Yoga na boate, complexo multicultural em SP, filial no Rio; Renato Ratier conta os planos de renovação do D-Edge

Claudia Assef
Por Claudia Assef

Desde que foi inaugurado em São Paulo, em abril de 2003, o clube D-Edge vem elevando padrões do mercado de boate em todos os sentidos. Já chegou chegando, com: 1) atrações nacionais e internacionais de peso semanalmente no line-up, 2) design moderníssimo de Multi Randolph com seu característico (e tão copiado) paredão de equalizador em led 3) Sofisticado e megapotente sistema de som 4) pluralidade de noites temáticas sempre prezando pelo som menos comercial.

dedge

A clássica pista 1 do D-Edge São Paulo com sua iluminação característica e som potente

Foi com esse conjunto de fatores que a figura à frente do clube, o empresário e DJ Renato Ratier, foi ganhando importância na noite de São Paulo. Ele não era um aventureiro na empreitada noturna, já administrava uma boate, com o mesmo nome D-Edge, desde o ano 2000, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, sua cidade natal.

d-edge-campo-grande

Interior do D-Edge Campo Grande, também com design assinado por Muti Randolf

O D-Edge campo-grandense já agitava a cena noturna local, com DJs importados de São Paulo, Rio e alguns gringos. Mas foi com o início dos trabalhos em São Paulo que seu reinado clubber começou. Em 13 anos instalado em São Paulo, no mesmo endereço da alameda Olga, na Barra Funda, o D-Edge foi amplificando sua importância na noite e abrindo novas frentes, como selos musicas (D-Edge Records e o mais recente, Olga), agência de DJs (D-agency), escola de discotecagem (DJ College) e outros negócios de Ratier compondo com o lifestlife D-Edge: o restaurante e estúdio Bossa e a loja de roupas Ratier.

renato-ratier

Ratier: o filho pródigo de Mato Grosso do Sul que ganhou o mundo eletrônico com a marca D-Edge

Se nos últimos anos a cena de clubes deixou de imperar sozinha na noite, com a chegada de muitos núcleos de festas se espalhando por cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, o D-Edge por outro lado tem se mantido lotado com uma programação artística que não abriu as pernas para o som comercial.

Ligado em tudo o que tem rolado ao seu redor e com o bônus de viajar o mundo em suas turnês como DJ, Ratier tem investido em novas frentes porque sabe que quem fica parado é poste.

Ouça set de Renato Ratier mixado ao vivo na festa Mothership do D-Edge

Os clubes enfrentam um novo paradigma diante de um público cada vez mais faminto por novidades. Pra ficarmos no âmbito da música, o contexto atual lembra o momento em que as gravadoras tiveram que se reinventar após a chegada de ferramentas como o Napster, que parecia ser o prenúncio do fim da linha para elas.

roupas-dedge

Mas as novidades são muitas para Ratier e sua principal marca. A chegada do D-Edge Rio, a inauguração de um complexo cultural em São Paulo, a abertura do clube na Barra Funda para novas atividades, como aulas de yoga. Batemos um papo com ele pra saber de tudo. Leia a seguir.

Music Non Stop – Como surgiu a ideia de usar o D-Edge pra fazer uma aula de yoga? Vão rolar outras vezes?

d-edge-yoga

Renato Ratier – Já faz algum tempo que nós procuramos por atividades diferentes que possam ser realizadas no clube. Queremos utilizar nosso espaço para outras atividades durante o dia e manter o espaço vivo. Uma dessas atividades é o DJ College, que há quatro anos oferece aulas de DJ no clube. A aula de yoga foi uma dessas ideias e resultou num sucesso absoluto. A parceria começou com o Bem São Paulo, e as inscrições se esgotaram muito rapidamente, foi uma ótima iniciativa com as duas pistas do clube cheias de praticantes de yoga. A gente pensa em continuar, sim, com o projeto e também criar novas ações durante a semana em horários em que o clube não funciona. O objetivo é manter o D-Edge sempre com atividades, para que o espaço seja o mais bem utilizado e criar um conteúdo interessante.

Music Non Stop – Como estão os planos para a inauguração do D-Edge Rio?

