula Galvão e Carolina Shorter, o novo álbum é mais jazz e, ainda assim, mais Milton Nascimento do que nunca. Frase que, para o povo lá do estrangeiro, é uma redundância. Bituca é considerado, faz muito tempo, um grande mestre do jazz. E a aliança com Esperanza Spalding só faz melhorar esta imagem. Uma obra indispensável.