Após 13 anos do último álbum de inéditas, o Invisível DJ, de 2007, o Ira! acaba de lançar um novo trabalho com dez composições próprias. De nome Ira, o disco mostra a nova cara da banda desde que Nasi e Edgard Scandurra se reconciliaram em 2014, apresentando um grupo veterano retornando às raízes sonoras e lidando com a independência nos novos tempos.
“O álbum é a nossa volta à independência”, afirma Scandurra ao Music Non Stop, e explica: “De 1981 a 1985 a banda se chamava Ira, sem a exclamação no nome, e foi a nossa fase independente, sem gravadora. Então, o nome do disco novo, ‘Ira’, de certa maneira é a nossa volta à independência, porque fomos nós que bancamos tudo e nos dá uma liberdade musical; das músicas serem longas e não precisarmos nos prender ao formato pop de canções com 2 ou 3 minutos”.
A banda, que se separou em 2007 após desentendimentos com o empresário, retornou às atividades em 2014. Além de Scandurra e Nasi, a formação atual conta com Johnny Boy, no baixo, e Evaristo Pádua, na bateria.
“Esses anos, desde a reconciliação, foram bons para sacarmos qual é a cara e a sonoridade dessa nova formação. Preferimos esperar o momento certo para lançarmos o novo álbum, que foi quando a banda ficou madura novamente”, conta Scandurra.
Sobre o Ira, o guitarrista continua: “Todas as músicas foram compostas após a nossa volta, com exceção de duas: ‘A Nossa Amizade’, que a letra já existia há um bom tempo, e fizemos apenas o instrumental depois, e ‘Chuto Pedra e Assobio’, que eu tinha feito com a Bárbara Eugênia, e a utilizamos no disco”.
Ira! e a pandemia
Com o lançamento pronto, o que os integrantes do Ira! não esperavam era ter que enfrentar uma pandemia mundial. No entanto, resolveram não esperar a situação passar e colocaram o trabalho para rodar mesmo assim.
“Finalizamos o álbum em fevereiro e se fossemos esperar a pandemia passar, bom, não saberíamos quando lançaríamos porque aqui [no Brasil] as coisas estão bem complicadas”, diz Scandurra. “Resolvemos lançá-lo agora para que as pessoas, e o nosso público que está confinado em casa, tenham uma alegria nesse tempo difícil e possam escutá-lo em casa com atenção”, completa.
Rock contra a repressão
Além de cantar sobre o amor, o álbum também apresenta letras feministas, como em “Mulheres à Frente da Tropa”, por exemplo, em que Scandurra canta e exalta o empoderamento das mulheres. O videoclipe, inclusive, homenageia em uma das cenas a vereadora Marielle Franco, assassinada há dois anos no Rio de Janeiro.
Segundo o guitarrista, bandas de rock devem lutar por um mundo mais justo, igualitário e democrático, principalmente nos dias atuais em que o governo brasileiro flerta com a ditadura militar. “É fundamental que uma banda de rock tenha essa posição, pois o rock n’ roll é uma música libertária. Pense nos nossos ídolos; eles não elogiavam tortura, repressão, violência e preconceito contra as minorias. O que seria do rock se não fosse a música negra, o movimento LGBT, o movimento glam e a androginia de David Bowie e Lou Reed? Isso tudo não é a cara da repressão, é a cara da liberdade”, diz ele.
Ainda no assunto, Scandurra volta ao início da carreira do grupo para exemplificar: “O Ira! nasceu no finalzinho da ditadura militar e até chegamos a ter alguma coisa censurada. Então, é importante mostrarmos para o nosso público que não queremos que isso volte a existir, pois é inconcebível viver sem ter liberdade de escolha e de pensamento, além de todas as mazelas desse sistema opressor”.
Era das lives
Em tempos de lives, o único formato possível que faz com que o artista tenha contato com os fãs atualmente, e que aproxima o público da sensação de um show ao vivo, mesmo que virtual, Edgard comenta:
“Eu acho muito legal essas lives, eu até fiz uma sozinho aqui em casa para o Sesc. Agora, fazer um evento que junte todos os integrantes do Ira!, mais a equipe técnica, câmeras e motoristas, seria desrespeitar a quarentena e geraria um tumulto que achamos que ainda não é o momento”.
O guitarrista finaliza: “Seria essencial que houvesse uma tecnologia que possibilitasse que nós quatro pudéssemos tocar juntos ao mesmo tempo, mas separados, cada um em sua casa”.
Capa de Ira