Renato Ratier – Estamos em pleno movimento, próximos da finalização do projeto no Rio de Janeiro. Fizemos um evento no dia 2/9 com o Richie Hawtin, chamado Underconstruction. A festa aconteceu no espaço que abrigará um complexo multicultural com uma filial do club D-Edge, além de espaço para shows, bar, restaurante, estúdio de produção musical, cafeteria, livraria, loja de discos e uma galeria de arte com espaços onde ocorrerão oficinas culturais.

d-edge

Teremos outra festa no dia 7/10, com Joseph Capriati e Paul Ritchie, chamada We’re Coming, que significa “estamos chegando”, indicando que o espaço irá abrir em breve. Abriremos oficialmente em 2017, mas ainda estamos sem uma data definida. Estou muito feliz que esse dia está chegando, pois houve muita espera e muito trabalho nos últimos anos. Sei que o desafio pela frente é grande, pois o projeto é grande e, claro, complexo, como o próprio nome diz. Mas estou bastante confiante e acho que vai ser muito bacana e que a cidade do Rio de Janeiro vai ganhar muito com isso.

renato-ratier

O capitão da nave D-Edge, Renato Ratier, cheio de planos para 2017

Music Non Stop – Uma vez você comentou sobre um plano de abrir um co-working/ residência artística em São Paulo. Como está esta projeto?

Renato Ratier – Esse projeto também está em andamento e deve abrir um pouco antes do Complexo Multicultural no Rio de Janeiro. Estamos trabalhando, na verdade, no meio do processo de execução. É um projeto diversificado e interessante, com um conceito que abrigará várias plataformas diferentes que se comunicarão. Em breve divulgaremos maiores informações.

d-edge1

Fachada do clube em São Paulo após a primeira grande reforma, em 2010

Music Non Stop – Como DJ, você tem tocados em todos os clubes e festivais importantes do mundo. O que falta pra realizar na sua carreira? Alguma colaboração importante que você gostaria de tirar do papel?

Renato Ratier – Tenho muita coisa ainda para ser alcançada em minha carreira – e estou sempre batalhando para conseguir. Com relação a festivais, já toquei em muitos, mas há sempre, claro, aqueles em que gostaria de tocar, como o Time Warp e o Awakenings, por exemplo. Quando falamos em parcerias, existem muitas pessoas que eu admiro, é bem difícil falar um nome só. Mas acho que, quando a pessoa quer algo, é importante que ela se dedique, canalize energia e tenha foco… Assim podemos ver as coisas acontecendo. Com o tempo, elas se tornam realidade.

d-edge

Music Non Stop – Como você divide o tempo entre DJ e empresário. Como administra os dois lados, um serve de apoio para o outro?

Renato Ratier – Não é fácil, principalmente pelo desgaste que enfrento nas gigs, nas viagens e nas festas intensas. Você sabe que quando eu toco eu me entrego, eu faço sets longos e deposito muita energia nisso. Eu vivo o que faço. Não tenho muito descanso de fim de semana, como grande parte das pessoas, mas, tudo bem, porque ao final o que vale é fazer o que amo – e eu amo o que faço. Minha vida é bem intensa, tenho poucos momentos de relaxamento, mas hoje em dia procuro aproveitá-los ao máximo a fim de recuperar minhas energias. Pratico esportes e tento sair um pouco dos ambientes de trabalho nesses momentos. Equilíbrio é um ponto crucial para poder administrar bem a minha carreira artística com a vida empresarial. Motivação, vontade de fazer e de fazer bem feito e também a força de bons colaboradores, me fazem querer estar junto com outras pessoas e ter uma experiência transformadora. Isso me abastece e me impulsiona a continuar fazendo meu trabalho da melhor maneira possível.

Music Non Stop – Você é sócio do Warung? Como começou o relacionamento com o clube e qual foi o impacto da sua entrada?

warung

Renato Ratier – Meu relacionamento com o clube sempre foi ótimo, inclusive tem uma história de que quando o Gustavo Conti estava prestes a abrir o clube, ele veio a São Paulo e conversou com uma das pessoas que trabalhavam dentro do nosso grupo, o Diego Dumont, mas eu não me recordo disso (risos). Depois de um tempo, após algumas apresentações, iniciou-se uma maior proximidade, e foi aí que surgiu o convite para uma residência minha. Logo as conversações tomaram outros caminhos e direcionaram-se para uma possível sociedade.

