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MC Queer lança clipe de “Fiscal” para provar que o fervo das bees também é luta

“Militância com batida”. “Fervo também é luta”. Com palavras de ordem de empoderamento, uma atitude punk bem mal-educada, corrosiva, e um glamour inerente que mistura sexualidade e moda, MC Queer estreia com sua música e clipe de “Fiscal”, que tenta musicar a raiva de quem vive sob a égide da homofobia e a busca pela subversão desse medo.

Felipe Simi é o rapaz por trás do MC, e por trás dos beats de “Fiscal” está o produtor Maestro Billy. A música lembra um misto de Edu K com Furacão 2000 e fala de lâmpadas quebradas, o sexo gay como fator político e como todas esses fatos e vivências do universo LGBT são a própria expressão cultural dessa rapaziada.

O debate da condição e da desconstrução do protagonismo de luta e das identidades gays hoje é aguerrido, e o clipe foi recebido por críticas dentro da própria comunidade LGBT, e Felipe comenta essas reações. Leia e assista.


Como você se transformou de Felipe para MC Queer? 
>Felipe e MC Queer são a mesma pessoa. A diferença é que enquanto Felipe eu só escrevia sobre o que sentia e dei vida ao MC Queer pra conseguir cantar aquilo que eu achava que precisava ser dito. A música tem mais alcance que a escrita e une as pessoas. Está mais do que na hora dos LGBTs se unirem de verdade, principalmente em um momento tão delicado com a ascensão de um corrente conservadora perigosa. Não dá mais pra existir separatismo entre a gente.

Por que o funk? E como você criou seu batidão?

Primeiro, porque eu de fato adoro funk. As minhas referências musicais foram construídas com muita brasilidade, desde a infância. Cresci ouvindo Ney, Maria Bethania, Elis, Caetano Veloso. Caetano, aliás, disse em entrevista recente que o Funk é a nova Tropicália. E faz sentido. O funk tem uma batida inclusiva, irresistível, já tem um legado em dar voz a minorias e alcança pessoas de todas as idades, todas as classes sociais, gêneros e orientações sexuais. Me parecia o veículo ideal para dar capilaridade à mensagem de respeito, aceitação e orgulho.

As músicas derivaram de poemas, sketches e rascunhos que eu já havia escrito ao longo da vida. Adaptei uma coisa ou outra pra trazer sonoridade e deixar mais palatável. Sobre a produção musical, eu e o Billy navegamos pelo funk proibidão do começo dos anos 2000, no trap e no pop atual, no eletro e no charme (eu amo charme!) pra construir a identidade do batidão.

Suas imagens de divulgação têm o corpo coberto e no clipe você parece dar protagonismo a todos os dançarinos e participantes.

A estética toda do MC Queer foi concebida desde o princípio sem uma cara, uma cor, um sexo. A intenção era que a mensagem falasse mais alto que o mensageiro, pra que qualquer pessoa que se identificasse com aquilo e pudesse se ver um pouco ali. Até por isso que eu escolhi “Queer”, pra não limitar. Então não é uma questão de não mostrar o rosto, mas de permitir que as pessoas se projetem no MC Queer. Tanto que no clipe de Fiscal eu mostro o rosto, assim como todos os outros personagens que aparecem –  gays, lésbicas, trans, travestis, drags – porque não acho coerente falar de homotransfobia e não dar a cara a tapa.

Fale um pouco sobre “Fiscal”, e como a música se destaca em relação a suas outras músicas. Aliás, o que mais você vai lançar?

“Fiscal” foi a primeira música que eu escrevi. Foi um desabafo muito honesto e, por isso, é a música mais “pesada” do disco. Eu não estava conseguindo dormir naquela noite, porque tinha lido uma notícia de mais uma morte motivada por homofobia. No dia seguinte eu liguei pro Billy e falei “quero fazer funk LGBT”, mostrei a música e tudo começou. De lá pra cá se passaram só 3 meses, finalizei mais músicas, recebi um outra de presente de um amigo, encontramos a identidade das batidas e gravamos tudo. O álbum sai ainda neste semestre. Ele tem muito de política, assim como “Fiscal”, mas tem também humor, amor e jogação, porque “fervo também é luta”.

Como vê o empoderamento tão combativo das bees hoje em dia? 

Se os LGBTs não aprenderem a fazer política, a gente infelizmente não vai sair do lugar. A minha única preocupação é a criação de uma espécie de “partidarismo” nessa história toda, com subclasses ou organizações achando que sua luta é mais legítima do que a de outra subclasse, por exemplo. É claro que existem dores e realidades diferentes, só quem as vive pode entender e elas devem ser respeitadas. Mas no fim todo mundo tá no mesmo barco à deriva e a gente só se move se trabalharmos juntos de verdade.

Algumas das reações iniciais à música por parte dos gays têm sido críticas, acusando uma “comoditização” da militância por sua parte.

Toda problematização é bem-vinda e necessária. Eu sabia desde o princípio que levaria algumas boas pedradas e estou aprendendo muito com todas as críticas. Agradar todo mundo é impossível. Espero que o debate sirva pra unir mais do que separar, porque no fim, além de financiar projetos sociais da causa, esse é um dos principais objetivos de tudo isso.

As bees parecem não gostar da ideia de “tem que ser muito macho pra dar o cu”. Na problematização gay atual o fator “macho” é combatido, subjugado, não?

Na real nessa frase continha boa dose de ironia desde que escrevi a música. Mas sabia que seria o teto de vidro da letra, porque tudo está sempre aberto às mais diferentes interpretações. Eu honestamente respeito quem critica e acho o debate importante, coloca a discussão em pauta. Não vou nunca responder com ódio quem tem umavisão diferente da minha, mas no fim do dia tá lutando do mesmo lado que eu.

Vai fazer shows? Quais os planos futuros?

Eu honestamente não sei dizer, vou esperar pra ver o que acontece. Porque o projeto nasceu com uma única música, de repente virou um álbum, de repente gravamos um clipe. Eu to deixando ele tomar as proporções que ele quer tomar.

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