Acho que faço o possível, logo no início da minha entrada junto ao quadro de sócios realizamos ações de grande impacto acentuando a boa fase pela qual o clube vem passando. Para mim, o Warung é um lugar mágico, com uma energia única, juntamente com os clubes D-Edge e Amnesia, que na minha opinião, estão entres os principais do mundo. Sempre que vou tocar lá a ansiedade é grande, e a energia é muito singular. Vida longa ao Templo.

Music Non Stop – Tem se falado bastante sobre uma “suposta” volta do techno. Você tem percebido isso em suas viagens pelo mundo?

Richie-hawtin

Richie Hawtin em sua passagem mais recente pelo D-Edge

Renato Ratier – Eu acho que no meio dessa conversa de volta do techno quem vai voltar mesmo é a house (risos). A gente sabe que esses momentos são cíclicos na música, como foi com a deep house há algum tempo. O techno sempre esteve aí e nunca faltaram bons produtores e boas músicas do estilo, no entanto, hoje ele aparece mais forte e com mais pessoas tocando e, por isso, daqui a pouco os produtores vão querer criar alternativas e meios para fugir dele, já que o artista quer sempre algo novo, não quer ser rotulado. Acho importante ter certo equilíbrio, porque do contrário seria muito chato. Eu busco sempre caminhar entre a house e o techno com cautela, mesclando-os.

 

Music Non Stop – O D-Edge hoje em dia abrange todo um lifestyle, no seu grupo você tem uma grife de roupas, restaurante, estúdio, selo… tem algo que você ainda queira fazer pra complementar este universo?

L_cio é um dos artistas representados pelo selo D-Agency

L_cio é um dos artistas representados pelo selo D-Agency

Renato Ratier – Estou com alguns projetos em andamento, em breve vocês terão novidades. Eu não gosto de me rotular e me limitar como DJ nem como empresário. É muito complicado administrar esses dois lados: o artístico e o de negócios. Não é fácil também lidar com diversas atividades e conseguir êxito conciliando uma vida artística em paralelo, mas é o que tento fazer. Quanto ao futuro, são mais ou menos uns quatro projetos novos que estão sendo tocados, sobre os quais eu falarei somente mais para frente. O mais importante nisso tudo é ter uma equipe boa e ter organização dentro do sistema e dentro do grupo. Bacana é ver as pessoas e os projetos se ajudando para que haja organização e força em todos os negócios e que vários projetos possam conversar entre si.

Music Non Stop – Você sempre teve mulheres fortes na equipe, como vê o crescimento das mulheres na música eletrônica?

patricia-correia

A promoter Patricia Corrêa tem sido braço direito de Ratier desde a chegada do clube a SP

Renato Ratier – Nunca existiu nenhum tipo de preconceito por parte de sexo em minha equipe. Se a pessoa for competente, independentemente de ser homem ou mulher, sempre terá espaço para trabalhar comigo. Sempre houve mulheres fortes na minha equipe, porque sempre existiru mulher competente, assim como homem competente também – e para mim isso não faz diferença alguma.

Music Non Stop – O que de novo na música eletrônica tem te deixado mais animado com a cena?

d-edge-pista

Renato Ratier – Música boa e pessoas tocadas por ela são sempre coisas que me motivam e que sempre me deram gás. É o prazer de tocar, de fazer música e proporcionar bons momentos que me move. Não fico muito preocupado com essa obsessão com o novo. Os maiores valores e coisas essenciais da vida, que encantam, como amor, emoção, carinho, respeito e união, são intocáveis, imutáveis e vão continuar me motivando. Tudo o que quero é agregar coisas boas às pessoas, o clube mesmo tem a função de reunir pessoas de diferentes tipos, crenças e religiões num mesmo lugar, se respeitando e curtindo juntas com um código de harmonia. Isso é o que me motiva. O dia que não for assim, eu vou ter perdido o meu foco.

 

 

Claudia Assef

https://www.musicnonstop.com.br

Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.